Sobre MENINAS e lobos

“Falem mal, mas falem de mim”. Será que a Xuxa precisava testar este ditado até o limite dela mesma? Seja qual for a resposta, ela conseguiu o que queria: aplausos e pedras. Essa é a dicotomia vivida por toda celebridade, por toda pessoa da mídia.  A unanimidade é burra, já dizia Nelson Rodrigues, que sempre levou tapas e beijos do não tão respeitável público.

Querer que todo mundo se desmanchasse em lágrimas com a confissão da Xuxa no Fantástico, era exigir demais. As pessoas têm o direito de desconfiar de quem usa o horário nobre para revelar suas intimidades mais devastadoras. Ela correu o risco. Ela não foi ingênua, por favor!! Uma mulher que nasceu e cresceu nessa teia de mentiras que é a televisão, não tem inocência. Ela não “resolveu” se abrir porque o entrevistador era do caralho. Foi de caso pensado. Falou porque quis.

Xuxa decidiu expor seu drama íntimo para milhões de brasileiros via TV. Como também expôs o anúncio da sua gravidez no Faustão. Um padrão que se repete... De alguém que crê que todo mundo deve estar interessado em suas vivências. A Globo a acostumou mal. O público a acostumou mal. E ela está aí, de novo, mostrando que é uma cria, uma escrava da doentia forma de se exibir.

Mas isso não quer dizer que ela não esteja sendo sincera. Quem pode saber além dela mesma e de quem conviveu com ela? Ninguém. Não vou julgar. O irmão dela levantou dúvidas: “estávamos sempre juntos nos programas de fim de semana, como não percebi?” Acontece. Mais do que a gente pensa. Eu conheço casos. Eu vivi um caso. Não interessa aqui entrar em detalhes escabrosos que desestruturariam pessoas queridas da minha família. Enquanto elas não se abrirem, pois foram as piores vítimas, eu não abro.

Espero que um dia elas tenham a coragem necessária para livrarem-se deste fantasma. Eu já me livrei. Coloquei a boca no trombone da minha mãe, da terapeuta, do marido. Isso não faz mais parte de mim, mas não quer dizer que não tenha acontecido. Não fui estuprada, podem guardar os lenços. Só que nem só de estupro vive um abuso, infelizmente.

Também já fui assediada por um professor universitário. No início, até entrei no joguinho. Achei que era interessante despertar o desejo num cara mais velho. Mas eu era uma menina de 19 anos, caloura. Uma idiota clássica, deslumbrada com as novidades da UnB.

O cara derrubou todas as barreiras éticas possíveis e imagináveis. Ele chegou ao ponto de me ameaçar com reprovação na matéria. O tal professor era, de fato, um predador que escondia uma lista de mulheres/meninas que supostamente “comeu” na gaveta. Eu vi a relação com os meus próprios olhos. Lobos-maus existem sim!!!

E então cai na real e constatei que aquilo não era uma brincadeira divertida. Que aquilo não era legal, não era honroso, não era digno de mim. Consegui cortar o mal pela raiz antes que tudo virasse mais um caso de polícia desses que terminam em tragédia: “Professor mata aluna que não quis nada com ele”.

Então não vou julgar a Xuxa. Ela pode ter sido molestada, importunada e confundida por três homens mais velhos diferentes. Os homens mais velhos sempre fazem as mulheres se sentirem protegidas, queridas. Ainda mais as meninas que cresceram órfãs de pai (como eu) ou com pais ausentes, como era o caso da Xuxa.

Mas também não vou aplaudi-la por ter sido sincera no Fantástico. Sincera até que ponto? Usar a intimidade dolorida de celebridade icônica como matéria bombástica mexe com a cabeça das pessoas de modo também explosivo. Aumentaram as denúncias de abuso sexual após as revelações da Xuxa? Positivo, mas até onde isso é mesmo real? O fatídico caso da Escola Base está aí para mostrar o quanto as pessoas são influenciáveis e sugestionáveis.  

Intrigante é ver os jornalistas, os articulistas e os coleguinhas da TV correrem, em coro, para apoiar a “rainha dos baixinhos”, sem contestar uma vírgula sequer sobre a atitude dela. Ninguém questiona o fato de ela ter encontrado o pior meio para dar vazão ao seu sofrimento complexo. Justamente o mais superficial e frívolo. Só faltava ter postado no FB antes de dar entrevista. Seria o cúmulo da midiatização!

Então não reclamem ou se sintam ofendidos pela ferocidade das reações que duvidam, discordam e desconfiam de Xuxa. Ela não é Deus, apesar de muitos, ou mesmo ela  própria, acreditar nisso. E mesmo Deus não é maioria nesse mundo alucinado. Xuxa pediu essa resposta descabida. O público, desde Roma, está afeito ao pão e circo. Delira ao ver seus afetos e desafetos jogados às feras. 


Ela que aguente as consequências de seus atos e se porte como uma adulta, mãe de uma adolescente que ela não protegeu quando resolveu despejar seu lado negro, sem qualquer aviso prévio, na cara do povão.

Mas talvez eu esteja pedindo demais.