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Mostrando postagens de novembro, 2014

O telefone sem fio

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A vida é mais sincera e crua que qualquer ficção. Demorei muito para ver o aclamado filme “A Caça”. Atualmente não tenho mais estômago para filmes de sofrimentos densos. Sabia que o argumento do filme envolvia injustiça. E injustiça é algo que me dá nos nervos, me incomoda ao ponto do insuportável.  Não faz nem duas semanas que, enfim, conferi a película. E ontem, porque a vida é mais sincera e crua que qualquer ficção, meu caçula viveu dilemas muito similares aos expostos no filme, porém sem a conotação sexual, ainda bem. Rômulo levou um tombo no colégio e quase perde um pedaço da língua. Digamos que tirou um pequeno filé. Ficou feio. Penso na dor inenarrável que sentiu, no jorro de sangue que tomou sua boca...  A comoção na escola foi imediata. “Ele foi derrubado pelo Felipe Góis, ele foi empurrado pelo Felipe Góis”. As crianças iniciaram o leviano processo de pré-julgamento baseado em indícios tênues: Felipe Góis, o coleguinha da outra sala de segundo ano, esta

Peixe-Sapiens II

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Paras as Clarices Lispector e Veras,  que sabem: bichos bobos não são idiotas Meu nome é Chico. Eu sou um peixe. Moro num tanque. Tá, vá lá, num laguinho quitinete. Um conjugado na frente de um viveiro de plantas. Dizem que sou uma carpa, o tipo de peixe que os japoneses reverenciam por representar a prosperidade e a alegria. Não entendo nada disso. Se eu fosse próspero, viveria no oceano Atlântico, nos fiordes gelados da Noruega ou no Rio Amazonas. Não nesse aquário, dividindo quarto e sala com tantos outros peixes, não acha?  Ao contrário do que todos pensam, alguns peixes pensam. Espantado? Não sei se é o caso dos meus vizinhos que não param de passar para lá e para cá enquanto eu converso com você, esses mal-educados, mas eu afirmo que penso, logo existo.  Demorou um bocado para as pessoas que vêm e vão daqui todos os dias (parecem meus vizinhos) perceberem que eu tinha consciência. Que era um ser vivo dotado de faculdades mentais diversas das plantas e d

Xô, neura!

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Quem é mãe que já não acordou no meio da madrugada para dar um beijo no filho? A exata mãe que carrega a culpa pela incompreensão, pela impaciência. As mães e o poço sem fundo das angústias de se crer infalíveis. Sabendo ser impossível ela foi lá e fez. Que frase de tamanha crueldade, oras!  A mãe não pode fazer nada além do que já faz: parir, nutrir, amar, pentear os cabelos, escovar os dentes, dizer que ama, dar beijo, dar colo, dar bronca. O impossível é pra quem vive de filosofia. E filosofia não cria filhos.  Quando confirmo o brilho nos olhos dos meus filhos, acredito que eles estão tranquilos e seguirão bem resolvidos pela vida. É dilacerante reconhecer numa criança a esperança destruída. Já detectei em muitas. Infelizmente, não apenas nas obviamente maltratadas pelas vilezas de uma existência miserável.  Mas pinta a insegurança de que é imperativo fazer ainda mais e melhor. É uma pressão às vezes desumana. Parece que o comportamento da mãe ao lado é sem