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Mostrando postagens de março, 2024

Thanks for riding, Luciana!

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Contingências da rotina me levaram a experimentar as facilidades e excentricidades do Uber dias atrás. Três corridas, três personagens distintos como a vida. Interessante que dois deles eu encontrei num único dia, corroborando que o insólito está sempre lado a lado com a gente, ainda que morramos de tédio. Insólito seria um adjetivo um pouco exagerado, talvez estranho ou incomum. Ah, deixemos para lá e apresentemos o motorista W, que me buscou no meu futuro novo endereço no Lago Norte. A manhã estava resplandecente, o calor se anunciava em seu verão máximo. Do lado de fora não evidenciei nada exótico além de um adesivo chamativo fixado no vidro traseiro: “Por favor, não bata a porta”. Ou “Não bata a porta, por favor”. A memória dos ocorridos não está mais tão fresca. Dentro, percebi estar num dos automóveis mais detonados que já entrei, ainda mais para um Uber. O assento rasgado, cinto de segurança meio enguiçado. Carruagem mequetrefe, meio bamba. O motorista tinha um jeitão Robert

Tapete vermelho

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“Filmes são eles e a sua circunstância. Faz papel de ingênuo quem pensar que neste mundo conta apenas o mérito artístico.” (Ortega y Gasset) Fui uma cinéfila boa parte da vida. Não perdia os lançamentos, frequentava as salas da cidade, principalmente os cineclubes, religiosamente, semanalmente. Tinha um caderninho (talvez ainda esteja perdido nos guardados e eu volte a encontrá-lo) no qual anotava minhas impressões sobre os filmes e fazia minha própria cotação em estrelas. Reescrevia passagens dos diálogos ou de locuções que me encantavam. Acho que o meu lado escritora ainda não havia aflorado. Sem dúvida um grande passatempo. Faz bastante tempo que abandonei esses hábitos bacanas. Filhos, TV a cabo, preços exorbitantes dos ingressos, a queda dos cinemas de rua, das salas de exibição de filmes fora do circuitão… Nunca gostei de shoppings para nada, inclusive para ir ao cinema. Mas às vezes ainda saio da inércia para curtir uma telona, que tem o seu valor inestimável. As condições fís

Platão

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Contempla o teu viver que corre, escuta O teu ouro de dentro. É outro amarelo que te falo." (Hilda Hilst)  Do lado fora da caverna havia as borboletas amarelas do Rubem Braga. Mas antes delas, o céu azul de abril do Drummond, adiantado para março. Havia uma flor pregada no cabelo da árvore, pronta para receber Jonathan como Adélia. Um dente de leão solitário resistia à espera do amor de Mar Beck. O sol pincelado nas colunas de concreto, bandeiras estendidas, apátridas. Sem poesia engajado hoje, Maiakóvski!, alertaram. As cercas, quando existiam, eram vivas e nelas os pássaros, em coro, chamavam Manoel. Insetos já se organizavam para o leilão de jardim da Cecília, todavia, cotovia, onde se meteu o fantasma de Quintana? Sem ele não dá pra começar!, reclamaram os tatus bolinhas. E aí se lembraram que Maria Lúcia Alvim tava para as bandas de lá, batendo pasto, espantando os recalcados, na companhia da Fontela, pra cá da fonte adonde a Walker sentava esperando a chuva do caju. Enquan

Copo meio vazio

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Quando a água já passa do queixo e a atração da escuridão parece vencer a luta de braço com a luminosidade, eis o momento que é preciso decidir rapidamente. Lê no atual romance de cabeceira, que o coração meio vazio é a "essência do vício". O que se faz com esse sentimento que está entranhado em cada célula? Uma transfusão completa de sangue? Reencarnação? Escreve como se entornasse um litro de bourbon em minutos. Como se desintegrasse a pedra de crack. Não experimenta euforia ou passamento. As palavras não dão nenhum sossego. O mundo natural provê alívios regulares imprescindíveis e você quer sempre mais e mais. Inadaptados existenciais são viciados de uma ordem excruciante. Alguns desistem. Outros seguem buscando a cura inexistente. A tábua de salvação está sempre na próxima folha em branco. Arritmia  Nem óbvia tampouco over. Calor dos trópicos mosquitos, malditos mosquitos de todos os tipos doenças exóticas corrupção costumeira. Literatura gay tá on heteronormatividade t