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Mostrando postagens de março, 2023

Luminares

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“Não deve, não pode Não se cutucar cobra com vara curta, escuta Tudo isso pra quê? Atentar aparência, não, mas o meu peito é de mulher Qualquer gota de amor afoga, faço um oceano dentro"… (Luedji Luna) Uma mulher que pinta as unhas de calda de blueberry não quer briga com ninguém (mas pode). Não quer lavar a louça ou encostar a barriga no fogão também. (Mas pode) Pontua o amor por si própria alimenta a chama de sua feminilidade. O poder ritualístico das fêmeas, conclama: autocuidado. Uma mulher que pinta as unhas não quer dar satisfação, porquês. (mas pode). Não admite humilhação.  Busca seu lugar ao sol e à chuva, sem pedir autorização. Uma mulher que pinta as unhas pode se dar ao luxo de não pintá-las. Escolhas e decisões à sua revelia. Segue o rumo ditado pela natureza feminina cais e embarcação feroz e liberta, felina (em) simultânea contradição.    Dias de Abril sonhos de Dom Bosco lar dos golfinhos olhos da Elizabeth Taylor cor que não me cai bem vestidos de Cinderela plan

Tempus autumnus

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Que puta dia lindo! Outono, né? Cristalino sol matinal de mãos dadas com a brisa temperada da estação mais bonita do ano. Rômulo esqueceu a lancheira em casa. Acreditem, ainda faço lanches escalafobéticos (prontamente devorados) para o guri de 1.80m. Perdi a conta de quantas vezes tive de levar a térmica de Star Wars até a escola nos períodos letivos. O colégio mudou tanto… Está bem maior, menos original em sua essência. Retiraram o nome da instituição, esculpido em concreto e tão único, da entrada do prédio. Será que jogaram no lixo? O gramadão que recepcionava os alunos virou estacionamento. Lá dentro, um pátio com mais cinza do que verde. Fiquei triste e aliviada ao mesmo tempo. Rômulo já está acabando sua jornada por ali e Tomás viveu apenas o antigo espaço, autêntico e acolhedor. No trajeto até a escola, as casas da 703 sul; o comboio de jovens descendo na parada de ônibus para mais uma manhã de faculdade na UDF; pets e seus tutores; a luz morna e especialíssima da incipiente manh

Do caderninho esquecido

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Poesia é... Senso  sesos juízo algum. Miolos enternecidos cachola abilolada  moleira (eternamente) aberta. Evocação dalgum sentimento.  Uma coisinha boa no coração da gente.  Mistura de palavras que dançam e cantam.  Sensórios. Aspersório litúrgico da linguagem.  Etiqueta Tudo o que é feminino do lado direito: faca, colher, taça.  Do lado esquerdo, coração, garfo e guardanapos.  O fio cortante virado para dentro, por gentileza.

Dioturnos

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O dia acordou frio coturnos nas calçadas, contornos diáfanos. Soturna revolução neste quase sempre verão. Pálida tez do céu passa batom vermelho no espelho d'água, resquícios de ontem. Hoje, a tempestade não vinga. O sol dos trópicos não tolera a coadjuvação. Pousamos. Choveu palavras. Ágora de mulheres: feminilidades regionais, anseios globais. Queremos galáxias. Viço visgo fisga: alma ávida.

Valsas e Choros

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O velhinho buscou a mão da velhinha ao lado, nas primeiras notas do piano. Era a valsa Tardes em Lindóia, de Zequinha de Abreu. Eles permaneceram de mãos dadas durante toda a execução. Logo atrás estava eu a contemplar os cabelos prateados bem cortados, o perfil aquilino e o brinco bonito, cara de joia, da bela mulher. Eles se deixaram levar pelas reminiscências. Eu, pelas suposições. Seria a música-marco do namoro dos dois? Ou foi a composição tocada no baile quando se conheceram? Quem sabe não teriam passado a lua de mel em Águas de Lindóia? A cidade paulista, estância de águas quentes e terapêuticas, certamente figurou como destino popular para pombinhos apaixonados muito antes das lacrações das redes sociais. A beleza de seu relevo, seu clima temperado e seco, suas fontes radioativas e puras inspiram delicadezas há muito tempo, inclusive a do grande compositor Zequinha, que lançou sua valsa na década de 1920. Romance romântico destoa tanto hoje em dia. Um gesto discreto ganha a dim

Civilização persa

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Aramaica sob os eflúvios de “A Alma Imoral” Chá de romã e um cobertor de lã Verão que atravessa as esquadrias, estufa. Lembrança da torrente, percussão do céu tilintando na janela onde agora prisma o rei-sol fumegante. Brasília tem um quê de Palestina: assentamentos espalhados num cerrado árido. Brasília tem uma arrogância israelense de Distrito Federal imposto num deserto distante e arcaico. "Somos filhos da mutação e seremos salvos por ela".  Convivo com dualidades, dicotomias e paradoxos de DNA. “Compromissos e rompimentos a empurrar a alma para fora de seu habitat”. Melancolia e vanguarda; luz e escuridão. Atravesso diariamente o meu mar vermelho como quem foge da escravidão.  Cuzco lusco-fusco ouriço molusco. Cuzco cisco trisco corisco. Preto gato folgado arrepiado. Cuzco cuscuz  quentinho olhar esmeraldino. Gatuno ladino novelo em desalinho. Adora um cantinho oxalá  um colinho.

Marias-Moles e Penélopes de Atenas

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Molly Bloom - ilustração de Cosimo Miorelli Sintomático a palavra ressocialização escrita na parede fenecer a olhos vistos. Travas, cadeados, grades, arames farpados. Tudo é exclusão e escassez neste ambiente branco estéril. A telha de amianto amplifica o rumor de vozes e o som da chuva quase nos ensurdece na sala sem forro. Estamos no presídio feminino do Gama, região administrativa do Distrito Federal, e a falta de aconchego e de conforto é a tônica neste microcosmo distópico. Entretanto, o grupo de detentas se alvoroça. Traços da vida em cores adentram o cárcere. Um trio de mulheres com equipamentos e tralhas de toda ordem chacoalham o rigor árido do Bloco III. O espaço frio vira um cenário para debater afetos sob o olhar agudo das policiais que se revezam à porta gradeada. As funcionárias sabem que qualquer fagulha, a qualquer momento, pode rebentar desordem, tumulto, rebelião. Mamíferos confinados estão em permanente estado de estresse. Somos animais cuja liberdade é a essência, n

Expiação

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Refratária ao burocrático permeável às janelas, às sombras e às penumbras de soslaio. Floreio, floresço  entre as ruínas do dia. No país dos trambolhões charlatães e lamaçais não driblamos as crises existências sem subterfúgios. Expiamos e espiamos - refugiados - as horas impressas nas nuvens.