O importante é sonhar

“Você está aqui por curiosidade ou tem algo importante para me dizer?”

Uma pergunta assim pode definir toda uma vida, ainda mais vinda de alguém que enxerga o que falam nossos olhos. Nada de segredos. Na iridologia você se sente totalmente nu estando completamente vestido. Uma intimidade despudorada é criada entre o decifrador e você. O “perscutador” de almas. A janela escancarada.

Estava ali por curiosidade E porque tinha algo importante para dizer. Não havia alternativa. Era minha primeira vez no iridologista. É bom quando a gente consegue fazer algo inédito no limiar dos 40 anos. Prova que ainda há muito o que se provar por aí.

A luz intensa incomoda. Uma lanterninha mirando além da retina, furando a matéria mole. Você vê o seu olho refletido na lupa. Lado direito, lado esquerdo, lado direito, lado esquerdo. Ele olha 5, 10 vezes, para, digita algo no computador que está com a tela virada para si próprio. Não tenho ideia do que os meus olhos dizem para ele. O psiquiatra falou que, quando os olhos estão falando a mesma língua que a boca, é sinal de que a cabeça está em equilíbrio.

Entendi, enfim, porque fico tão angustiada ao chegar perto de uma colega de trabalho. Os lábios dela sorriem, mas o olhar continua vítreo, opaco. Volto a sentir a luz perfurante no olho. Mil alucinações visuais explodem ao fim de cada estocada. Vou sair daqui como tivesse tomado LSD.

Um mapa de cada olhar está sobre a mesa. Centenas de informações. Ele não diz palavra por meia hora. Só examina com lupa e lanterna. De repente, cessa. Sem saber nada de mim, além dos meus dados pessoais básicos, acerta: “Você tem o perfil que chamamos de agitador. Nasceu assim, para viver em extremos. Não gosta de rotina, precisa inventar, estar sempre em movimento”.

Segue o diagnóstico incômodo, pois revelador. “O pulmão tem uma hipoeficiência. Você tem respiração curta, o que emocionalmente dificulta as trocas: dar e receber”. Caramba, não sabia que olhar poderia entregar tanto! E tasca: “Mas você está aqui por curiosidade ou tem algo importante para me dizer?”

Cansada de desfiar o rosário de perdas, relato apenas a angústia da insônia. Não me dava por vencida até ontem sobre essa história de precisar de remédios para dormir. “Você não gosta de tomar remédios, certo?” Ele larga, verbalizando minhas elocubrações.

Mas cheguei à conclusão de que insônia é doença crônica como hipertensão e diabetes. Não se cura, só se trata. E que vou, possivelmente - eu me rendo - tomar remédio toda a vida para dormir as sete, oito horas dos justos. Pilulinhas e gotinhas receitadas pelo terapeuta holístico, homeopata E psiquiatra. Todos juntos. Não há escapatória. O importante é sonhar.