Meu dia de Bolsonaro

A mídia ainda reverbera os eventos nefastos que tiraram a classe média da zona de conforto. Não sei que conforto pode existir em se isolar em condomínios murados, eletrocutados, armados, mas talvez a classe média se alente com essas medidas paliativas que tentam controlar um mal que não vai se aplacar sem escola, lazer e perspectiva de futuro de qualidade (o pacote fechado): a violência urbana.

Então ela está aí, fazendo todo mundo arrancar os cabelos. E agora chegou aos colégios. Agora não, já tem um tempo que as relações ali também estão bastante violentas. Professores massacrados, alunos idem. Bullying dos dois lados, não justificando nada, apenas complementando essa “falta de rumo brasileiro, esse tom de desespero que assumiu o nosso amor”.

Imagina se todo mundo que tivesse sofrido perseguição na escola saísse matando seus algozes do presente ou do passado? Não sobraria adulto para relatar seus trauminhas de infância. O buraco é mais embaixo e no fundo dele estão questões de estrutura familiar, incentivo escolar, formação dos professores, lazer adequado, instituições públicas sólidas, responsabilidade social e sonhos. Crianças que não enxergam horizontes não têm medo de matar ou morrer.

Sempre que ocorre algo brutal no Brasil, voltamos - jornais, sociedade, especialistas, taxistas, políticos oportunistas e o cara maluco que subiu no mastro da bandeira nacional na Praça dos Três Poderes -, a entoar o mesmo hino, as mesmas frases feitas para embrulhar temas como desarmamento, pena de morte, mudanças na Constituição...

Vou deixar aqui o meu ponto de vista. Raso, pois confesso um certo cansaço dessa ladainha pouco pró-ativa. Mas o que eu penso é o seguinte: Sou totalmente a favor do desarmamento. Não gosto de armas e não acredito que elas resolvam nada, só estragam tudo.

Não sei mesmo como resolver o problema das armas ilegais no Brasil, um país tão grande, tão carnavalesco, tão desigual, tão permissivo... Mas não vejo como a legalização da compra e venda de revólveres vai tornar a nossa sociedade mais tranquila ou mais civilizada. O acesso a qualquer tipo de arma tem de ser dificultado sim! Veementemente!!!

Quanto ao bullying, eu já fui vítima, você também já foi e só a menina linda de olhos azuis que se chamava Cristiane e estudou comigo lá Cultura Inglesa deve ter se livrado dessa chateação. Ou ainda a Elisabeth Taylor, pois aquela era perfeita desde a fase fetal. Portanto, o bullying não justifica nada e está perigosamente descambando para o sensacionalismo. Para um processo de vitimização que prejudica a  harmonia da tríade escola-aluno-família.

As crianças são e serão sempre bárbaras (nos dois sentidos). A Mônica sempre vai bater no Cebolinha que, por sua vez, vai continuar infernizando a coitada com seus gritos de “dentuça, baixinha, gorducha!” (Um caso clássico de bullying... Daqui a pouco vão querer censurar o Maurício de Souza!! Ou pior: chamar psicólogo para solucionar conflitos entre a turma do bairro do Limoeiro).

Acredito piamente que as crianças têm de aprender a resolver seus impasses infantis entre seus pares. Claro que há casos e casos. E se um deles já entornou ao ponto de não poder ser contido pela própria gurizada, tá na hora de chamar os adultos. O problema é que essa novíssima sociedade média está criando  filhos superprotegidos de tudo. Protegidos até da responsabilidade de arcar com seus atos e palavras.

Complementando esse processo insano, a autoridade dos pais e dos professores é posta à prova diariamente, ridicularizada em animações no Cartoon Network, nos filmes, nos livros (já experimentaram ler um volume do bestseller “As aventuras do Capitão Cueca”?) e na vida real.  Além disso, os responsáveis pressionam a escola a manter um papel de mera observadora no quesito disciplina.  Resultado:  a escola perdeu o moral para repreender os alunos. O cadarço está frouxo. Os tombos, consequentemente, tornam-se inevitáveis ou mesmo fatais.

Quanto à necessidade de mudar as leis, assumo meu reacionarismo: queria, sim, um Estado mais punitivo. A legislação no Brasil favorece a criminalidade. É muito permissiva - nosso traço cultural Macunaíma. Todavia, não acredito em pena de morte. Soa pavoroso dar ao Estado o direito de tirar a vida de uma pessoa. Prefiro prisão perpétua sem direito à condicional. Algo bem light.

Leis mais severas seriam bem-vindas. As qualificadoras deveriam ser, de fato, levadas a sério. O enervante "réu primário" tinha de acabar para determinados tipos de crime (assassinato, sequestro, estupro). E esses indultos disso e daquilo são evidentemente uma catástrofe.

Sempre que um preso sai, comete crime ainda piores do que o levou para a prisão inicialmente (também, com a beleza de sistema carcerário desse fim de mundo). Ou vira foragido...Um bom exemplo: aquele nojento que recentemente matou duas irmãs no interior de São Paulo. Era um fugitivo que saiu no indulto de Páscoa.

Pois é, o assunto é palpitante e dilacerante. E vamos parar de achar que o Brasil é um país pacífico. Só somos pacifistas no pior sentido: o de não lutar e protestar nas ruas pelos milhões de reais roubados dos cofres públicos a cada legislatura. No trânsito, nas cidades, nas escolas, estamos mais para Líbia do que para Japão.

Comentários

  1. É, assunto-bomba. Não concordo que as crianças têm que resolver somente entre seus pares os seus problemas. Bullying é a lei do mais forte na escola, e existiu no Brasil ditatorial, porque não acreditávamos nas instituições, não acreditávamos que podíamos reclamar com nossos pais que na escola éramos agredidos porque não acreditávamos que tínhamos direito ao diálogo. O bullying não trata de dois garotos se encrencando no recreio, trata de garotos abusando moralmente ou fisicamente de outros mais frágeis emocionalmente ou fisicamente, são meninos como esses que você disse, que acham que podem tudo, como talvez os pais achem que podem tudo (talvez, porque não sei, não vou ser simplista e dizer que a culpa é só dos pais, que às vezes estão ganhando a vida em dois empregos de 12 horas, e os filhos, em vez de seguir o exemplo dos pais raladores, estão lá, esmurrando colegas para suprir a falta dos pais em casa). Acho que faz parte de um país democrático acreditar que existe uma autoridade constituída que vai zelar pela justiça na escola, e daí poderemos acreditar que uma autoridade constituída zelará pela justiça também fora da escola. Então poderemos ser cidadãos que usaremos a nossa voz para exigir direitos, porque saberemos que as instituições funcionam, que podemos apelar a elas e sermos ouvidos, porque nosso direito será respeitado. Apelar para a professora, a orientadora, a psicóloga, a diretora, o pai, a mãe nos ensina que temos voz para gritar e sermos adultos que podemos protestar.
    Acho que o assunto foi perfeito e totalmente pertinente. Não somos pacíficos nem pacifistas, somos massacrados porque aprendemos que só nos curvando temos chance. Podemos aprender diferente, podemos aprender que temos dignidade e que vale a pena lutar por ela.

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  2. Lido diariamente com isso, todos os dias há pelo menos duas prisões em flagrante (aqui no Paranoá, em Planaltina eram muito mais), ou por porte ilegal de arma de fogo, ou por roubo a mão armada, ou homicídio com armas de fogo. Todos os dias. E todos esses crimes são praticados com armas ilegais (armas de uso permitido, adquiridas ilegalmente, sem registro e porte, ou armas com numeração raspada, ou armas de uso restrito). Todas essas armas vão parar nas mãos dos bandidos por meio do tráfico ilegal de armas de fogo, que nada tem a ver com o comércio legalizado de armas de fogo. É bem verdade que uma parte (bem pequena, ao contrário do que as ONGs dizem) dessas armas vêm da aquisição legal, e vão parar nas mãos de bandidos porque são roubadas ou furtadas da casa ou empresa de quem as detém legalmente. Só que essas constituem uma pequena parte, como disse. A grande, imensa parte delas vem de fora, do tráfico internacional, principalmente, entrando no país pelas nossas fronteiras desvigiadas. Também não gosto de armas de fogo, apesar de deter porte legal (posso, se quiser, andar armada), de maneira alguma penso em ter uma arma em casa. Todavia, não se pode querer que o cidadão honesto, que queira se proteger em casa, e queira também se submeter a todo o regramento legal, submetendo-se a treinamento e daí conseguindo o porte legal, não exerça esse direito. Isso está intrinsecamente ligado ao direito à autodefesa, resguardado na Constituição. De outro lado, defender a proibição do comércio de armas de fogo colocaria o país em uma situação absolutamente desfavorável, no que diz respeito à produção bélica nacional. Nossa indústria bélica vai muito bem, tem projeção importante no exterior. Com a proibição do comércio de armas de fogo no país, em razão da reciprocidade, nosso comércio internacional morre na hora (se não podemos vender, não poderemos exportar). Acho este o ponto principal da controvérsia, e tenho para mim que todas as organizações que apóiam o fim do comércio de armas de fogo no país anseia por isso (interesses não muito confiáveis, a serviço de quem?...). Nossa legislação é bastante dura com o porte ilegal de armas. O grande problema são as “interpretações” judiciais dos artigos trazidos no Estatuto do Desarmamento (lei 10826/03). Por exemplo, quem fosse preso, logo após a edição da lei, com uma arma de uso restrito, ou com numeração raspada (crime grave!), não teria direito à liberdade provisória (era um dos artigos da lei, expresso!). O nosso STF considerou inconstitucional esse artigo, beneficiando todos os que estivessem presos por esse motivo. E por aí vai. O Grande Lula editou, por duas vezes (em 2008 e 2009) uma Medida Provisória que estendia o prazo para a entrega das armas, e sabe o que ocorreu? Todos os que eram flagrados (BANDIDOS, mesmo) com armas em casa não eram processados, pois os Tribunais e o próprio STJ entenderam que a extensão do prazo era uma “abolitio criminis” (não era mais crime ter arma em casa). Então, isso é para dizer que a imprensa mostra apenas o que quer, e isso me dá nos nervos. A questão é muito mais controversa e complexa do que está sendo posto na mídia, e não se resume, apenas, a ser contra ou a favor de armas. Afinal, quem que é da paz concorda com armas?... Bj, Ana
    P.S.: se para acabarmos com a violência é necessário acabar com as armas, devemos também pensar nas armas brancas: facas de cozinha, tesouras, alicates... Se a culpa dos homicídios de trânsito é do álcool, então que se proíba a venda de bebidas alcoólicas, e acabaremos com os homicídios de trânsito... Ou então que se proíbam logo os carros, e andaremos todos de bicicletas...

    Bjss,
    Ana Cláudia

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  3. Lu, só complementando o e-mail: a lei 10826/03 já é bastante restritiva quanto à compra, posse e porte de armas. Só precisa ser respeitada. Quanto à criminalidade, eu percebo que no Brasil as pessoas têm inclinação para sentir pena do criminoso. Na lide criminal é bastante comum isso: o processo chega, o Promotor olha para a cara do réu, examina a folha de antecedentes, e acaba tentando achar uma explicação para o crime. Até eu, no início da profissão, fazia isso, tentando encontrar respostas para uma pessoa agir de forma violenta ou contra o patrimônio, a vida, a intimidade sexual alheia. Hoje, cheguei à conclusão de que o mal existe, e existem pessoas dispostas a agir com maldade com as outras, sem maiores explicações, pelo simples prazer de transgredir e trazer a infelicidade ao próximo. Não existe pobreza ou psicopatia que explique o que a gente vê diariamente no Fórum. Só. Bj, Ana

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  4. Minha cara Lulua Linda,

    Li e concordo quase que integralmente com o que você disse.

    Leis mais rígidas - em especial para os crimes que você citou, incluindo aí os de colarinho branco - educação, prevenção, coerção, punição e valorização da família são elementos básicos para a existência de uma sociedade mais justa. Não adianta sonhar com um mundo cor-de-rosa como querem os "cavaleiros dos direitos humanos".

    Li dias atrás uma frase com a qual concordo integralmente: "direitos humanos são para humanos direitos".

    Lugar de vagabundo é na cadeia ou na cova.

    Preso tem que trabalhar para pagar o que a sociedade gasta com ele e para sustentar os seus, os quais abandonou por má conduta.

    Na próxima eleição votarei no Capitão Nascimento.

    Estamos sim com nossos valores de cabeça para baixo. Se não os resgatarmos seremos sempre uma colônia da pior espécie. Escravos culturais que riem da própria desgraça.

    No que não concordei com você? Na questão do desarmamento; não são as armas legais que promovem a violência. São as ilegais, justamente aquelas que não conseguimos combater.

    As armas legais, embora jamais tenha cogitado a possibilidade de ter ou de portar uma, infelizmente são auxiliares na garantia da segurança do indivíduo e de sua família.

    Em Israel, onde estive há pouco, portar uma arma é direito de qualquer cidadão. É claro que o tal cidadão deve pertencer a uma das forças de segurança, morar em um dos territórios ocupados, ter um trabalho que exija o uso (catalogado pelo governo, é claro) ou ainda provar que está sofrendo alguma ameaça à própria vida ou à vida de sua família.

    Nem por isto, e apesar de viverem em constante estado de alerta, fazem um Vietnan por ano como no Brasil ( e não contabilizo aqui as armas que circulam pelos nossos campos de batalha asfaltados). É uma questão de educação e de cultura, que já falamos temos que corrigir se quisermos ser algo que possa ser chamado de nação.

    Um grande beijo prá você, com saudade do seu amigo,
    Walton Jr.

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  5. Dear comentadores,

    entendo o ponto de vista de quem é a favor do porte legal de armas, mas continuo a defender a proibição do porte legal de armas para toda a população.

    Se o porte legal de armas não funciona nos EUA, um país certinho, legalista, educado, civilizado e respeitador das leis (eu morei lá e vi o quanto a população é obediente), imagina nessa esculhambação que é o Brasil.

    Armar a população só pode nos colocar num buraco ainda mais fundo na segurança pública. Vai ser um banho de sangue. Gente se matando no trânsito, na escola, no hospital... O irmão do paciente vai lá acertar as contas com o médico que não prestou pronto-socorro e descarrega o revólver no cara. A mãe vai na escola e atira na professora que fez o menino engolir uma bola de papel...E por aí vai...
    Vamos resolver à bala o que pode ser resolvido com tapas e socos.:)

    Nada justifica armar uma população ignorante, sem civilidade, sem noção de direito e dever, sem educação, e com grande propensão a dar sempre um jeitinho para burlar as leis. Nada.

    Abreijos,

    Lulupisces.

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