Dreamline


"Você deve compreender-me se eu quiser sonhar"...
(Márcio Greyck, do cancioneiro brega da década de 1970)

"Pendurei velhos fantasmas, no armário.
Tranquei as portas, apesar da existência das frestas".
(Paula Valéria Andrade)

Existem pessoas com quem sempre sonhamos e outras como quem nunca sonhamos. Não se trata de viagens oníricas recorrentes ou iguais, tal qual pesadelos obsessivos, terrores noturnos que alguns sofrem ao longo da infância ou até mesmo na vida adulta.

É sonho diferente, mas com a mesma pessoa, entende? Por que invocamos uns com maior frequência do que outros? 

Penso que não tem relação com a intensidade do amor, não. Há gente que amo pacas e com as quais nunca tenho um sonhozinho sequer. Tampouco tem a ver com desgosto.

Pode ser um sinal de saudade. De incompletude. De insegurança. Do sentimento de inadequação ou de inacessibilidade. De projeções.

Por exemplo: sonho muito com uma grande amiga desde 1989. Brinco que ela é o meu alter-ego onírico. De fato, ela é um dos seres humanos de sentimentos mais insondáveis com quem convivo. Quiçá sinta, subconscientemente, a necessidade de acessá-la pela fenda do imaterial. Tentativa de cativar uma personalidade fugidia e intrigante.

Outro que de vez em quando aparece na minha dreamline é um amigo inseparável da adolescência e da juventude. A razão de sonhar com ele ao menos 1 vez por ano me diz que sinto falta de sua companhia gentil e leal. Ou a leitura poderia ser: seguimos tão longe, tão perto?

Percebo sonhos como recompensas mágicas. Revelações sobreviventes das noites mal dormidas nesses anos todos. 

Faz tempo que mamãe não aparece. Entretanto, várias mulheres importantes nunca pintaram no meu oráculo. 

Sonho com a fazenda onde cresci quando preciso de um refúgio seguro. 

Não lembro de voar. Será que o medo de avião bloqueia? Tampouco de despencar de falésias. Não costumo sonhar com bichos aterrorizantes como baratas. 

Não tenho pesadelos por causa de filmes de terror. Já estou vacinada contra eles.

Se acordo e recordo o que se passou na madrugada, geralmente envolve relacionamentos. Os maus presságios também. As perdas precoces são uma sombra capaz de escurecer o idílico. Mas não falemos de fantasmas, não dessa vez.

Ainda faço sonhoterapia e um curso sobre análise dos sonhos. 

“O Oráculo da Noite” - a história e a ciência do sonho, do neurocientista Sidarta Ribeiro aguarda na fila de leituras.

Deixo para quem não caiu no sono até aqui, as palavras do líder indígena e filósofo Ailton Krenak: "os sonhos são uma instituição que prepara as pessoas para se relacionarem com o cotidiano, trazendo conexões do mundo onírico para o amanhecer”. 


Comentários

  1. Eu sempre sonho que minha casa está em reforma.

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  2. Pois eu sonho muito com mamãe perguntando pelo Eduardo. Sonho que estou caindo de uma ponte, mas antes de chegar acordo assustada e chorando. Sonho com Bezinho já grande. Enfim sonho. Há sonho com papai me ensinando tabuada. Tento escrever quando acordo pra jogar na loteria, mas não consigo lembrar.

    Leila Brandão

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  3. Creio que todos perguntaremos: já sonhou comigo? E comigo? Oxalá, estejamos na lista. Excelente Lu. 👋👋👋👋👋👋👋

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  4. Gostei. Só uma dica: todos os personagens se um sonho são partes de você que de alguma forma eles representam. Só papai e mamãe têm um significado diferente , são eles mesmos dentro de você. E mais, ao acordarmos fazemos uma edição rápida para que os sonhos tenham algum sentido e sejam minimamente permitidos, chamada elaboração secundária. Sugestao: leia agora sua crônica. Bjs,

    Ângela Sollberger

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  6. Oi Manalú!!
    Gostei do "dreamline"...
    Tenho sonhado com frequência, com coisas que nem me lembro...
    Segundo os entendidos, se sonhamos, seja lá com o que for, é porque de fato, dormimos o sono profundo...
    Mas essa quarentena que virou um "sem fim", nos remete a todo tipo de estratagema para fugir da dura realidade de cárcere privado, da absurda contenção de desejos e de liberdade, para mim, pior que camisa de força, pois me tortura o corpo, sufoca a alma...
    Logo eu, acostumada que sou com casa aberta para fora e, se não bastasse, com fazenda todo final de semana, faça chuva, faça sol...
    Onde eu espairecia e carregava as baterias, andando à cavalo, lindando com criação e cultivos... puro diletantismo e alento...
    Eu, ser que sou, livre de amarras, por natureza...
    Para quê racionalizar sentimentos, prever futuros, qdo o horizonte não descortina nunca, qdo a mais promissora das vacinas mostra uma reação indesejável e o que era algo alcance da mão já não se sabe mais qdo vai dar e se vai dar...
    Arreh, querida irmã!!
    Melhor sonhar, montar cavalo arriado, contar com o pássaro na mão e se um dia ele voar, ficar com a certeza de que valeu...
    "Viver, sobreviver, ultrapassa qqr entendimento"
    Versão da Marilena, uma sobrevivente....

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    1. Irmãs no bem escrever também. Impressionante a fluidez das palavras quando vcs duas escrevem!

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  7. Adorei Lua!!! muito bom!!
    Tenho sonhado cuidando de um bebê...
    Minha mãe está grávida.
    Pode estar atrelado a minha ânsia de vê-lo em breve.

    Sarah

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  8. Ah, ótimo!
    Adoro ser seu alter-ego onírico rss
    Vou ter que manter o ar de mistério, se isso é responsável pela honraria.

    Marisa Reis

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  9. Oi Lulu, também gostei da crônica sobre o sonho... deu vontade de te contar com o que sonho mais... Viagens com bagagens complicadas, voos perdidos, voos improváveis, que planam muito baixo por entre casas e prédios. Saudades de você, sempre.

    Andréa Bolzon

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  10. Adorei! Hehehe

    Clarice Veras

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