1° de fevereiro




Nunca havia ouvido Spice Girls para caminhar. Aliás, tirando os sucessos das rádios, não conhecia a maior parte da canções. Ótima companhia. Me senti a própria cheer líder agitando meus pompons (ou melões) pelo calçamento.
A garoa era fina e mantinha meu corpo resfriado com uma película diáfana. O verão outonal de Brasília é adorável. 

Havia uma árvore arriada no meio do caminho, onde o beija-flor não precisou gastar muita energia (ao contrário de mim) para colher seu néctar do dia.

Havia guarda-chuvas de várias estampas e um cachorro de capa de chuva. E nas primeiras fotos da igrejinha de 2020 havia um casal de noivos em fina estampa. Não tive coragem de tirar uma foto na ida, mas na volta, encarei. Não me permito me arrepender do que não fiz. Já me basta o curso de Antropologia abandonado. 

Aproximei-me da entrada da nave e como uma turista desavisada disparei os cliques. Percebi que a noiva estava de all star. De longe me parecera um tênis de corrida. 

Havia poças refletindo o verde das copas e espatódeas espatifadas pela força do vento.

E havia meu pé esquerdo que me perturbou as férias todas. Porém, ignorar o envelhecimento é preciso. Além disso, o ortopedista celerado me garantiu que era assim mesmo, sinal de que vivi, de que bailei. Não me tascou outra injeção na bunda de dexa-something (só pode se usada de três ou de seis em seis meses), mas fez uma massagem na região plantar que mostrou cada nó de tensão. 

E quando eu escrevia esse texto, após minhas abdominais embaixo do bloco e com suor pingando pelo queixo, uma senhora parou ao meu lado. Um frêmito (obrigada Quintana, por colocar essa palavra em meu mapa) gélido me tomou, ela não era simpática.

Levei alguns segundos para tirar as garotas apimentadas dos ouvidos e então ela repetiu:

-Você viu o passarinho?
-Não, preciso colocar meus óculos para ver alguma coisa.
- Ali no primeiro degrau. Deve ser um joāo-de-barro. Está ferido? Deixa estar.

Cheguei mais perto, ele se escondia. Conversamos um pouco, ele me olhou. Não soube o que fazer. Tenho agonia de passarinhos, aves em geral. São tão frágeis. 

Subi e incitei os meninos. Tomás desceu com uma caixa de sapato. Todavia, o marronzinho já havia partido. Alívio. Eu ficaria louca com esses moleques cuidando de passarinho dentro de casa. 

Não deveria estar doente, pois. Nem de asa quebrada, nem nada. Queria apenas repousar e se esconder da chuvinha que lhe penetrava os ossinhos. Ou ainda coroar o fim da minha caminhada na cadência do efêmero.

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