Pontilhismo
A chuva fina lança uma camada de verniz sobre os objetos da rua. O asfalto ganha uma lâmina resplandecente. A cor nos bancos de praça se realça. O chão de concreto das calçadas e das quadras esportivas é salpicado pelos pingos d’água, uma verdadeira aula de pontilhismo. A Natureza haveria ensinado Signac e Seraut a pintar?
Já nas folhagens, as gotas não se desfazem formando pinturas ou pátinas. Orvalho, bolhas diminutas cobrem o manto verde do gramado, das copas das árvores. A vegetação é tela sutil, não dura e estéril como as interferências humanas na paisagem. A água pousa, não se dilui. Não há choque, há contato. O líquido é absorvido aos poucos ou vai embora pela ação do sol.
Meus olhos, mais lúdicos do que científicos, observou o comportamento da calma chuva de verão ao cair sobre mim.
Se ela, tranquila, já mostra diferença brutal entre tocar a concretude de avenidas e de calçadas e alcançar a cobertura vegetal, imagina quando se enfurece? O caos urbano provocado pelos temporais é o grito gutural, natural de uma água que não quer se espatifar no meio da rua. Menos verde-esponja, mais concretude da destruição.
O leito dos rios e dos céus que se transformar, se evaporar ou repousar nos desvãos do planeta. Não almeja as manchetes catastróficas dos jornais. Pretende apenas cumprir sua missão mística e essencial de engravidar a Terra.
Permitam-lhe, por gentileza.
Fui construindo mentalmente cada imagem desenhada no texto.
ResponderExcluirBianca Duqueviz
Sempre me encanto com o seu olhar poético sobre tudo.
ResponderExcluirCynthia Chaib
Muito bom, lindo texto.
ResponderExcluirCecília Soares
Poético e reflexivo.
ResponderExcluirMárcia Romão
Muito bom!
ResponderExcluirRenata Assumpção
Uma poesia o texto, em sua sensibilidade e beleza, ternura... Forte, contundente em sua mensagem...
ResponderExcluirMarilena Holanda