Casulo
A tempestade furiosa cuspiu gelo.
Éolo bafejava sobre as árvores aflitas, que tentaram resistir à violência dos golpes, mas algumas tiveram os braços arrancados na escuridão da noite sem lua.
À porta, tremia o cachorro. Em sua maturidade rural, jamais presenciara batalha tão sangrenta.
- Passe pra dentro, rápido!
As janelas de tramela sacudiam à revelia. O chalé poderia, a qualquer momento, ser tragado para o mundo de Oz.
No escuro aquecido do quarto, ela dormia um sono raro. Não tomou conhecimento das tormentas; nada ouviu da ventania; nada presenciou dos clarões ininterruptos no levante do céu.
Sentia-se protegida, imersa em líquido amniótico. O aroma de lótus embalava o descanso da mulher - de repente, menina - deitada em posição fetal, ao lado da própria Gaia. Por mágica, tornara-se filha outra vez. E como era reconfortante o sentimento filial do cuidado.
Abriu os olhos no dia claro e a figura maternal seguia em vigília. Emanava, de seu corpo flexível, luz e afeto.
Abrigada no casulo da bruxa boa, não havia sinais de desassossego, pois Bóreas, Nótus e Eurus partiram, deixando apenas o irmão, Zéfiro, com a sua suave brisa matinal.
Entretanto, pelo jardim jaziam as provas do embate: folhas e vasos de plantas tombados; araucárias feridas; os fios da internet rompidos no chão encharcado.
A umidade dilatava as células enquanto nuvens baixas contavam os estragos da madrugada.
À mulher-de-repente-menina restou o espanto curioso de quem perdera a parte sombria da fábula, aportando, sem nenhum arranhão, no final feliz.
Que lindeza👏👏👏💝presentão ler seus textos desses poucos dias intensos que passamos juntos...realmente vc me surpreendeu não ter acordado com tamanha fúria da natureza!🙏😍
ResponderExcluirAmei! Que texto bonito e do quilate de grande literatura!
ResponderExcluirMaria Félix Fontelle
Maravilhoso! Amei!
ResponderExcluirCecília Pereira
Palmas!
ResponderExcluirDébora Cronemberger
Muito bom!
ResponderExcluirMuito bom o texto , Luciana ! Obrigada 🌷
ResponderExcluirDas entranhas desta iluminada pisciana, nasce mais um dos seus belos textos. Parabéns, querida Luciana.
ResponderExcluirMaria Augusta Dib
Ah, que bom que você aproveitou a sugestão. Eu tava ouvindo sua narrativa na nossa conversa com um texto pronto!
ResponderExcluirElisabeth Ratz
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ResponderExcluirA viagem fez bem, hein, Lu! Estou vendo que teremos várias obras-primas literárias de diversos gêneros. Adorei.
ResponderExcluirRenata Assumpção
Lu, você tem uma escrita com frases perfeitas, construídas com exatidão e únicas. Me lembrou o estilo de Madalosso. Li dela: "tudo poder roubado". Adorei! Mas você não usa palavrão, que Giovana usa sem choque, no lugar certo.
ResponderExcluirMaria Heloisa Soares