Léu







As coisas andam sem graça e por isso só podem ser nomeadas abstratamente. Assim estão porque a vida virou uma produção trash, filme Z. Entretanto, a recíproca não se encontra. De que vale a ficção sem a realidade para lhe dar respaldo? Para ser o contraponto que lhe equilibra?

Às vezes, por segundos, minutos, quiçá horas, é possível se esquecer de que estamos presos nessa matrix. O aroma da dama da noite atravessa a máscara e se experimenta a liberdade palpável de ir e de vir, sem barreiras.

A criança que tagarela suas primeiras frases desconexas e caminha sobre o piso tátil para cegos. Ela não compreende a linha limitadora, apenas se diverte. Esse é o mundo que se lhe apresenta e ela o absorve com a voracidade da mente em expansão. Tela para pintar, página por escrever, passos a avançar.

As árvores centenárias sobreviveram ao fogo, aos parasitas, à seca, ao machado, à motoserra por inúmeros ciclos. Guardam, nas raízes e nos troncos, camadas de cicatrizes e de alumbramentos. Elas têm a certeza da perenidade e da renovação. 

Mais uma década, talvez outro século, virão anunciados pelas copas abertas ao léu, aguardando novas chuvas. 

Procure ser uma delas, diria Manoel de Barros à menina angustiada.



Comentários

  1. Amei.

    Ângela Sollberger

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  2. Belíssimo texto, Luciana, parabéns!

    Jalmi Conceição de Souza

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  3. Estou na mesmíssima vibe e caiu como uma luva esse trecho: "as coisas só podem ser nomeadas abstratamente".

    Re Osório

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