Vida campeira

Cavala de flancos intensos, patas rebeldes,
sem dono nem domação, rebentando espumas nesse galope,
namora mais do que o amor, a sorte.

Lya Luft

Esse país sempre surpreende. E não apenas quando entrega o jogo das quartas de final para a Holanda. É de arrepiar o ecletismo do Brasil-mosaico. Num momento você pensa que está na Itália, comendo galeto da Colônia. Não o que encontramos aqui em Brasília, mas o verdadeiro, pequenino e tenro franguinho. Asinhas e coxinhas quase garnizés, acompanhadas de polenta suculenta, não esturricada. E de raddichio novinho, colhido na horta do fundo da casa.

Cem quilômetros pra frente, já estamos em outra história. O que se vê são os Campos de Cima da Serra da tal Vacaria, que hoje poderia trocar de nome para Sojaria. O gado se foi, mas a tradição de criar cavalos crioulos fincou pé. Não tem monocultura que faça esses animais valentes saírem do coração dos gaúchos.




Na minha volta ao mundo brasileiro em cinco dias, nunca imaginei que fosse pernoitar em uma fazenda de criação desses seres simpáticos. Sempre gostei de cavalos. Aliás, o único animal pelo qual nutro uma genuína vontade de aproximação. Infelizmente os cachorros não sabem disso e insistem em me cheira e lamber. Se manquem, tá!

Amanheci na Capão do Índio, propriedade tradicional, que há 30 anos se especializou no plantel crioulo e já ganhou vários prêmios, e aguardei ansiosa a chegada de Olga, a professora que, em duas horas de cavalgada com direito a trote e também a um galopezinho, me proporcionou uma autêntica aula de equitação gaúcha. Que sempre começa com o vocabulário específico, é claro. Nada de arrear a égua. É encilhar. Nada de amansar o garanhão, que ninguém quer tirar a personalidade do bicho. Em Vacaria se doma. Ponto.



Raça valente, tenaz essa dos crioulos. Animais bom de lida e bom de trato, com suas cabeças curtas e um pouco mais de um metro de altura. O trote é macio. O galope, audaz. As fêmeas geralmente ganham o nome de gurias. A minha era Gabriela. E Olga, a apaixonada amazona-advogada, que prefere cavalgar a elaborar petições iniciais, seguia me explicando tudo: da geografia à economia da região. Dos tipos de aves encontradas na propriedade a melhor maneira de aderir o bumbum à sela e desfrutar dessa parceria caprichosa: cavalo-cavaleiro.

O vento gélido rasgava as narinas. O céu tinindo de azul se mesclava ao verde vasto lá no longe. Uma manhã de julho considerada quente para os nativos. Mas eu não sabia se minha mão doía de frio por apertar a rédea ou se era por estar vivendo aquela sensação fronteiriça de prazer e medo que somente as experiências lúdicas e inesquecíveis podem proporcionar.

P.S.: Saiba mais como cavalgar pais afora no site cavalgadasbrasil.com.br

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