Repetência


“Dona de mim outra vez deixo-me levar por este fluxo mágico que me convoca e estou ali, falando com alguém e é bom estar assim tão só e tão acompanhado. Escrever exige solidão, silêncio e uma outra frequência para conhecer o som das palavras e seus mais recônditos sentidos e significados. Quem escreve precisa deste isolamento, desta perspectiva e deste jeito de estar no mundo, distraída, um pouco presente, outro pouco ausente. Requer rituais e entrega absoluta aos rituais, travessias por um mapa desconhecido, e uma paciência infinita. Porque sempre somos vistos como pessoas esquisitas, estranhas”. 

(Lélia Almeida)



Sapituca matinal para ver o dia lá fora. Agosto é pródigo em horas perfeitas para as pipas ziguezaguearem acima de nossas cabeças. 

Na era do zunido de drones, os papagaios resistem no céu com a elegância silenciosa do papel de seda atado às varetas de bambu. A delicadeza do voo se assemelha às bandeirolas juninas flanando impulsionadas pelas rajadas de vento.


O início da manhã e o fim da tarde são igualmente irresistíveis ao ar livre. O friozinho da aurora limpa as vias aéreas e desperta o sentido do olhar. O sol se espreguiça sobre as empenas e tatua nas fachadas sombras brincantes, filigranas nipônicas no Cerrado.


Ao cair da tarde, as réstias de luz pousam sobre troncos e galhos. A mornidão do pão que sai do forno e lhe traz reminiscências infantis aconchegantes. Ajusta-se a visão para o que decai, para o que amadurece.

Enquanto as primeiras sensações da manhã são verdes, hirtas, jovens; os sentimentos do lusco-fusco nos alcançam na maturidade da existência, prenhe de reflexões melancolicamente poéticas.

As horas do dia brotam e fenecem em perene repetência e penitência. Metáfora do nascer e morrer sorteados, salteados entre nós.



Comentários

  1. E meu salário de agosto ainda não caiu! KKK!
    Adorei. Esse olhar me dá vontade de morar em Brasília.
    Bjs e boa semana,

    Karla Liparizzi

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  2. Ahhh, eu sinto as cores de Brasília e o passar do tempo por aqui...

    Bianca Duqueviz

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  3. Gostei, Lu! Realmente a gente viaja e passa por lugares sem nem sair de casa.

    Leila Cruz

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  4. Lindo, Lú! Agosto quando não está nublado por aqui são dias lindos, não como os de Brasília, o vento gelado não deixa as janelas escancaradas, só frestas. Tem feito frio por aqui.
    Morro de dó das pessoas que moram nas ruas. Seu texto, belíssimo!

    Renata Assumpção

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  5. Belíssimo texto🙏🌸🌷☘️🌻sempre grata!
    Cynthia

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  6. Bela epígrafe, belo texto, belas fotos, Luciana!

    Linde Braghini

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  7. adoro essa luminosidade e essas florações de agosto no cerrado 😘

    Giovana Tempesta

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  8. Lisonjeado de você sempre compartilhar comigo.
    Adorei, minha irmã. Você realmente tem o dom da escrita e sabedoria .

    Mateus Cellano

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  9. Adorei!
    Belo!❤️

    Elizabeth Santos

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