Na lona






Por gentileza, críticas destrutivas só no privado. Entretanto, ontem perdi a paciência e o nonsense: chamei um habitante da Bolsonaroland de pateta por assumir que foi um dos milhares a repassar fake news por grupos de zap. E não foi sequer na minha timeline! Verdadeira falta de educação básica (mas se é eleitor do Boçal, não deve perceber essas sutilezas).

Certeza que foi o climatério, esse bicho-glutão. Não sofri com TPM na juventude para amargar com tensão pré-menopausa na maturidade. Os fogachos haviam desaparecido, porém retornaram. A tal temperatura de suflê no rosto, no peito. Perfeita para florescer as rosáceas, que tem nome bonito só que não são. As bochechas pegam fogo e pipocam em simulacros de espinhas. Ah, a minha antiga pele de pêssego… Partiu sem dizer adeus. 

Fadiga e insônia, dupla deprê, não vou contabilizar.

Rolam também lágrimas, uma sentimentalidade banal por qualquer coisa. Bem redundante de tão besta. Hoje já chorei por causa de uma propaganda do Itaú sobre o poder transformador da leitura. Dias atrás, caí em soluços após um documentário sobre palhaçaria em homenagem à arte circense e ao eterno palhaço Domingos Montagner. O filho ao lado quedou-se preocupado: aconteceu alguma coisa, mamãe? Eu apenas sacolejava e ele, humano que é, deitou a cabeça em meu ombro e esperou, solidário, que a mulher sem razão fornecesse alguma pista para compreender aquele espetáculo dramático. 

Nada, filho. É tão comovente… (enquanto me sentia a própria lona do circo).

E a irritação? Eis um perigo real e imediato. Tenho me posto cabrestos para não sair explodindo aos quatro cantos. Ah, a raiva dessa mulherada que joga as longas crinas de potrancas de um lado para o outro à sua frente, na fila do self-service, até quase derrubar o prato que você equilibra com certa tensão por se saber desastrada. Sem mencionar que qualquer restaurante de autosserviço já me destrói a delicadeza, pelo simples fato de eu ser obrigada a almoçar em um deles todos os dias. 

Senti minha mãe a me possuir e quase ordenei na voz dela o bordão da minha adolescência: Corta essa bandeira!

HaHaHa, mamãe tinha trauma de cabelão. Foi obrigada pelo marido a mantê-lo à altura da cintura durante o matrimônio. Na missa de sétimo dia pela alma de meu pai, estava com a cabeça leve: adotou o corte Joãozinho que lhe acompanhou pelo resto da vida. 

Pense em alguma adolescente que abra mão de ostentar longas madeixas soltas ao vento. Era uma chateação sem fim ter de lidar com as sequelas emocionais da mãe quando estava em frente ao espelho a me peinar triunfante. Haja projeção! Dó de ambas. 

Ri ao pensar nisso tudo aguardando a vez de pesar o rango. Em como vamos nos tornando velhos iguais aos nossos pais. Belchior sacou e fez sua obra-prima. Eu, de cabelos tosados a la dona Maria, com ganas de puxar os cabelos das mulheres brasileiras marias madalenas. 

Ao menos ela, a cabeleira de quem vos escreve, voltou ao normal depois de, também, se estranhar com o climatério. Segue desafiando a queda que acomete o mulherio nessa fase de lei da gravidade implacável, com seus fios tipo macarrão spaghetti número 12 e em quantidade para umas três ou quatro perucas. Nove foras zero.

Ficou a fim de conferir Pagliacci?




Comentários

  1. Adorei! E fico com medo do climatério, canceriana que sou, se a sensibilidade aumentar, o que será de mim? (e dos pobres que convivem comigo?)

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  2. Aquela fila também me irrita frequentemente. Não encosta atrás, caralho! Não dá marcha ré, porra! Vontade de tacar o prato num povo sem noção.
    Digo

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  3. Sobre o climatério, conheço uma receita que leva óleos essenciais que é uma delícia para os cuidados dessa fase (ou fases). Se quiser conhecer, me diga.

    Francisnora

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  4. Oie Luuu, adorei ! E também curti o pedaço que vi de Pagliacci dia desses . Uma frase me pegou . Te conto hoje à noite.

    Clarice Veras

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  5. Precisando de um pouco de cabelos, os meus dão numa cabeça de bebê!
    Lealdade transgeracional no corte de cabelo_ ato revolucionário.

    Thalynni

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  6. Nem o climatério me abala tanto quanto a atual situação política do país.

    Márcya Reis

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  7. Adorei ler, obrigado. Me solidarizo e me conforto com as lamúrias para a senilidade. Adorei as reminiscências também.

    André

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  8. Como eu digo todo dia: estou a ponto de perder a primariedade!!! KKKK!
    Acho que estamos todas num Climério coletivo, Lu.

    Bianca Duqueviz

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  9. Seu texto é leve, gostoso, fluente. Esqueça os minions, não valem a pena. Para falar deles e do seu líder, uso metáforas apenas.

    André Alvez

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  10. Boa, Lulú!
    Bolsominions não merecem ler suas obras-primas!
    Manda pra mim que eu leio!!!

    André Fachin

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  11. Eu, uma ex-juba de leão, fiquei pensando nessa parte do texto...

    Carmem Cecília

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