Borboletas no estômago

Melhor do que o Dia dos Namorados seria celebrar o Dia dos Enamorados. E qual é a diferença? Você vai perguntar. Toda, respondo. O namorado é palpável, concreto. É um produto pronto e acabado, digamos assim. O enamorar-se é uma ação, um fazer, um processo; algo sutil e abstrato. 

Melhor, portanto, ser enamorado/a do que ter namorado/a. Porque ao enamorar-se você pode até mesmo encontrar um namorado/a que valha a pena e se transforme no seu grande amor. Mas ter apenas o namorado/a, sem estar enamorado/a, não vai lhe levar para muito longe da solidão. 

Enamorar-se é uma atitude diária de romance com a vida. É se apaixonar pelas delicadezas que se apresentam na rotina de atribulações que cada um conhece muito bem. É ver graça patética no café derramado na roupa; na chave do carro desaparecida dentro de casa; no atraso corriqueiro que seu filho proporciona por levar anos tomando o Nescau da manhã. 

Sei, é difícil amar tudo isso todo dia. Mas que tal se hipnotizar por aquela árvore que fica na frente do seu prédio, tão linda, anciã e ainda verde? Pela réstia de sol que entra sem se fazer de rogada bem no meio da sala? Ou com o Lulu da Pomerânia que cruza a sua calçada com leveza e peraltice? 

Você não é do tipo que se abala com os espetáculos da natureza e odeia cachorros? OK, tudo bem, porém você pode se enamorar das histórias de superação compartilhadas nas redes sociais. Na grandeza e na fortaleza que existem nos gestos humanitários; na solidariedade de desconhecidos para desconhecidos; na honestidade de pessoas que movem céus e terras por uma boa causa. 

Não, você não é sensível às dores do mundo? Então quem sabe se enamora da sua cidade-natal ou da cidade que escolheu para fincar raízes. Derreta-se pelas opções gastronômicas e culturais que estão à sua espera, a cada nova programação, por que não? Verta lágrimas ao beber aquele cabernet sauvignon ou suspire emotivamente diante de um quadro de Leonardo da Vinci no CCBB. E se de repente você se enamora pelo livro que está lendo ou trava a garganta ao som da orquestra sinfônica de Quixeramobim? 

Não curte Caderno Dois? Então se arrepie no passeio de bicicleta; sinta borboletas no estômago descendo de rapel; paquere aquele horário para malhar como algo sensual, saudável e bonito que você faz para você mesmo. Não? Não faz o estilo esportivo? Então mergulhe no amor platônico das massagens terapêuticas; da meditação. Caminhe pelas alamedas e descubra que tem pulmões para aspirar o perfume do amor. 

Todavia se você for do tipo caramujo, enrosque-se na sua família. Se enamore dos seus filhos, do/a seu esposo/a, de seus pais, tios e primos. Chore de felicidade por tê-los por perto. E deixe esse sentimento bem claro para que eles entendam como são imprescindíveis para você. E brigue um bocadinho com todos também, pois um bom enamorado é passional, vibra e se levanta para demonstrar sua paixão. 

Agora acredito que você já tenha entendido porque enamorar-se é muito mais vantajoso do que ter namorado/a. Enamorando-se você pode ser bígamo e adúltero sem infringir a lei ou sem machucar ninguém. O coração lotado de pessoas, paisagens, situações, surpresas, sustos e desafios.

Ser enamorado é uma postura de aproveitar a estadia no planeta com olhos recém-nascidos. É ter taquicardia e sudorese pelo simples fato de ser um ser humano pronto para o que der e vier, inclusive, namorar.