Achados amarelados
“É preciso continuar escrevendo. Inclusive quando não interessa a ninguém.”
(Ágota Kristóf, escritora suíça-húngara)
Quando as crianças me olharam nos olhos,
era o mesmo momento do vento provocando a inércia das árvores.
O sorriso banguela da menina ao balanço
claro, aberto…
como o céu de um azul azulíssimo!
Abracei, pois, a ideia outonal.
Voei e caí, madura sobre a grama.
Plágio
Você não alimenta as minhas fantasias.
Eu, louca, louca, escrevo.
O que não projeto em palavras, copio
de Adélia,
de Quintana,
de Clarice.
Mas você não me entende.
Não chega com o seu cavalo branco.
Talvez delire demais.
Ou seja mulher, o que torna tudo
diferente.
O que faço com a parafernália de computadores neste corre-engole de fumaça tediosa, de praças imundas e de pessoas sofrendo?
Palavras insípidas não convencem, tampouco tranquilizam.
Umbilical
Olhava para a sua pupila
com insistência.
Queria arrancar algum sentimento meu
que pudesse ela guardar.
Nada encontrei além daqueles olhos grandes e desesperados.
À sóbria distância, sorri em silêncio.
Cordão umbilical enfim cortado.
Atentei para olhares adiante.
Contexto
Aquela moça é muito esquisita.
Precisa-se de uma gramática de páginas estudadas
para compreender seu verbo.
Ação calculada de ir e vir da vida da gente
na hora mais imprecisa.
Às vezes ri, noutras não está.
Parece que ama, mas tudo é imperfeito.
Análise de texto sem jeito.
Não há professor,
conhecedor de línguas
ou de sábias filosofias.
Seu contexto era essencialmente anterior aos alfabetos.
Salvações
Ela sempre deixava os presentes sobre a cama,
minha mãe.
Com medo de ver cara de satisfação,
sem jeito de retribuir.
Passei em frente ao colégio da infância.
Estava no pátio como fotografia antiga,
esperando aquela que segurava minha mão.
As horas passavam,
ela não vinha,
escurecia.
A dor no peito esmagava,
lágrimas represadas.
Não fazia por mal e depois que chegava
eu me punha feliz.
Daí vem a fobia de ficar sozinha em casa,
no pátio,
de ser sozinha.
Estou sempre à espera de alguém
para segurar a minha mão e
acender a luz.
Espera
Um monte de ideias
de plantas.
Folheio Rumi,
espalho envelopes sobre o sofá,
penso na poesia.
Tenho saudades das expectativas
positivas.
Vê se me escreve um cartinha
daquelas gostosas,
falando de Sampa.
Aqui tudo é muito concreto.
Voou, fiquei.
Ainda lhe espero,
vem.
25 de junho
Ando exausta.
Sinto dentro que quero paz.
Alguém que vele pelo meu bocejo, que ache graça na minha preguiça,
que se encante pela minha aparente futilidade.
Quero ser tratada como uma princesa, um biscuit, um bibelô.
Almejo que alguém retire, carinhosamente, os sapatos dos meus pés,
traga chá quente à noite para eu dormir melhor, me dê banho de banheira e
lave as minhas costas.
Não quero que me exijam nada.
Apenas que me puxe pela cabeça e, com fúria, me beije a boca.
Quero que fique perto com uma presença serena, doce e muda.
Sem suplícios e sem cobranças.
Ah, se alguém puder entender meu terno deleite, este manso barato…
Ninguém imagina o que será de mim se alguém me acompanhar nesta viagem.
Verá o meu amanhecer repousada e saciada desta fome.
Erótico
Frente a frente derramamos, enfim, todas as palavras.
Dizemos com olhos no silêncio que não é mudez.
Também não resisto, “dans mon ile”, vendo a barca e as gaivotinhas passarem…
Fiz miséria nos caminhos do conhecer, mas sigo doente de tanta estupidez.
Espero ardentemente que algo divino aconteça.
Os horóscopos também erram.
Escreva-me mais, manda um postal azul,
que não me espanto.
O meu embaraço te deseja, quem não vê?
Uauu!!! que seleção de poesias 🌸🍁senti profundamente 💞
ResponderExcluirCynthia
Ameeeeeiiii 🌷 Muito atuais ❤️❤️
ResponderExcluirKarla Liparizzi
Uau! Que privilégio poder ler isso! Amei! 🥰
ResponderExcluirQue previlégio poder sua irmã e tia pra ler esses textos com tanta perfeição em cada palavras sua Lúciana de assunção 🥰Só orgulho👌👏👏👏bj nesse coraçãozinho 🩷
ResponderExcluirEu amei seus encontrados!
ResponderExcluirBianca
Muito bonito seu texto
ResponderExcluirQue lindo é encontrar arquivos vivos ❣️
Raiza Figueiredo