Horinhas de descuido
No pó da obra
o visitante noturno deixou sua marca
confuso com os obstáculos,
cruzou a treliça de arame
meia volta, parou, olhou
saltou, seguiu o saruê.
(se não for um saruê, será o quê?)
Suas patinhas na poeira de
paredes ao chão confirmam:
há vida nas ruínas.
Lembra um passado não tão longe
de pegadas do coelho de Páscoa
fabricadas na farinha
trilha de trigo
rumo aos ovos de chocolate.
A alegria das mãozinhas dos pequenos…
Naquele tempo não atinavam:
coelhos são mamíferos.
Sextou tão brilhante, um dia de verão límpido, dissipado de incertezas.
O caminhão do lixo seguia à frente. Depois da varredura pela minha rua, entrou no estacionamento do bloco A. Aguardava para dobrar à esquerda quando reparei num movimento anômalo com o canto de olho: um dos lixeiros saltitava veementemente no meio do asfalto. Não costumo sair nesse horário. Geralmente eu pego o caminhão da limpeza urbana entrando na minha rua.
Olhei rapidamente para cima e deduzi que o funcionário estivesse vibrando pela bandeira do Brasil que persiste na janela de algum morador (desconhecido, ufa!) do quarto andar.
Átimos de segundo de desgosto. Essa galera deveria virar lixo da História, mas permanece aí, firme em seus propósitos fascistas.
Outros lixeiros seguiram a performance e já era todo o grupo a pular e gritar palavras que não conseguia distinguir de onde estava.
Resolvi parar o carro mais perto para entender aquela cena amalucada e eis que eram crianças a saudar os lixeiros lá de cima, com suas carinhas ávidas prensadas na tela de proteção. Os lixeiros, claro, retribuíram na mesma medida de afetividade e de atenção.
Nada havia me preparado para tamanha bofetada de alegria autêntica e singela.
As sextas são maravilhindas!
Pode ser de gatinhos Lulu ,muito lindo a forma que vc escreveu ai relatando as patinha marcadas no poeira na sua residencia..........bjs
ResponderExcluirDois textos e duas fotos incríveis👏👏👏vc é incrível!!! adorei a expressão “bofetada de alegria autêntica e singela”😃
ResponderExcluirCynthia🙏🥰