Minhas férias

Que me perdoe a Conceição de Freitas e todos que amam Brasília ardorosamente, mas o que fazer nestes dias de férias nesta cidade-fantasma sem pensar em algumas formas de suicídio? Eu que sou brasiliense tenho vontade de dar uma de francoatiradora no shopping só para experimentar um pouquinho de emoção.

Caramba, mas que lugar tedioso é a capital. E com esta chuva que parece não dar trégua – e eu gosto de chuva – acho que o governo local precisa pensar na criação de campanhas “acredite na vida” como as que eu via lá em Nova Iorque na época desesperadora do inverno. Tenha dó, have mercy my God, mas só em Brasília alguém poderia ter escrito um verso como “Tédio com um T bem grande pra você!”

Entendo perfeitamente a melancolia profunda do Renato, o meu ex-vizinho, o Russo. Pois é, hoje moro no bloco em que ele viveu e compôs uma boa parte de suas letras mais raivosas. Estamos encerrados pelas mesmas paredes do “saco cheio” que é Brasília em janeiro. Tá bom, não quero incentivar a mortandade dos peixes e mamíferos, então eu vou dar umas dicas de como sair do banzo sem tantos efeitos colaterais, além de um pequeno rombo no seu orçamento já combalido pelas compras de Natal.

Primeiro, você acorda e tenta ensinar um pouco de yoga para os seus filhos de cinco anos e meio e dois anos e meio, respectivamente. Vamos lá, postura do pássaro Garuda, postura do guerreiro, da tartaruga, da árvore, do sapinho, saudação ao sol, pra ver se ele vem de uma vez por todas, saudação à lua... Tudo ao som de Krishna Das, o número 1 das paradas OMMM.

Aí você sai para comprar frutas no Verdurão Oba porque a sua geladeira está vazia e, afinal, chega de comer os restos da ceia de Réveillon. Lá, não encontre muita coisa, mas mesmo assim gaste perto de 135 reais. Mais brasiliense, impossível. Volta pra casa e tenta arrumar alguma outra forma de ocupar o cérebro que ainda insiste em adquirir uma arma e sair por aí cometendo insanidades. Yeah, tem um livro para trocar na Cultura!! A desculpa ideal para sair outra vez de casa e consumir mais um pouquinho!!!

Vocês sabem o que um físico mais ganha no Natal? Livros sobre Einstein. E sabem quanto livros sobre Einstein existem? Cerca de dois milhões. Já viraram o cara do avesso e reviraram e viraram de novo e ainda encontram algum novo enfoque sobre a sua personalidade, suas fórmulas, sua loucura... Pois é, decretei que não cabe mais nenhuma obra sobre o cientista da língua-de-fora-mais-famosa-do-mundo nas minhas estantes. Enough! Fui trocar o tal título.

Duas horas depois de ouvir metade do acervo de CDs, sentar no chão e fazer leitura dinâmica de uns 15 livros, vaguear apaixonada pela Livraria Cultura quase vazia e sempre aconchegante, meus neurônios embrutecidos e entediados ao extremo tinham se esquecido, graças a Deus, que eu estava em Brasília no dia dois de janeiro de 2010. Naquelas horas mágicas eu me teletransportei para uma cidade de verdade, com gente nas ruas, praia, sol, ou mesmo galerias de arte e museus aos borbotões para passar o tempo. “Happiness is a warm gun” já não estava mais nos meus planos.

Saí da Cultura 150 reais mais pobre no banco e rica de possibilidades com livros sobre Sartre e Beauvoir, O “Seminário dos Ratos”, da Lygia, a “Felicidade Clandestina” da Clarice, um CD da Lady Gaga (o que a gente não faz em momentos de puro desespero), Hai Kais do Quintana para dar de presente para a melhor amiga e quase totalmente curada da depressão devido ao doce barulhinho das sacolinhas de plástico.

Para terminar um excelente dia de consumismo bem Brasília, encha o tanque do carro, que dá uma bagatela de 118 reais, ligue para sua tia querida que quase sempre está disponível para programas supérfluos, convide-a para dar uma passadinha nas Lojas Americanas, onde pretende comprar um kit de areia novo para o seu filhote que está na fase dos castelinhos e aproveite a promoção de panetones Bauducco por R$ 5,00.

Dê a punhalada final na sua conta bancária com um almoço no Marvin, lugarzinho infame de sanduíches caríssimos e vergonhosamente engordativos e não se esqueça do seu lado brega: leve as batatinhas que sobraram para o filho mais velho, que adora batatas-fritas. Por fim, regue todo o passeio com a Lady Gaga que você comprou e descobriu que amou rolando no último volume no toca-CD do carro e pronto: extermínio de semelhantes, só amanhã.

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