Na Berlim Tropical




A coisa que eu mais gosto no Rio de Janeiro talvez seja a coisa que você mais gosta também. Vamos lá: para onde a gente olha, avista logo um pedrão gigante brotando do centro da Terra. Parece geração espontânea e continua de paredões pipocando entre prédios, no meio do mar, de uma rua a outra, da janela lateral do quarto de dormir... 

É poético e visceral ao mesmo tempo. Dureza e malemolência numa única rocha. Doce sabor do Pão de Açúcar em nossos olhos e papilas. Água na boca! 

Mas o Rio é de fato divino e maravilhoso. Sinônimo do Rio é sempre. Como o seu nome de batismo sugere, flui indomável pela história, forçando suas margens em reinvenção constante. Dessa vez, eu que venho à cidade desde criança, quis me perder pelas andanças a esmo. Nada de turismo óbvio. Só caminhar e sentir o vento morno do mar. 

Acredito que o oceano transforma a minha natureza. Os olhares masculinos não são indiferentes quando me ponho em marcha pelas calçadas. Ou os cariocas são mais atrevidos ou a vadiagem me torna mais sexy. Decidi fazer um experimento de quem não vive sem escrever: com caderno em punho, captar os diálogos que cruzassem o meu caminho. 

Senti-me uma legítima anja sobre a Berlim tropical. Se você não viu “Asas do Desejo” (de Wim Wenders) e provavelmente meu filme predileto, talvez não entenda a referência. Fica a sugestão. Prossegui anotando as conversas que passavam por mim. Quantas delas virariam interessantes passagens de um romance bem escrito... Porém, já seria outro exercício. Esse primeiro consistia, apenas, em fisgar, pelas palavras entoadas, a atmosfera de uma capital fervente. 

Portanto, convido você a materializar que personagem teria dito algo assim: 

“Eu, como sou fumante, pra não fumar na casa da mulher, eu comprava bala Halls”. 

“Escuta, eu tô saindo do hospital agora. A dona Leda ligou dizendo para ter cuidado porque em Nova Iguaçu vai ter passeata começando a 1 hora da tarde.” 

“Olha, pai, olha, pai! Aqui tá raso!” 

“- Ai, desculpa! - Não tem problema, não. Eles é que ficaram lá pra trás.” 

“Agora ela está pegando mulher...” 

“Você é igual a mim: improdutivo e não pensa no próximo.” 

“- Bebel vem hoje... - Que horas? - O voo dela...” 

“E ela tá toda apaixonada por um rapaz...” 

“Comprei 50 pães, 50 salsichas e não gastei 100 reais!” 

“Eu acho que as coisas boas em você, que estavam meio apagadas, vão voltar.” 

“Alô, mate geladooooo! Biscoito Globoooo! Água geladaaaa!” 

“Ele só faz essas coisas quando é época de reunião. Só pra mostrar pros outros que ele faz alguma coisa.” 

“Não, não, não! Não pega! Tá sujo!” 

“Capricha aí, abusadão!” 

“- Já está um ventinho mais fresco... - Mais tarde vai chover.” 


Não choveu, mas minha imaginação se encharcou de diversão. 



Comentários

  1. Tem certeza que o que você ouviu não foi "Biscoito Grobo"?

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  2. Ah que saudade me deu da minha terrinha do coração...deixa eu advinhar...esses diálogos você captou enquanto estava pegando aquele solzinho, aquela marisia,e com a presença do observador interno que é plugado na percepção interna da intuitiva escritora que és,e que resultou neste texto, certo?Quanto aos personagens de cada frase, visualizei todos e as situações...sempre bom Lu,ler você!
    Namastê!
    Cynthia

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  3. Coincidência, fiz uma viagem bate-volta ao Rio no dia 20 agora... A atmosfera da cidade é uma delícia, só de ter visto o mar e o Cristo naquele dia já fui dormi mais feliz =]]]

    bjs =]]]

    Fabiana

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  4. Boa estadia no Rio, hein Lulupisces? O blog esta bonito.

    Bjs,

    Lourdes.

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