A picada nossa de cada década

É tudo mentira. Você aí, criança, não acredite nessa história da carochinha que lhe contam toda vez que você vai tomar injeção: “é só mais uma, agora acabou!” Acaba nada! A gente pensa, com alívio, que aos cinco anos de idade estará livre dessa praga e, desolada, descobre que foi enganada. Esqueça: durante quase toda a sua vida, que será longa graças aos avanços da medicina, estenderás o braço para a estocada de cada década.

Alguém pode me dizer por que gastam rios de dinheiro clonando a Dolly, criando novas bactérias em laboratório, inventando Viagra e brigando na Justiça pela patente dele, e ninguém pensa em tirar da cartola uma maneira menos horripilante de imunizar as pessoas? Bendito, Zé Gotinha!!! O paraíso sonhado pelas crianças e marmanjos traumatizados é um lugar sem agulha!

Nessa semana estava lá de novo, uma mulher sem esperança de um dia não ser mais violada pelo profissional de jaleco branco. Uma hora e meia na fila para tomar a vacina contra a tenebrosa H1N1. Tentei brincar um pouquinho, quebrar o gelo, mas tudo o que o extenuado e entediado torturador de cidadãos fez foi me dar um pito:

-Você vai OU NÃO tomar essa vacina?

OK, lancei o lado esquerdo para o meliante que reagiu com seu ataque incisivo. Um furo certeiro, a vítima imobilizada. Que invasão de privacidade!! Ultraje ter a minha pele deflorada em nome da imunização. Isso porque eu fui ingênua e acreditei que só na infância a gente poderia ser obrigada a baixar as calças, levar cutucadas nas coxas e ficar com o braço duro e roxo.

Qual o quê!! É vacina de gripe; de hepatite X,Y,Z; de tétano(ai, que doída!); de pneumonia, rubéola e agora mais essa. O que vão inocular em seguida, hein? E olha que ainda fujo da perversa agulhada que promete me livrar da febre amarela. Essa eu só tomo quando for para a Amazônia. Chega!

Cada um que vinha lá de dentro fazia cara de boi indo para o matadouro. Dava vontade de desistir. Em pé, uma fila modorrenta se arrastando feito lesma, e o povo saindo cabisbaixo, com algodãozinho apertado no braço e semblante de morte certa. Não me espanta que a meta do governo de vacinar a população entre 30 e 39 anos tenha fica abaixo da média. Quem pode obrigar homem barbado e mulher peituda a enfrentar uma furada dessas?

- Essa é a fila para tomar a vacina?

- Ahammmmmmmmmmmmm...

- Prefiro morrer!

Eu não. Por isso estarei lá, em todas as filas para todas as vacinas que ainda irei tomar. Porém, deixo aqui o meu manifesto: Sabin, ele sim, é o meu herói!


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