Tocata e Fuga*
Toda dia de curso eu passo por ela, que se esconde no canto atrás da pilastra do suntuoso edifício. Não sei precisar o rosto ou a idade, concentro-me na cotidianidade da imagem. Toda vez a fumaça; o dedo a boca, que franze para sorver o vício: tragar mais de quatro mil produtos tóxicos que causam dependência emocional e física, quiçá câncer e enfisema pulmonar. Passo por ela no frescor, leveza e perfume da manhã que recomeça. O céu é límpido, claro e puro até o momento no qual me aproximo daquela nuvem branca acinzentada. Chaminé nublando o horizonte. Ela é solitária nesse hábito. Sempre pensativa e recostada na pilastra a baforar suas reflexões ao ar livre. Livre é uma palavra estranha nesse contexto... Não sei se ela me nota, pois são muitos os transeuntes. Não sei se lanço para ela um ar de reprovação. Não se ela sente o possível incômodo que me causa. Mas, porque será que eu a julgo, deus do céu? Porque concluo: ela é fraca, entregue ...