Uma década para sempre

Há 10 anos eu não tinha filhos. Há dez anos eu tinha mãe, madrinha e festas de família grandes e animadas. Há dez anos eu não tinha apartamento de quatro quartos. Há dez anos eu não tomava remédio para dormir, pois há 10 anos eu não tinha insônia. Há dez anos meu primo Júnior não havia se tornado um dos meus melhores amigos.

Há dez anos eu não fazia ioga regularmente. Há dez anos eu morei em Nova Iorque e nem nos sonhos mais lindos eu imaginei que isso iria acontecer. Há dez anos eu vi - de muito perto - o mundo se transformar por causa de um atentado. Hoje, essa década toda repassou na minha cabeça num átimo por causa da morte de Osama Bin Laden.

Tô parecendo uma letra do Arnaldo Antunes (que está rolando no meu CD do carro): listando devaneios em nãos e sins. Mas que fim de semana intenso foi esse, hein! Eventos impactantes para o entendimento do planetinha acontecendo desde sexta-feira... Casamento real, nos levando a acreditar em contos de fada novamente. A beatificação de João Paulo II (ele passou a mão nos meus cabelos infantis. Já tenho passe garantido para o céu?). O aniversário de sete anos (cabalístico) do meu filho primogênito e o assassinato, enfim, do Bin Laden.

As bruxas estavam de fato soltas (ou presas, para quem tem algo contra elas). Não apenas na festinha assombrada do Tomás, mas por aí, pregando suas peças em acontecimentos próximos e mobilizadores da fé do homem não só nos santos, mas também na humanidade. Um fim de semana para entrar para a História. Do Obama e da minha, posso garantir.

Achei simpático o Obama dar essa notícia e eu ainda entender um discurso em inglês. Eu gosto do Obama pelo o que ele representa de idealismo. Para um povo reacionário como o norte-americano, ter um presidente negro, novo, elegante, bem articulado, com esposa idem, é um tapa na cara diário.

Mas o pobre estava precisado de algo que elevasse o ibope pessoal diante da massa majoritariamente branca representada por cabeças obtusas como Donald Trump e cia. Por isso, fiquei feliz em saber que Osama foi morto no governo de Obama (qualquer semelhança não deve ser simples coincidência).

Não que mude algo no panorama extremista carniceiro mundial. A gente sabe que se mata um, outros cem já estão na fila, de olho no posto de chefe da intolerância. Mas acredito que, agora, Obama está mais próximo de ser reeleito. O que é bom para todo o planeta porque Barack é antenado com o novo e não busca caminhos fáceis e chavões. Sei lá, eu gosto dele, sem me aprofundar em mais delongas acerca da política internacional.

Mas relembrar o atentado também foi inevitável. Os especialistas falam em estresse pós-traumático e talvez tenha sido isso mesmo: estar lá, viver tudo aquilo na intensidade irreal daquelas cenas. Compartilhar da depressão dos ianques, acreditar que o mundo iria se acabar... Eu não gosto de rever aquelas imagens. Não vi nenhum filme sobre o 11 de setembro que foi feito desde então. O que eu senti in loco já me fartou de tudo. Não gostei de ser forçada a virar personagem da Terra pós-devastação.

Não se acabou, a bola feita de continentes e oceanos, ufa! Mas mudou. Perdemos um pouco da inocência da guerra fria, aquela que nunca se tornou quente. Era bem mais onírica aquela vida polarizada, tolinha, ingênua, acreditando em Che Guevara e batizando o fusca do avô da melhor amiga com o mesmo nome. Hoje tudo ficou muito adulto, profissional. Sexo explícito.

Os insanos estão em qualquer parte e podem simplesmente matar doze crianças em Realengo ou 20 desavisados num café em Marrakesh. E aí a gente fica até meio nóia em visitar as pirâmides porque, sabe se lá, azar de brasileiro, algum turbante barbudo resolva explodir você sem modéstia. Logo você,  turistinha boboca, terceiro-mundista, uma "vicetreco do subtroço"...

Esse 2011 promete... Depois de 10 anos eu vou voltar lá. Vou rever a Big Apple nesse ano histórico! Vou chorar ao andar pelos meus trajetos de caminhada preferidos, recordando como foi duro e doce ser jeca em Nova Iorque. Abraçar de novo as amigas que estão por lá e ainda são minhas amigas porque, ainda bem, alguém inventou essa tal internet que, há 10 anos, apenas começava a revolucionar.



Comentários

  1. Luzinha, desta vez vc se superou! Esse texto sobre a morte do Osama e as impressões de tudo está maravilhoso!
    Saudades de vc e dessa sua verve incrível, amiga!

    Super beijos,

    Hylda.

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  2. Legal!

    Mas já que estamos falando dos fatos históricos deste final de semana, você não poderia deixar de mencionar que o MENGÃO é novamente campeão carioca! E cá para nós...

    Ser campeão é bom!
    Ser campeão invicto é muito bom!
    Agora, ser campeão invicto em cima do vasco....

    PALMAS PARA O FREGUÊS

    É VICE DE NOVO!!!!

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  3. Fui citado.
    Ter descoberto você é um motivo para sorrir pelos próximos 10 anos.

    Valdeir Jr.

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  4. Este comentário foi removido pelo autor.

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  5. parabens pela matéria, como é bom ver gente idealista!!!
    bjo
    Henrique

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  6. Fantástico esse seu texto. Lucidez,maturidade, emoção,visão política,experiência, sabedoria.Se seguir assim, terei que buscar um Dra Honoris Causa para minha escritora brasiliense. Bjus e muita saudade. Davide.

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  7. Há praticamente dez anos o mundo não esperava que as chamadas minorias atingissem a escala máxima ao poder: negros, mulheres e operários. A gora não tem volta; estamos, enfim, acordando. A força da evolução e da revolução dos tempos supera aquela provinda dos eternos interesses mesquinhos e materiais de alguns "poderosos". "As casas e os castelos estão caindo" afinal!

    Beijos

    Patty

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  8. Oi comentadores,

    é, são 10 anos de profundas mudanças na sociedade global. E o Brasil vem se transformando para melhor, mas numa velocidade bicho-preguiça. Infelizmente não vou ver o meu país evoluído nessa vida. Vou ter reencarnar centas vezes para aplacar esse desejo de assistir uma nação verde-amarela de verdade.

    Abreijos e obrigadíssima pela participação de vocês! Levei um susto ontem: foram mais de 105 visualizações de página!! Meu primeiro recorde!!!:) Já pensou se pelo menos metade da galera tivesse comentado? Urrú!!!

    Lulupisces.

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  9. Luciana,

    é sempre bom ler seus textos. Confesso que nem sempre tenho tempo, mas quando tenho, me deleito, me indentifico com suas ideias, (me) evoluo.

    Gostaria de trocar algumas figurinhas com relação as tendências musicais. Estou renovando a minha seleção músical e adoraria saber quais são suas indicações.

    Posso te dizer algumas descobertas também. Ouvi a cantora Mayra Andrade, de Cabo Verde, uma vez na Radio Nacional e fiquei encantada. Ouve essa música e me diga se não é viciante- http://www.youtube.com/watch?v=SAIfxdPwRQM.

    Bom, boa sorte com a construção( vc e seu casamento sobreviverão, acredite!) e continue escrevendo!

    E quando der, apareça no Encontro das Mulheres! O próximo vai ser mais barato, prometo!

    Abraço,

    Marina

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  10. Oi Lu,

    Parabéns pelo texto, bom demais.
    bjo
    Gelza

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