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Mostrando postagens de fevereiro, 2012

Fetiches da sala escura

O Universal Channel lançou um desafio interativo: quer que o telespectador envie para o programa “What’s on” (relação direta com o “O que é que é há, velhinho?) suas cenas inesquecíveis do cinema. Nossa, esse tipo de apelo é infalível. Todo mundo adora um recordar é viver. Tem gente que é tão nostálgico que só vive de dizer “no meu tempo...” E há aquele grupo, no qual o meu marido Oscar (em homenagem ao tema) pertence, que sofre de angústia do futuro, ou seja, já fica padecendo pelo dia em que os filhos crescerão e deixarão o ninho paterno. Lá em casa os papéis (ainda em homenagem ao tema) estão um pouquinho invertidos, sabe? Mas cena de cinema inesquecível dá em pencas para mim. Não sou capaz de numerá-las ou de escolhê-las sem cometer injustas falhas de memória. Porque existem os quadros e existem as frases “unforgetable” (uma palavrinha em inglês que eu acho muito sonora, tipo bubble - bolhas - e coisinhas que flutuam no ar espiralando nossos sonhos). Nem sempre eles vêm juntos

Os fantasmas de Scrooge de cada um de nós

Os fantasmas da infância nos assombram ao longo da vida. Basta a gente baixar um pouco a guardar e lá estão eles a nos incomodar. Bem que a terapeuta disse que pai e mãe nunca morrem. O corpo se vai, mas seus espectros rodeiam a gente para o bem e para o mal. Por isso é melhor que você resolva perrengues, diferenças, incomunicabilidades várias com eles enquanto eles podem dialogar com você. Depois, só restam mesmo as imagens que teimam em repovoar a mente em momentos de fragilidade. Passei o domingo pensando nisso depois de consolar uma velha amiga. Realizada como profissional e mãe, ainda é assombrada pela menina órfã que foi, “num mundo de migalhas”, como definiu. A criança da gente compreende a família de um modo tão particular. Nem sempre certo, nem sempre verdadeiro, mas real para a cabecinha infantil. E assim a gente cresce, com essas percepções fantasmagóricas angustiantes. Bem sei desse sentimento de inadequação. Costumava definir minha posição no seio familiar como a de

Multitemática e internética*

Então a minha alma entrou no 41º ano de vida neste plano (inclinado muitas das vezes). Cá estou eu, apta a subir e descer as ladeiras da existência. Os anos ainda não pesam na “cacunda”, mas algo me diz - principalmente os 23 exames que a médica pediu - que estou mesmo na idade da razão. Metade daquela lista eu nunca vi. Siglazinhas e bilirrubinas mil. Não é fofo? Bilirrubinas Total e Frações, Feritina, TGP (não confunda com GVT). Agora sou - de fato- uma jovem senhora que precisa se cuidar. Acabou o prazo para brincar de viver. Ou a gente vive ou se perde. A partir de hoje meu nome é pronto. E agradeço a prima Jôsy por essa revelação. Se bem que nunca fui de adiar nada mesmo. E nem de me fazer de rogada. Na lista de arrependimentos terríveis, só o curso de Antropologia abandonado. No mais, pecadilhos e orgulhozinhos que já se desvaneceram. Porque eu posso ser irada, mas não sou rancorosa. Bênção. Nesse ano, comemorei o aniversário duas vezes. Não tive medo de parecer gulosa aos

O Deus da Luciana

“Para de ficar rezando e batendo o peito! O que eu quero que faças é que saias pelo mundo e desfrutes de tua vida. Eu quero que gozes, cantes, te divirtas e que desfrutes de tudo o que Eu fiz para ti. Para de ir a esses templos lúgubres, obscuros e frios que tu mesmo construíste e que acreditas ser a minha casa. Minha casa está nas montanhas, nos bosques, nos rios, nos lagos, nas praias. Aí é onde Eu vivo e aí expresso meu amor por ti. Para de me culpar da tua vida miserável: Eu nunca te disse que há algo mau em ti ou que eras um pecador, ou que tua sexualidade fosse algo mau. O sexo é um presente que Eu te dei e com o qual podes expressar teu amor, teu êxtase, tua alegria. Assim, não me culpes por tudo o que te fizeram crer. Para de ficar lendo supostas escrituras sagradas que nada têm a ver comigo. Se não podes me ler num amanhecer, numa paisagem, no olhar de teus amigos, nos olhos de teu filhinho... Não me encontrarás em nenhum livro! Confia em mim e deixa de me pedir. Tu vai

Conquista ou prisão?

Quer saber? Ficava de boa nessa vida de dona-de-casa, gerenciando o lar: o que fazer para o almoço, as frutas que estão faltando, buscar a pé os meninos na escola... Acordar , tomar café como gente, sem pressa. Correr pelas calçadas arborizadas da Asa Sul, uma ducha, sentar na frente da tela e escrever contos, histórias, crônicas, frases. Vinte dias de licença e eu não pensei nem um momento sequer na minha realização profissional. No que eu estaria perdendo em não ir diariamente para o trabalho. Não senti falta de ser jornalista ou publicitária porque, afinal, eu gosto mesmo é de escrever e, para tanto, não preciso de rótulos. Estou lendo um livro sobre a psiquiatra Nise da Silveira. Bacana. A mulher era, perdão do trocadilho, muito doida! Uma feminista naqueles tempos duros. Rabugenta e ditatorial um cadiquinho assim. E tinha profunda aversão à burocracia da máquina estatal, contra a qual lutou incansavelmente e, ainda bem, conseguiu colher frutos notáveis com a introdução da revo

UPP para o transporte público no Brasil

Toda vez que eu pego ônibus aqui em Brasília é para me aborrecer. Não sei que pecado os pobres de salário cometeram para serem tratados dessa maneira selvagem diariamente. O transporte público na cidade é uma aberração antiga. A capital do país é o exemplo dos motoristas mal treinados, dos veículos maltrapilhos, da incivilidade que envergonha e nos mostra, claramente, que ainda estamos muito longe de ser uma comunidade de primeiro mundo, como alguns ficam a propagar por aí.  De vez em quando vou de ônibus (táxi também é absurdo na capital da opulência de preços e tarifas). Ontem voltava do dentista. Minha irmã me deu uma carona de ida e decidi pegar o ônibus na volta. Não tenho nenhum problema em andar de ônibus ou metrô. Aliás, é aliviador e são trocar a direção alucinada do carro nas grandes cidades, pelo descompromisso com vaga e atenção com a pista que o transporte público oferece. Ou pelo menos deveria oferecer. As cidades bem planejadas, urbanizadas e sadias do mundo lhe dão e

Bão bsurdo!

Percebo que uma das características do facebook é exacerbar o sentimento de pertencer. Pertencer a uma tribo específica: tem gente no face que faz questão. E lá também está presente o pertencimento relativo à terra natal, às origens. Afirmar com orgulho, mesmo que seja por meio de piadas ou gozações: Eu sou daqui, desse lugar: Brasília, Goiás, Rio, Manaus... "Sou do mundo, sou Minas Gerais", já cantava Milton Nascimento antes de prever que o face faria exatamente isso: reposicionar a pessoa perante si mesma e perante a comunidade mundial conectada. Mas estou parecendo uma professora de semiótica, meu Deus! É que ontem assisti a uma palestra sobre games e educação e já fico toda assanhadinha com teorias e dissertações. Preciso voltar urgentemente para o banco da escola. Estou com saudades de pensar. Academicamente, tá?  Para completar o meu enlevo, recebo da Ana Cristina, amiga de Curitiba, um textinho sobre o prazer de ir para o colégio. Identifiquei-me imediatamente com a

Segredismo

para a mana Nena que, generosa como sempre, ofertou-me  seu  Segredo. Cavalguei um segredo no domingo. Olhando para ele não parecia tão misterioso ou indecifrável. Por isso não tive medo. Subi num impulso só, me acomodei em seu lombo e pronto. Estava domado. Puxei a rédea de sua liberdade com determinação. Não se pode deixar segredo correr sem direção. Segredo é segredo e sempre pede constrição, comedimento. Se assim não fosse, era caso de livro aberto e não algo que se esconde. O sol estava majestoso lá em cima. Derramava amarelo que verdejava profundamente a pastagem e a plantação de eucaliptos. Queria me afastar o mais longe possível de qualquer sinal de humanidade para compartilhar aquele segredo só comigo. Um segredo de mim para mim. Corri. Galopei. Em poucos segundos, o chapéu voou. Não teve coragem de viver aquela intimidade. Vermelho esquecido no marrom da estrada. Segui partilhando meu segredo morro acima. A subida num fôlego só, profundo, bufante. Aos poucos e

O titereiro Carnaval

Reza a lenda que eu nasci num sábado de Carnaval. Meu pai deixou minha mãe parindo no hospital e foi pular com os meus outros cinco irmãos + minha tia Leila na matinê do Minas Brasília Tênis Clube. Não sei quanto disso é fato ou ficção, mas eu posso imaginar a verdade nessa história. Sei que meu pai gostava de música e manifestações culturais diversas. Por isso, tenho certeza que ele me ofertou, do nosso breve encontro nessa existência, o amor pela dança e pela música. Adoro carnaval mesmo quando acho que estou cansada demais para aguentar a folia. Quando digo que "nesse feriado eu vou para o mato, não quero nem saber dessa confusão", a afirmação é da boca para fora. Pois acabo dando um jeito de espiar os desfiles das Escolas de Samba. Pelo menos isso. É interessante perceber que as células carnavalescas ficam dormentes durante um ano. Atravessam a corrente sanguínea sem manifestar sinal de vida. Mas basta uma fagulha de incitamento para que todas elas fervilhem e corram

Recuerdos Minas-Bahia

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A Capela de São José em Cordisburgo/MG  Descobri que as melhores viagens são aquela sem expectativa alguma. Não esperava nada das minhas férias. Depois de um dezembro alucinado, com o tanque do meu gás na reserva, não tinha energia nem para fazer as malas, quanto mais para pensar no que me esperava para as próximas duas semanas. O tal episódio do dedo esmagado, não na porta, mas na dobradiça, como esclareceu Bernardo, sempre exasperado com as minhas imprecisões técnicas, fez quebrar não apenas o osso no efeito alavanca que multiplicou em 40 vezes a força produzida pelo nosso amigo fechando o carro (nessas horas é útil ter marido físico: eles fornecem a real dimensão do nosso trauma). Quebrou minhas ilusões de fim de ano. Porém aprendi que realmente há males que vêm para o bem: essa viagem de janeiro foi uma das mais gratificantes que eu já fiz. Portal Grande Sertão: "O sertão é do tamanho do mundo. O sertão é dentro da gente" (Guimarães Rosa) A primeira