Autógrafo às seis e meia

Deixa eu lhe dar um beijo, conhecer sua letra.
Quando toquei em suas mãos, experimentei a fortaleza.
Ainda bem que pude confessar: sua poesia me comove!
E não tive medo de ser óbvia e de chorar.
(De mim para Adélia Prado em priscas eras)

Mágicas e insondáveis são as conexões telúricas da vida. A frase saiu assim, sinto muito. Não estou chapada nem nada. Essas ondas nunca fizeram a minha cabeça, mas acho que bons poemas são capazes de me deixar em transe, viajandona. E nesses dias passados estou mais Adélia Prado do que nunca, pensando nela muito e muito desde quarta-feira.

O marco das tais conexões telúricas, que são aquelas raias espectrais que a gente pode observar nos astros de algum ponto daqui da Terra, foi esse dia, o dia 27 de outubro. Data em que uma conspiração do tal destino me colocou, depois de muito tempo, em rota de esbarrão com a Adélia. Acho que vi milhões de halos como entorpecida por LSD. Tudo começou “demanhãzinha”, quando me lembrei de um poema dela:

"Minha mãe cozinhava exatamente: arroz, feijão roxinho e molho de batatinhas. Mas cantava..."

Eu tagarelava para a minha colega de trabalho que, se meu filho lembrasse de mim assim, já ficaria totalmente satisfeita. Não cozinhando, porque meus rebentos não vão ter o prazer de me ver na cozinha, um território inimigo, por assim dizer. Mas cantando, cantando sempre.

Não é que se passa uma horinha e essa mesma colega de trabalho me traz uma reportagem de capa de caderno 2 com quem? Ela, Adélia Prado, a fênix em foto gigante, que sai da hibernação de uma década para lançar seu mais novo livro de poemas: “A duração do dia”. Olha aí a conexão telúrica, gente!

Daí, fui desnovelando histórias e cheguei até o ponto que estava dormido em mim: eu já estive com Adélia Prado. Cara a cara, choro a choro. A poetisa de Divinópolis, mineira em gestos, universal em sentimento, conversou com os alunos do “segundo grau” do Colégio Objetivo (nem existe mais lá na 913 sul). Eu já não era mais aluna, estava na UnB, mas meu marido era professor da escola e deu um jeitinho para a fã entrar.

Chorando fontes luminosas pedi o autógrafo de Adélia na minha antologia dela ou na antologia dela minha (êta língua complexa). Ela escreveu: “Luciana, não chores! Beijos”. Uma caligrafia voadora, que parece estar sempre com as malas prontas, gravada no meu livro. Laço eterno de amor.

Mas como não se desmanchar na frente dessa gigante tão singela e vívida? Já sei que choro é o que ela mais provoca por aí. Na Flip, em 2006, foi um aguaceiro daqueles. Ela mesma não resistiu à declamação dos próprios poemas e derrubou lágrimas ardentes.

E tem mais interferências telepáticas. Nessa mesma quarta-feira, 27, vou para o primeiro dia do curso de meditação e “ni quem” eu bato o olho na plateia? (sem exagero, era uma plateia. Nunca vi a nave do templo budista tão apinhada) Na amiga – que não é mais amiga – que me deu a antologia de poemas da Adélia Prado. Ela entrou e saiu sem me notar, mas eu segui pensando: o que é que essas coincidências mineirinhas estão querendo me dizer...O que é, o que é?

Enigma que não possa ser resolvido com uma boa leitura de Adélia e de Drummond que, aliás, foi quem descortinou a conterrânea para o grande público. Então, o que ocê tá esperando aí sentado com essa cara de bocó? A miserabilidade da vida impõe medidas drásticas: saia já correndo desse computador, fuja para debaixo de uma árvore e viaje na poesia. Conexões telúricas estão aí para acontecer com qualquer um quando menos nos fechamos.

Comentários

  1. Finalzinho dos anos 80, início dos 90, acredito eu, você enviou docemente para mim uma fitinha cassete com várias canções de intérpretes mulheres: Marisa Monte, Zélia Duncan... fez uma capinha para a fita, com a foto da Adélia Prado e um versinho dela... guardei o presente com muito carinho. Só alguém inspirada por tão bonitas almas femininas para ter tamanha delicadeza. Essa é a minha pequena contribuição para as suas conexões telúricas... Beijos!

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  2. Oi Pattygirl,

    caramba, eu espalhei Adélia Prado para todo lado!!!:) Aliás, para o lado das amigas, que fique bem claro.

    Caramba, Patty, não me lembrava dessa. Que legal! Eu realmente amo Adélia Prado. Sabe que descobri que a Dedéia me deu um poema dela no meu casamento? E me lembrei que a Dedéia "me obrigou" a ler uma poema da Adélia no casamento dela?

    Demais essas conexões telúricas mesmo!!!!

    Beijão,

    Luzinha

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  3. Lulu, quero participar sempre das conexões telúricas com vc. Adélia Prado pode nos fazer, realmente viajar e descobrir a beleza em cada momento, adorei os seu relatos de vivência com ela, quase também fui as lágrimas. Beijos Sue

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  4. Ei Lulu!

    Este foi o último texto que li hoje, depois de passear pela primeira vez no seu blog (sei que estou atrasada, mas você me entende)!
    E seguindo as conexões telúricas, você me ligou no meio da minha viagem... Eu havia acabado de ler Ecumênica e enviar ao Beto.
    Devo dizer que foi você quem me apresentou Adélia Prado!!!! E vocês duas sempre me fizeram chorar.
    Beijos,
    Ceci

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  5. Cecizinha boom!!

    Bem-vinda ao meu aquário!! Caramba, não sabia que tinha lhe contaminado com a minha mania de Adélia Prado.:) Taí mais uma conexão telúrica poderosíssima!!!

    Com amor,

    Lugabirú.

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