Os Cravos e a Rosa


"Ele era para mim como uma fonte no deserto."
 (Trecho do livro "O Pequeno Príncipe")




Há muitos e muitos anos, numa revista distante, li um artigo com o sugestivo título: “Os opostos se atraem, mas depois se repelem”. Deve ter sido nessas folheadas de salão de beleza. Alguma Caras, Capricho, Contigo, Nova... O texto falava da importância, ao meu ver verdadeira, de se ter mais traços em comum com o seu companheiro(a) do que oposições de gostos e estilos de vida. Desse modo, a relação teria mais chance de ser duradoura. 

Essa afirmação em forma de título me acompanha desde sempre, mas eu nunca desisto de fazer amizades com pessoas bem diferentes de mim. Gente tímida e delicada me atrai como aquela mosquinha da animação Vida de Inseto. Ela recebe a advertência da outra mosca: Não olhe para a luz, não olhe para a luz! Entretanto, retruca: MAS, EU NÃO RESISTO! E segue hipnotizada para a armadilha azul. 

O jogo de seduzir um introvertido me dá muito prazer. A trabalheira é grande, o que torna o desafio apetitoso. Ao longo da minha vida fui conquistando, como um Átila, amigos fechados, retraídos e discretos. O outro lado da lua que me impulsiona. 

A primeira boa amiga dessa leva é Patrícia. Sua voz era aos seis anos (e é até hoje) tão doce e baixinha, que no meu ímpeto desbravador não a ouvi diversas vezes. Mesmo assim, tornamo-nos amigas para sempre, pelo menos assim creio. Eu a persigo e ela se esquiva: gato e rato clássico. Ou estaria mais para orca e foca? 

Depois de laçar Patrícia, fiquei viciada. Ávida por reter um pouco dessa graciosidade, dessa invisibilidade que, de maneira alguma, significa falta de expressividade. Não façamos confusão! Eu, por mais que me esforce, não consigo passar despercebida.

É um fardo às vezes chato ser tão efusiva, passional e colorida. Entro num curso onde não conheço ninguém e digo para mim mesma: vou ficar bem quietinha, só ouvindo. Até parece... Daqui a pouco estou dando pitaco, opinião, atiçando a polêmica e liderando a banda... 

Por isso, os sutis me são tão caros. Tenho inveja ótima dos seres serenos. Procuro conviver com eles para que me transmitam - por osmose que seja - essa mansidão. Essa iluminação interna e não sol tostando a cabeça de quem se aproxima. 

Os fechados são de uma elegância... A placidez lhes confere altivez e lucidez. Não essa impulsividade que me leva ao destempero. Daí, vieram namorados caladões, amigos idem. Um esforço para lhes desvendar a alma... Sem contar que essa galerinha costuma ser do tipo formiga. Nada mais atraente para uma cigarra por vocação. 

Um dia, fiz amizade com uma jornalista que era puro silêncio e concentração. Ela não misturava as estações quando estava trabalhando. E eu nunca dava bola para as cortadas dela: Luciana, você está me atrapalhando. Gostava dela de qualquer jeito, a Lumi Kihara, japonesa dura na queda. 

Insisti tanto e perturbei tanto a coitada nos anos de Imprensa do STJ, que viramos amigas. Conheci a casa dela e, numa demonstração profunda de afeto, ela se ofereceu para cuidar do Tomás, bebê de três meses, a fim de que eu fosse ver uma peça muito esperada com o Bernardo. 

Porém, Lumi se foi para Sampa e sumiu no vácuo. Eu sabia que seria assim... Que em algum momento teria de deixar que ela escapasse das minhas investidas. Sei que ainda recebe meus e-mails, mas não responde nenhum. É o jeito Lumi de ser. Compreendo a dinâmica. 

Alessandro Platero, Júnior, Márcias (Godinho e Romão), Carmemcita, Ana Cristina, Cecília, Paulo Magno, Suelene, Reginaldo... Amigos corteses, amáveis, encaracolados, impenetráveis... Incontáveis são as vezes que lhes firo com meus espinhos. Eu, a rosa egocêntrica. Eles: meus ternos (e espero eternos) pequenos príncipes. 


Comentários

  1. Ah, prima... Bom texto sobre os quietos, no caso eu, né?

    Beijos.

    Valdeir Jr.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Falso. Depois daquele funk, vc não me engana.:)

      Excluir
  2. Obrigada Lu, por me mencionar.

    Bjs.,

    Cecília.

    ResponderExcluir
  3. Sua linda!

    Carmem Cecília.

    ResponderExcluir
  4. Acho que, além da Lumi, vc escreveu pra mim.
    Sou quieta. Muito quieta.
    rsrsrsrsrsrsrs.

    Hylda.

    ResponderExcluir
  5. Olá, minha querida e 'ídala' Lulu!
    Caramba, eu estou no Blog da Lulu! uruuu!

    Obrigado pela simpatia, dna. Lu!

    Olha, essa questão de ser discreto é tão relativa...
    Eu, por exemplo, esse caracol por natureza, queria ser, na maioria das vezes, um leão, cravar minhas garras no mal que assola meus dias, ou uma águia, a dar rasantes na cabeça de bagre de muita gente rs.

    Mas admiro os discretos, principalmente os clássicos, que sempre possuem uma saída mágica para o dia a dia...

    Filos-Abraços!


    RegisObama.

    ResponderExcluir
  6. Temos que combinar os títulos... rs.
    Um dos meus textos chama-se “A Rosa e o Cravo” rs...

    Mas nem chega perto do seu...

    Valeu!

    Reginaldo.

    ResponderExcluir
  7. Ai que lindo! Que honra ter sido a sua primeira quieta de quem vc desvendou a alma! Nossa, somos tudo isso mesmo? rs. Que bom, então! Sorte a nossa ter vc para sondar nossos mistérios e fazer aflorar o que há de melhor em nós! Como sempre, pelas sua escrita amorosa e delicada, tudo se torna extremamente poético!

    ResponderExcluir
  8. Lu, querida, tudo bem?

    Vi que há trechos aqui do email que você me mandou.... Fiquei feliz, porque o seu tempo gasto comigo serviu para algo importante, que vai ser lido até em Israel! Maravilha!

    É, sou econômica nas palavras faladas... conforme o tempo vai passando, vou ficando mais parecida com meu pai... Ele sempre foi econômico com as palavras. Eu estou aprendendo a ser. Meu irmão também era. Já minha mãe fala muito, assim como minha irmã mais velha. Não sei se foi o Cespe que fez essa mudança em mim, ou se foram meus filhos, ou se o tempo...

    Beijos felizes pelo dia londrino
    da
    Carmem Cecília

    ResponderExcluir
  9. Nao posso ficar quieto diante desse texto, por isso vou gritar: OBRIGADO PELO CARINHO! Platz

    ResponderExcluir
  10. Eu também não posso me calar diante da homenagem aos calados! Obrigada pela percepção generosa do nosso silêncio, ele definitivamente não é descaso, indiferença, sei lá... É um modo concha de ser!
    Bjo,
    A lírica caramuja

    ResponderExcluir
  11. Lu, bom dia, por favor estou precisando arranjar um UNS, aonde encontra-ló?

    Eni Assunção.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

Presentim de Natal

Coisas da vida

Elementais