Transmutação





“A metamorfose não é privilégio apenas da borboleta. Outros animais, como os anfíbios, também sofrem transformações. Porém, as mudanças sofridas por esses insetos são as mais radicais.”
(revista Super Interessante)


“Quando, seu moço, nasceu meu rebento não era o momento dele rebentar...” A data provável para o parto era 1º de Maio, Dia do Trabalhador, dia da minha mãe. Mas ele decidiu que teria um dia só para ele. Veio ao mundo na manhã do dia 30/04. Passara a noite toda para lá e para cá, crendo que a minha bolsa havia estourado. Entretanto, não sentia nenhuma sensibilidade além daquela água pingando de mim. 

Por volta das seis e meia, acordei o futuro pai de primeira viagem e ligamos para a obstetra, a fria, porém competente, Lucila Nagata. “Vejo você no consultório às sete e meia”. Trêmulos, fomos pontuais. A médica constatou que a bolsa não rompera, apenas rasgara e o útero perdera bastante líquido amniótico. “Teremos de fazer uma cesárea de emergência”. Eu, que me preparara para um parto normal, caí em prantos. Não queria que meu filho viesse ao mundo sem a minha participação ativa e lúcida. 

Lucila foi legal, apesar do não envolvimento emocional. Deu-me uma hora. Uma horinha de esperança. “Você vai tomar ocitocina, o hormônio que provoca as contrações. Vou almoçar e volto em 60 minutos. Se até lá você não estiver pronta para o parto normal, teremos de fazer uma cesariana”. 

Ela se foi, deixando pai e mãe aflitos no quarto do Hospital Santa Lúcia. Todavia, não tive tempo de curtir nenhuma nóia. As contrações vieram avassaladoras. Era algo que nunca havia experimentado. Dor lancinante, aguda, profunda, das entranhas. Bernardo ficou apreensivo, pois jamais tinha visto a mulher em sofrimento físico semelhante. Comecei a proferir todos os palavrões da minha pequena lista. Ele tentava me distrair perguntando as respostas para as palavras cruzadas que tinha nas mãos. 

Lucila, a oriental pontual, chegou exata. Fez o toque e disse: “Seis centímetros e meio de dilatação. Vamos para o centro cirúrgico, vai ser normal”. Chorei de felicidade ou dor. Dois sentimentos tão próximos. Encontrei outras futuras mães no caminho. Todas impecáveis, até maquiadas. Eu suava e gemia. Ouvi o choro de um Matheus chegando ao planeta Terra na sala ao lado. Ofegava e fazia força. O futuro papai foi convidado a amassar minha barriga. Mais agonia. Superação e alegria. 

Às 11h30 da manhã, Tomás saiu de mim tranquilo, quietinho. Vi quando a experiente Lucila fez um giro de 360 º naquele delicado corpo rosa. “Ainda tinha uma circular de cordão! Só eu mesma para fazer esse parto normal”, gabou-se, enfim mostrando um traço de desafinação. A parteira de branco colocou o guri em meus braços. “Ele é tão quentinho”, disse, explodindo o choro contido. Trilhões de sinapses e correntes elétricas atravessaram todas as minhas terminações nervosas. Era pura adrenalina e fome. Fome de viver. 

Tenho uma amiga carioca da gema que sempre curtiu ver programas sobre partos no canal Discovery. Eu não entendia aquela fixação. Não era mãe, simples assim. Hoje sou eu quem me pego assistindo aos mesmos episódios. Reviver aquele momento mágico e animal só quem pari outro ser entende. Nem pai entende, sinto muito. 

Tudo fica gravado a ferro e fogo na pele e na memória. Passaram-se nove anos, mas ainda foi ontem que a avó Maria chegou ao hospital antes da gente, que ainda estávamos retidos no consultório de Lucila. Dia sobrenatural. Dia de me tornar mãe. A maternidade é a transformação definitiva da natureza. Transmutação da lagarta em borboleta.


Comentários

  1. Lu,
    parabéns pelo lindo texto e pelo lindo Tomás.
    Ler seu texto só alimenta o desejo da maternidade em quem ainda não experimentou.
    Que Deus sempre abençoe seus pequenos!
    Beijo,
    Mona

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    1. Peixinha Mona,

      agradecida comovida! Obrigada pelas bênçãos sinceras e bem-vindas!

      Beijão,

      Lulupisces.

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  2. Claaaaaaaaaaro que chorei....
    Muitos beijos para seu menino mais velho!
    Curta!
    Beijos e beijos!

    Carmem Cecília.

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    1. Ah, eu também já chorei bastante, querida Carmemcita!

      Desde ontem eu choro, sabe? Na aula de yoga de ontem estava tão sensibilizada... Que coisa doida é essa tal de maternidade!
      E Tomás e mamãe tão próximos... Os dias dos dois... Nunca me esqueço da felicidade da avó que via nascer o milésimo neto, mas se sentia como na primeira vez. Emoções transcendentais.

      Obrigada pelo carinho e por ler meus textos assiduamente. Você dever ver muitos erros de Português neles, né? KKKK!! Quando encontrar um muito feio, por favor, me diga!

      Beijão,

      Lulupisces.

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  3. Legal, Lu!Gostei muito.

    Beijos,

    Davide

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  4. Parabéns, querida Lu, grande Mamãe!
    Parabéns, Tomás! Um presente de Deus! Filhos são os melhores presentes que se pode ganhar...

    Beijos,

    Rosângela.

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  5. Parabéns a esse lindo menino, internamente e externamente!!!

    Ah, um dia quero ter um assim prá im....rs

    Bjs
    Patty

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  6. Querida Lu parabéns a vocês todos por este dia pleno de luz, de amor e gratidão, pela benção do nascimento do querido Tomás, menino lindo!!!
    Me emocionei...é lindo esse momento,né?
    Um beijo no coração do Tomás...Viva!!!
    Namastê!
    Cynthia

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  7. Olá,

    Parabéns pela nova vida de existência.

    Valeu !


    Julian
    www.julianrunner.com.br

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  8. Luciana,
    Meus Parabéns ao Tomás!!

    E a você e ao Bernardo também.

    Nove anos!!Crescendo e aprendendo(e nos ensinando)a viver.

    Um beijo,

    Paulo.

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  9. Parabéns Lu, pelo filhote lindo e pelo belo relato do quanto é bela essa nossa experiência materna. Bjs.

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