Matemática do afeto

Puxa, já está chegando... Sábado estamos aí de novo, para mais um Natal. Entretanto o Natal é sempre tão diferente. Desculpem os que não gostam da data, mas eu acho mesmo que essa época sempre nos surpreende com novos votos, nova energia, novos reencontros e muita poesia.

Eu adoro Natal! Família grande é muito bom nessas horas. Qualquer almoço já vira festa. E as crianças sempre fartas. Sobrinhos de várias faixas etárias nunca faltaram. E Natal, vamos combinar, tem de ter gurizada. Porque são eles que nos mostram que sonhar colorido é muito mais divertido.

Mamãe era uma sorridente contumaz. Não tinha tempo ruim na vida dela. E a vida dela não foi fácil. Isso também me surpreendia: a cada ano que passava, mamãe parecia mais jovem. Não dava a menor pelota para a velhice. Era a mesma moleca travessa, fazendo suas diabruras natalinas: presentinho para todo mundo, pernil bem temperado, enfeites novos para cada árvore, que muitas vezes foram de verdade. Saíamos para cortar um pinheiro desavisado por aí. Era aquela trabalheira botar a bicha no carro. Pesada... E as formigas que passeavam por cima dos embrulhos.

Uma semana antes do Natal dei um pulo em Goiânia para ver a melhor amiga da minha mãe. Tia Gessy na verdade é prima da gente, mas como era unha e carne com dona Maria, e tem quase a mesma idade, virou tia. E as duas eram exatamente semelhantes. Em fisionomia e espírito frugal. Falavam palavrão, beliscavam a gente, davam sustos. Olhinhos claros curiosos e sorrisos abundantes.

Depois que mamãe morreu, morreu boa parte da tia Gessy. E agora, depois de dois anos, parece que a tia resolveu entregar os pontos. Não vai ficar muito mais tempo nesse mundo. Quis vê-la antes de que acontecesse alguma coisa ruim. E quando cheguei lá, me assustei: tia Gessy está uma fotocópia da minha mãe em seus últimos meses de vida. Abraçá-la foi como sentir o calor de dona Maria. A transparência da pele fina, alva, enrrugada e familiar.

De certo modo, foi reconfortante dar a mão para aquela mulher que minha mãe amou. Senti mamãe me acarinhando e gostando dos meus sapatos de joaninha. Assim como mamãe, ela quer ficar boa, viver ainda mais cem anos. Quem dera querer fosse poder, né? Mas ela não se deu por vencida e montou, como faz todos os anos, um presépio enorme, que ocupa uma mesa de oito lugares. Cada delicadeza...

Agora entendo os poemas de Adélia e Drummond exaltando as mães e essa saudade surda. Não há um dia em que não pense na minha. Falta absurda de sua companhia sem cobranças. De nossas compras de Natal, garimpando feiras de artesanato pela cidade.

Mais um 25 de dezembro se aproxima. A irmã mais velha agora assumiu o papel de matriarca da família. Também viramos unha e carne, como tia Gessy e mamãe. Quase quero roubá-la para mim, mas sei que devo me conter. Minha irmã tem sua própria família, seus filhos, seus netos. Sinto um ciúme agudo nos meus sobrinhos, mas é compreensível. Eu também não ia querer dividir minha mãe assim, com tanta gente.

Porém, compartilhei. Com seis irmãos, e uma dezena de netos. No fim das contas, era soma e não divisão. A melhor parte. Mamãe comandando a orquestra e nós gravitando ao seu redor, tocando nossos instrumentos diversos. Meus filhos nunca mais terão esse Natal. Mas terão outros, que faço questão que sejam assim: inesquecíveis.

Comentários

  1. Sei como vc gosta de festas e comemorações e ter uma mãe que sempre valorizou isso é tudo de bom. No meu caso era diferente, quando criança. Só eu, meu pai, minha mãe. Às vezes eles brigavam e minha mãe ia para o quarto e não tínhamos natal. Outras vezes, visitávamos as casas dos vizinhos, aí era mais legal, tinha mais clima de festa e filávamos, além das comidinhas (rs), um pouco do espírito natalino de outras famílias. Mas pior foi na infância de minha mãe. Era só ela e a minha avó. Além disso, minha avó era telefonista e muitas vezes dava plantão em noites de natal. Resultado: minha mãe passou muitas noites de natal sozinha! Imagine que solidão... aí era demais né, prá mim iria ser muito difícil, mas ela diz que se acostumou e até hoje não liga, prefere ir à missa do galo e rezar.

    Beijos, um natal perfeito prá vocês e também para todos os comentaristas do blog,
    Patty

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  2. Curti demais!

    Bjs.

    Cecília.

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  3. É, natal tem que ter afeto, se não passa batido, deixa de fazer sentido. Tb trago boas recordações dos natais da minha infância e de quando as meninas eram pequenas. Agora, não sei... tá tudo meio no ar... vamos ver o que 2012 traz de bacana, né? Esperança tb é um bom presente de natal.
    bjus
    Isa

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  4. Feliz Natal Lu e pra toda a família...um Ano Novo abundante, pleno de realizações...também tenho boas lembranças dessa data, só que não com a consciência do que ela verdadeiramente representa...e quando penso assim vem uma indignação enorme... o que foi feito do Natal?!É verdadeiramente uma data em que a família unida se fortalece, é criada uma aliança de amor e fraternidade entre todos, a saudade vem , quando não temos mais todos presentes conosco, mas faz parte...é isso.Um Feliaz Natal a todos do blog também...bjão!Namastê!
    Cynthia

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  5. Muito bom!!! Amei!

    Um feliz Natal para vc e sua família!

    Bjos,

    Hellen

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