Marc Chagall




Vocês se lembram de como as borboletas eram fartas? De todas as cores e tamanhos, elas salpicavam o verde dos gramados, as rosas do jardim... Aliás, vocês se lembram de que havia muitos jardins com roseiras? Na minha quadra de infância, quase todas as frentes das casas eram coloridas por flores. 

E os pirilampos, vagalumes? No escuro da noite na roça, esses bichos míticos, mágicos apontavam os caminhos para a imaginação. Onde foram parar esses insetos, os únicos da espécie que não me dão gastura, pois, sejamos francos, insetos são detestáveis. Eu, que sou fã de documentários sobre animais, não dou conta de ver a vida secreta do louva-deus. Ou os métodos bizarros de alimentação da aranha X. Tudo eca!! 

Porém, as borboletas, ah, as borboletinhas e suas asas rarefeitas... Quando, enfim, conseguíamos capturar alguma, o pozinho ficava entre as falanges... Nas versões laranja, amarela, azulada, negra e agourenta, branca, listradinha... Pequeninas ou majestosas, as panapanás (saibam que encontrei essa palavra como sinônimo de borboleta. Será? Tão fofo!), são, ou pelo menos eram, a materialização da serenidade. Insinuação. 

Minha irmã mais velha é agrônoma. Nunca me esqueço de um dos trabalhos do curso que ela precisou fazer: uma caixa de madeira grande onde teria de alfinetar espécimes diferentes de insetos. Virou uma farra sair pela fazenda à caça de borboletas... Com aquela redinha e tudo. O projeto dela ficou um colorido só! Até um besouro gigante esverdeado a gente conseguiu garimpar nas andanças pelo mato. 

Hoje, as borboletas foram embora para o país das lembranças. Quando esbarramos como uma, geralmente apenas em parques ou reservas florestais, é daquela pequena amarela, talvez a espécie mais resistente, mais ordinária... Nada de asonas madrepérola, lápis lazuli, abalone... 

Os vagalumes, então, sumiram mesmo, de vez. Nem no mato profundo, no breu da distância, no oco da grota a gente dá de olhos com esses seres delicados. Deportados para o país da mitologia, ingressaram na categoria dos unicórnios. Na cabeça de nossos filhos, não passam de lendas, o que poderia ser, mas não é. Abstrações. 

Penalizo-me por eles. Pobrezinhos! Jamais saberão o sabor de prender uma joaninha em caixa de fósforos com uma folhinha de erva-doce... Não conhecerão a conquista de caçar pirilampos para ver suas nádegas luminescentes através do vidro de maionese vazio.

Sobraram baratas, cupins, abelhas (não muitas), cigarras horrendas e formigas, milhões delas. Mas, tudo bem, eu até curto, não pra comer içá, como se deliciava Monteiro Lobato, mas pra observar o trajeto ordeiro, a obstinação e organização dessas pequenas vorazes. 

Nesse domingo, no meio da trilha de bicicleta no Jardim Botânico, fui alvejada por uma borboleta azulada, aquela imensa que no centro é azul turquesa e nas bordas, negra. A última vez que tinha visto uma destas foi na caixa da minha irmã: mortinha, cravejada por um alfinete de cabeça vermelha. 

O deslumbre da imagem foi tamanho que, na madrugada, sonhei que estava nua e uma borboleta única pousava sobre o meu sexo.


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Comentários

  1. Boa a sua lembrança desses insetos que realmente sumiram, como as joaninhas, vagalumes e as inúmeras variedades de borboletas...Essa azul que é belíssima, tive a oportunidade de ver muitas agora quando estive na Serra do Cipó, mas mesmo lá ,só vi dessa espécie.
    Um beijo...Namastê!
    Cynthia

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  2. Luzita,

    outro dia também indaguei sobre o paradeiro dos vaga-lumes e o Wainer me garantiu que vivem felizes e abundantes na chácara do seu papito Sr. Valdir. Lanço a proposta educativa de combinarmos um acampamento com os meninos (seus, do Wainer e quem mais chegar junto) para uma expedição científica ao Vale dos Vagalumes Perdidos! Que tal?

    Isa Frantz.

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