Cantilena




Dia desses, durante a aula de karatê do meu primogênito, uma mamãe estilo gatinha, com suas malhas de ginástica justas e cabelão aloirado, falava ao celular o seguinte: 

- Mas você precisa me passar o nome daquele terapeuta. Preciso levar o Eduardo. Ele anda tão sem limites! Imagina quando chegar à adolescência... 

Hoje a gente não precisa de muito para saber da vida das pessoas. Nem é necessário se dar ao trabalho de ler blogs confessionais, por exemplo. É só ficar sentado ao lado de alguém ao celular e pronto: estamos por dentro das intimidades alheias sem que estejamos realmente interessados. 

Falar ao telefone no meio da aula do filho é uma falta de educação básica, na minha opinião. Mas o que mais me intrigou foi a tal mãe precisar de um terapeuta para dar limites ao filho dela. Onde é que estamos parando???? Os pais contemporâneos estão se eximindo das funções primordiais incluídas no pacote da vida em família. Não vale só tirar fotos lindas dos rebentos para exibi-los no facebook. Por gentileza, coloquem a mão na massa!! 

Ao fim da aula, descobri que o filho dela foi o mesmo que um dia jogou um copo de água gelada na cabeça do Rômulo, quando este ainda estava frequentando o karatê. Detalhe: o menino tem uns nove, dez anos. Mas esse se chama Rodrigo, eu acho. Então o tal do Eduardo já deve estar apresentando comportamentos bem mais bizarros por falta de pai e mãe à altura da responsabilidade. 

Esses meninos e meninas esnobes de hoje em dia... Sou mesmo muito medieval. Não consigo conceber nariz em pé em fedelhos. Que Deus ajude os psicólogos, pois os professores estão, há um bocado de tempo, reféns dessa geração de tiranos. De pés e mãos atados por pais que pressionam as escolas a tratar seus filhos como preciosidades. 

Desculpe-me, mas meus filhos são preciosos apenas para mim e para o pai deles, talvez para os tios e avós. Eles não nasceram diamantes, por mais que tenhamos a vontade de dourá-los assim. Ao contrário, são carbonos incrustados nas rochas.

Não dá para conduzir a vida dessa criançada como se fosse herdar o trono de forma natural. Não compartilhamos uma eterna monarquia social, thanks God! Mas as famílias atuais estão mais para God save the Queen and King, os príncipes e princesas com seus quartinhos atulhados de brinquedos e roupas. 

Filhos serão tesouros para a sociedade se aprendem a ser gente. E as baterias, nesse caso, não estão incluídas. O estofo só pode ser fornecido pelos pais por meio de exemplos, de educação para a solidariedade, de broncas, de tudo que a gente passou nas mãos dos nossos pais, que eram mais limitados em fundos e psicologia, mas deram conta do recado. Por que nós não? 

É a batida tum-tum do muito ter e nada ser. Muito dar e nada cobrar. Eu tô careca de saber, você também. Entretanto, vejo o quanto nado contra a maré. Como meus filhos estão cercados por crianças ogras (nada parecidas com Shrek) destruídas desde cedo pelo egocentrismo, pelo narcisismo e até pela maldade.

Tem pai que acha que terapeuta é panaceia para todos os problemas. Que basta fazer um photoshop para sumir com todos os defeitinhos incômodos de seus pimpolhos intoleráveis...

Limites são aprendidos em casa, não no divã. Menos "fast, beautiful and fun way to share your life with friends and family"... Sinto muito, mas preparar os filhos para o mundo não é uma seleção das melhores fotos no Instagram.



Comentários

  1. Educar dá trabalho né?

    É muito mais fácil largar o dia inteiro (noites incluídas) nas mãos das empregadas, grudados em frente à TV ou do computador.

    Os professores sofrem nas salas de aula, porque perderam totalmente o controle de suas turmas. Os alunos são mal educados, desrespeitosos, cínicos... Culpa dos pais, claro!

    Mas tem o outro lado da moeda né? Outro dia eu disse à Larissa que TV emburrece. A imagem já vem pronta, então a pessoa desenvolve a preguiça de pensar. Sim, porque cérebro é como qualquer outra parte do corpo: se não usar atrofia.

    No dia seguinte ela voltou da escola dizendo que a professora falou para ela que "sua mãe está errada! Tv não prejudica ninguém!"

    Ah Jesus! Não sei qual é a solução para a escola brasileira, mas pelo menos no meu caso, eu ficaria feliz se a professora se limitasse a instruir (coisa que ela não faz, porque a gente só pode ensinar aquilo que a gente sabe) e deixasse que da parte de educar, cuido eu.

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  2. Corretíssimo!!!!!

    Marina Caldana

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  3. sabe Lú, sempre achei limites uma coisa muito importante na vida de todos é uma organização familiar saudável, agora também sei que damos o melhor de nós e nem sempre o nosso melhor é o melhor para os filhos...e que cada um dá o que tem, não tem como cobrarmos algo dos outros se eles não tem para nos dar...cada um tem uma prioridade na vida...já vi muitas crianças que foram criadas sem limite algum que viraram adultos éticos e sensacionais e muitos que tiveram limites e se tornaram tiranos...se é para refletir está ai a minha. Alberto pediatra da Mariana e hoje do Pedro, disse à Mariana o mesmo que escutei quando ela nasceu...quando nascem são verdadeiros príncipes, depois se tornam reizinhos, imperadores e depois pequenos tirano, cabe a nós. Só sei que filho não vem com manual ou bula, que precisa de muita sensibilidade para cria-los, boa sorte na sua jornada.

    Beijos,

    Renata.

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    1. Prima Renata Guedes Assumpção Queiroz, sim, cada um dá o que pode, mas muitos pais poderiam estar dando muito mais e não dão. Simplesmente porque é esgotante educar crianças. Bater nos mesmos pontos diariamente. Às vezes é melhor deixar que a televisão, o videogame e o nada façam o trabalho... Afinal, a gente já fica tão cansado das nossas jornadas de trabalho. Conheço muitos coleguinhas dos meninos que estão completamente perdidos. Uns com problemas de LER causadas pelas horas infinitas que passam na frente do computador. E isso com 8 anos!!!! São os reflexos dessa sociedade um pouco desnorteada... Precisamos encontrar um equilíbrio já! Beijos e obrigada pela contribuição ao debate!

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  4. Ei Luzinha,

    concordo com vc, o psicoterapeuta fazer o papel que cabe a nós é absurdo e, tanto quanto, tarefa impossível. Só acho importante a figura do psicólogo para organizar as cabecinhas, os pensamentos e sentimentos das crianças e dos adolescentes (e da gente tb!), quando vemos que eles não estão dando conta, e que não vão compartilhar certas ideias com os pais, justo com eles e exatamente por serem eles os pais, por vários motivos. Já com um profissional que os acolha, com quem possam se abrir e que os ajude em suas angústias, aí é mto válido, né?

    Beijos,

    Patty.

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    1. Claro, Patty Patricia Bustamante!

      Terapeutas são ótimos sempre! Não para dar limites a filhos mimados, mas para fazer essa organização mental mesmo. Rômulo está na terapia. Não tenho nada contra terapia infantil, juvenil e adulta. Eu já fiz terapia, você sabe. Inclusive de casal e salvou meu casamento. O texto não está indo contra a ajuda terapêutica. Está indo contra pais que não fazem a sua parte porque dá muito trabalho fazer essa parte todos os dias. É uma canseira sem fim colocar limites nesses guris conectados de hoje em dia.

      Abreijos,

      Lulupisces.

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  5. Oi, Lu
    não sou mãe, mas o que percebo é que alguns pais, no afã de proteger seus filhos, não dizem não, criam os filhos numa redoma (tive colegas que nunca tinham andado de ônibus; os pais tinham medo) e acham que castigo traumatiza. Levei cintada, chinelada e nem por isso me tornei uma pessoa traumatizada. As regras de convivência que não são aprendidas em casa o mundo ensina. E é muito pior aprender nele.

    abraços
    Fabiana

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