Intensivão


Volto para casa querendo sofá depois de mais uma jornada de trabalho. As Olimpíadas são a desculpa ideal para me jogar na frente da TV e curtir qualquer esporte que esteja rolando. Se for Brasil, ótimo, mas qualquer superação me fascina. 

Curto esporte desde pequena. Influência do irmão Eduardo, um atleta inquieto. Praticou saltos ornamentais, remo, futebol de salão, tênis, sem falar na boa e velha pelada disputada toda semana com os amigos da quadra (de jogos e da vida, pois em Brasília chamamos de quadra um conjunto de residências). Edu também teve uma bicicleta esperta, daquelas primeiras com 18 marchas... Ou seja: ele era uma inspiração para a caçula que começava a dar seus saltinhos no balé.

Entre as minhas doces recordações fraternais está assistir às partidas dos Grand Slams na espremida sala de TV da grande família ao lado de Eduardo. Nosso lar era um cortiço divertido e maluco que cabia, no máximo, quatro, mas onde se acotovelavam oito. Mas as agruras do cotidiano não nos impedia de apreciar Martina Navratilova brilhando em Wimbledon ou no USA Open; Biong Borg em Roland Garros; Chris Evert Lloyd, Jimmy Connors, Ivan Lendl... Nomes e atuações que ficaram para sempre gravados em mim.

Milhões de anos depois, tive a emoção de conferir Martina ao vivo no aberto dos Estados Unidos. Era uma coroa, mas ainda poderosa, lendária. Ganhou a partida de duplas e eu me senti realizada por estar ali, vendo um ídolo da minha infância. A personificação do atleta vitorioso que eu pensava inatingível, porém real, em carne, osso e suor. Queria muito que meu irmão estivesse comigo nesta emoção, como naquelas partidas da TV nas quais nossos afetos torciam juntos.

Todas essas memórias vêm à tona quando tenho o prazer de vibrar com mais um Jogos Olímpicos. E a tecnologia atual deixa tudo ainda mais surpreendente! Quatro canais a cabo para escolher com modalidades diferentes e a câmera super lenta que mostra cada careta de dor e realização dos competidores. A gente consegue ver todos os músculos do corpo obedecendo ao comando da mente. É algo fabuloso o que o ser humano consegue fazer: resgata a ancestralidade símia e se lança no espaço, salta, rola, agarra, enrosca. Natureza em movimento.

Mas todo este nariz de cera foi para me justificar. Retorno para casa querendo sofá e esporte depois de uma jornada de trabalho. Rômulo está com o Ipad na mão, zanzando para lá e para cá. Atletismo na TV e ele me pergunta:

- Mamãe, espingarda tem m ou n?
- É com n, Rômulo. Es - pin - gar- da.

Alguns minutos se passam e ele pergunta de novo:

- Mamãe, essa menina está morta de verdade ou é brincadeira?
- O quê???? Menino, o que você está vendo???

Acordo da minha morfina adrenalina esportiva e puxo o Ipad da mão do garoto. Cenas horrendas de pessoas mortas por tiro de espingarda se misturavam a outra imagens inocentes da arma em si, o alvo da curiosidade do meu filho, que buscava apenas saber como era uma espingarda.

Expliquei para o garoto que ele não tinha idade para ver aquilo e mostrei que era melhor procurar "desenhos de  espingarda". E sim, a menina infelizmente estava morta porque as armas quase sempre são uma tragédia na vida das pessoas.

Moral da história: mãe não tem segundo tempo, intervalo, segundo salto. Mãe é tempo real, é on-line, 200 metros com barreiras, barras assimétricas, maratona, pentatlo, boxe, tie-break Brasil x Rússia, final olímpica. Todos os dias. 


Comentários

  1. Adorei!

    Como sempre manda muito bem o recado, mas relaxa nem sempre o melhor que damos à eles, é o melhor pra eles...faz parte da caminhada, afinal eles não vem com manual de instrução...

    Devemos dar o que a curiosidade deles pedem, rsrs se te contar metade das curiosidades que moviam a minha Mariana, das duas uma...ou morre de rir ...ou achará um absurdo...

    No final, foi ela que me criou kkk, fui obrigada a rever um monte de conceitos errados cheio de ranço...

    Muito boa essa arte de ser mãe...agora avó...é você aprender sem pudor.

    Bjs,

    Renata.

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  2. Nariz de cera? Ô Luciana, tenha mais consideração com seus leitores que não estão familiarizados com o jargão jornalístico. Tive que "gugar" pra saber o que era isso.

    Sua prima - minha irmã - passou por um perrengue parecido. Minha sobrinha procurava um site de jogos, digitou uma cedilha acidental, e sairam umas imagens de sexo. Minha irmã teve tranquilidade suficiente pra contornar a situação, mas isso mostra como as crianças estão expostas a tudo isso. Mesmo com todos os mecanismos criados (filtros, senhas etc).

    Beijos olímpicos procê.

    Valdeir Jr.

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    Respostas
    1. Este comentário foi removido pelo autor.

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    2. Desculpe, primão!!

      Mas não resisti porque, na verdade, eu ia escrever sobre o tema TV, armas, nóia dos pais modernos. Só que as Olimpíadas entraram no meio da história e eu acabei me comovendo,falando do meu brother, e rolou essa embromation antes do que eu realmente gostaria de escrever.

      Você tem razão quanto à impotência dos pais modernos frente às redes sociais. Também fiquei pensando nisto... Em como não temos, de fato, o real controle sobre o que nossos filhos verão antes da hora.

      Fazer o quê? Esse mundo tecnológico é inatingível... Os papais de hoje ficam apenas correndo atrás do prejuízo, os retardatários!!! KKK!

      O lance é respirar fundo e ter jogo de cintura.

      Um abraço enorme e saudades de você!!

      Lulupisces.

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  3. Oi Luciana,

    Jeito despojado e gracioso de dizer uma verdade, o segundo turno feminino...

    Ótima quarta para você!

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  4. Lu,
    você esqueceu a luta de box que travamos todos os dias. É um UFC sem trégua... afff e o pior é que os meus têm 18 e 23 e dão tanto trabalho quanto os seus... a Olimpíada não é de quatro em quatro anos, mas de quatro em quatro minutos no nosso país chamado maternidade... all the time...
    kisses com pesos e cordas...
    analu

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  5. Prá não dizer que sou virgem de tudo a respeito de esportes, inacreditavelmente, em Mil Novecentos e alguma coisa, peguei um ônibus de uma excursão promovida pela família de Giovane Gávio e fomos para o Rio de janeiro assistir a uma partida de voley contra Cuba! Foi uma experiência bem legal. Fiquei perdidona vendo a partida sem uma narração para me ajudar! rsrsrs. Haja dependência televisiva. A parte chata é que perdemos! Os Cubanos já chegaram botando banca e dando língua prá gente...rs. Que raiva! Mas o mais legal for ver a Geração de Ouro lá jogando: Giovane, Tande, Maurício, Marcelo Negrão... fiquei viciada nos campeonatos na época. Legal, né?

    Bjs
    Patty

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  6. Oi Lu,estou curtindo muito as Olimpíadas também, gosto de tudo...me emociono a ponto de chorar, ao ver a disciplina, o esforço, de cada um para alcançar o objetivo da vitória,toda a beleza e possibilidades de superação, coroado pelas medalhas...e nós como mães vivenciamos sim, estas mesmas batalhas dia a dia,hora a hora, minuto a minuto, e no final também saímos vitoriosas e recebemos as nossas medalhas...filhos, netos,felizes, saudáveis, inteligentes e por ai vai...bjão olímpico!
    Namastê!
    Cynthia

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  7. Esse Rômulo está dando nó em todo mundo hem...
    Quem diria, desse tamanho...

    Beijos,

    Ana Cláudia.

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