Horizonte de eventos


“Sei, não, mas acho que meu pé não se ajusta a sapatinhos de cristal.”
(da efervescente amiga Monalisa)

“Pra quem não sabe amar,
vive esperando alguém que caiba nos seus sonhos”.
(Cazuza dizendo tudo as aways)

“Estraçalha, Lu!”
Sem mais nem menos voltei ao primeiro ano do segundo grau, fase de aventuras deliciosas. Adolescência... Hora da descoberta do mundo sedutor. Aquele em que você desfila com suas calças jeans apertadinhas e cabelão na cintura à espera dos olhares dos meninos encostados na mureta de proteção do corredor.

Aos quinze anos mudei de escola. Saí de um ovinho de galinha para um ovão de avestruz. Quanto mais provinciano o lugar, menos chances tem uma menina exótica de brilhar. Então no novo colégio, “resplandeci”. Assim, numa conjugação inédita, licença poética da menina descobrindo o poder da mulher.

Foi uma época muito divertida. Era a dona do mundo e do coração de alguns colegas da turma. Um deles, o Rodrigão, era metaleiro. Eu nunca havia convivido com um quase punk na minha escolinha de freiras pequena e humilde. Lá estava ele, repetente, roqueiro fake, cabelos desalinhados, camisas pretas, cruzes e calças rasgadas.

Não sei por quê não me apaixonei por ele, intrigante. Talvez eu fosse menos ousada do que eu julgava ser naquela época. Mas Rodrigão me enchia a bola de tal maneira... Eu entrava na sala e ele gritava lá da última carteira: “Lu, estraçalha, Lu!” Será que ele sabe o bem que fez – para sempre - à autoestima e confiança dessa menina com cara de bolacha?

Coloria a minha agenda com frases dúbias em garranchos góticos e me mostrava fotos da sua turma heavy metal no cemitério e no esqueleto de prédio abandonado ao lado do Venâncio 2000. Algumas vezes desci a pé até o seu apartamento, na 205 norte. Éramos amigos e não havia risco algum de que esse laço fosse rompido por qualquer rompante da parte dele. Um roqueiro gentleman que, na intimidade, descobri alternar na vitrola ACDC, Metallica e Roupa Nova. “Linda, só você me fascina...”

Mas daí eu acabei namorando com o introspectivo e convencional Murilo, também repetente, e que não tinha coragem de se aproximar. Sua estratégia de conquista envolvia apenas olhares de cachorrinho carente na minha direção. Deu certo. Devo ter algo de maternal dentro de mim que eu mesma desconheço.

Ai, bons tempos aqueles que culminaram na UnB e sua anárquica magia. Bonito ter tido em minha vida a passagem de garotos interessantes e honestos. Nada de corações em pedaços, de traumas juvenis, de paixões recolhidas. Vivi passionalmente bem todas as loucuras daqueles anos, incluindo as que não deram certo porque, claro, não eram mesmo para dar. Quem aos 15,16 anos pode crer que realmente encontrou o amor de sua vida?

Estava aprendendo, jogando, lendo as entrelinhas do que eu pretendia como mulher. Às vezes eu ouço essas músicas de dor de cotovelo intensas, essas frases iradas sobre homens cafajestes, esse lance de desilusão e não me reconheço em nenhuma delas. Será que tive sorte? Pode ser... O rio do meio estava entre Rodrigão e Murilo. E foi assim que aconteceu Bernardo.

Comentários

  1. Amei o texto...e o final foi fofo! Pode pegar emprestadas quantas das minhas pérolas vc quiser. Tá liberado! rs. Bjok,

    Monalisa.

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  2. Lembro dos cabelos castanho-claros lisos, brilhantes, sempre bem escovados e com corte retíssimo. E do corpinho com um bronze de dar inveja de quando vc pegava sol na laje. Abafa!!! rsrsrs. Lembrei disso agora: Patty, vamo tomar sol na laje? "Estralhaça, Luzinha!" rsrsrs

    Vc sempre fez boas escolhas na vida, entre elas as amorosas. Havia verdade e consciência nelas.

    Bjs
    Patty

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