Entre o verde e o bestseller

O bom de um blog para chamar de seu é que você pode escrever qualquer coisa nele. Uma liberdade e tanto, ainda mais quando pouca gente nos lê.;) E, nesse caso, a gente pode até repetir histórias e textos, pois para boa parte dos leitores, tudo vai soar novinho em folha.

Falando em folha, acabo de recuperar uma memória doidinha: é da minha mãe. Ela roubava mudas de plantas dos jardins. Era só ver uma plantinha diferente que lá estava ela: puxando com delicadeza o espécime pela raiz. Levava pra casa com todo cuidado, colocava no saquinho de leite cheio de terra e adubo... Às vezes era num vasinho... E pronto: a planta nem sentia que já estava morando em outro lugar, pois mamãe era uma menina do dedo verde absoluta.

O jardim da casa da mamãe era quase um jardim botânico!!! Variado, colorido e maluco. O importante era plantar, amar e ser amado enquanto verde. A catalogação era a própria cabeça de Maria, que sabia todos os nomes das plantas de cor. Havia sempre mais de dezenas de saquinhos cheios de mudas novas. Um berçário de caules e folhas. Era o passatempo dela, a vida, a cara dela.

Sinto tanta falta de ver Maria de cócoras com as mãos imundas de terra... Minhas pobres plantas também se ressentem dos cuidados dela. Na casa da Luciana não tem ninguém com esse talento inato para os vegetais. Talvez o Rômulo, que era apaixonado pelo jardim da avó. Mas acredito que meus vasos não aguentarão até o moloque alcançar a idade da razão.

Agora acabo de me lembrar que, mesmo numa cidade cinza como São Paulo, mamãe foi capaz de encontrar uma planta para roubar. Era a primeira vez dela na metrópole. Muito assustada e detestando tudo - mulher da roça e do verde não pode mesmo se encontrar rodeada de concreto - Maria foi me visitar. Queria se certificar de que a filha tinha saído da casa materna por uma boa causa, ou seja, por um bom casamento.

Estávamos à procura de uma geladeira. Não havia grana para comprar uma nova e, por meio dos classificados, encontramos uma no preço que o bolso demandava. Era 1993. Eu tinha 23 anos e sonhos de alcançar o estrelato na redação publicitária. Respondi ao anúncio pelo orelhão: telefones fixos ainda eram artigos de luxo, principalmente em Sampa.

O apezinho da Aclimação... O amor pode ser mesmo apenas uma cabana. E estávamos mesmo praticamente vivendo só de corações, pois eu era recém-formada estagiando de graça para uma grande agência de publicidade e o meu homem (estou experimentando essa denominação de acordo com uma campanha que diz que, se o homem pode chamar a companheira de "sua mulher", a mulher pode chamar o seu escolhido de "seu homem". Êta mundo crazy!!) era bolsista do CNPq. Já viu, né?

Mamãe, numa autêntica reação de genitora, venceu o medo e o asco de colocar os pés na paulicéia, e foi verificar ao vivo onde é que a filha impulsiva tinha amarrado o bodinho dela. Não gostou, é claro, mas também não disse nada. Mamãe não era mulher de palavras, só de gestos lépidos. E na semana que passou comigo, agarrou-se no meu braço assustada por entre as ruas lotadas, topando todos os programas agendados. Porque mamãe nunca atrapalhava. Era uma mulher leve e livre. Se julgava profundo, ficou em segredo.

Pois então, no tal edifício onde morava a geladeira pequena e velha, havia um jardim. E sem que eu percebesse, furtiva, translúcida e genial como só os grandes gatunos sabem ser, mamãe saiu da visita com um muda suja de terra nas mãos. Quando me dei conta, já estávamos no ônibus. Ela com aquela cara de travessura tão característica dela, a acalentar o tesouro no colo. Não tenho dúvida de que Maria está plantando muitas flores lá no céu.

Eu juro que não ia escrever nada disso. Era outra coisa. O post era pra ser de Natal e virou jardinagem. Mas o post é meu, o blog é meu. Sou eu quem mando aqui, apesar de as minhas memórias resolverem ter saído do cérebro sem pedir licença.

Mas, caríssimos e seletos leitores (quando vou virar bestseller?), prometo um texto novo ou reciclado (para ser mais in) natalino em breve.

Beijos adubados!

Comentários

  1. Com certeza sua Mãe está construindo muitos jardins lá no céu. Quando chegarmos lá, provavelmente estarão bastante floridos.
    Um grande abraço e Feliz Natal.
    Beijos, Lourdes

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  2. Lu querida: quero dizer que embora não tenha comentado com vc sobre seu blog, eu realmente sou daquelas que entro lá sempre e leio seus textos. Sempre. E notei uma coisa: vc escreve tanto sobre amorosidade, delicadeza, coisas bacanas e essenciais da vida e no entanto, o seu post de temas, o "de tudo um pouco" não tem a palavra amor.

    Fala de relacionamentos, comportamento, infância, maternidade, tanta coisa que envolve o amor, enfim....acho que está faltando vc inserir seus textos que falam no amor lá, amiga. Na verdade, sei que é mais do mesmo, pq está em quase tudo que vc escreve.

    Mas,particularmente, como leitora assídua e um pouco sua conhecedora, senti falta da palavra lá.

    Beijinhos e, se não nos encontrarmos (tô querendo passar no STJ para dar um beijo em vc e em todos de lá até o final do ano, mas pode acontecer de não dar) desejo o melhor para vc: um feliz natal e um 2011 incrível, com paz, saúde e muita, muita alegria.

    Da amiga que torce sempre por vc,

    Hylda

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  3. Olá Hylda-Florilda-maravilhosa-minha filha,

    pois é, quem mandou eu ouvir o nerd Mark Zuckalguma-coisa-Bernardo? Foi ele quem me reprimiu ao ver que eu tinha colocado uns 30 temas diferentes.;) E aí, de repente, ficou faltando o melhor de todos: tinha suprimido o amor. Um absurdo!!! Vou recolocá-lo já. Muchas gracias!!!!

    Um 2011 de flores para vocês todos, leitores assíduos ou não, comentadores ou não!!!!

    Lulupisces.

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  4. Se esse post foi resultado de um desvio de rota, jogue fora todos os seus mapas e bússolas. Perca-se mais vezes.

    É bom demais conhecer novas facetas suas por meio do blog. Esse seu estágio em Sampa, por exemplo. Nunca falamos sobre isso. E eu quero saber mais.

    Beijos, prima.

    Valdeir Jr

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  5. Viu? Viu? Viu? É a minha tese: muita gente lê seus textos, mas não comenta... vamos lá meu povo, nada de timidez...rs... vamos deixar nosso registro para essa futura escritora de bestsellers!!! Vamos ser os primeiros, hein? Que tal???
    Adorei viajar com você para o passado, ainda mais numa viagem tão doce e terna! Faço aquele filminho na minha mente e no meu coração...vejo tudo direitinho... que seu Natal seja florido, com jeitinho de Dona Maria... muita força e paz!

    Beijos,

    Patty

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