As mil e uma referências

Fim de ano é tempo de refletir num sem fim de coisas de tamanhos e importâncias diferentes. É época propícia também para ir atrás das nossas referências, às vezes daquelas que a gente até acha que não se lembra mais, entretanto,ao bater os olhos, sentir o cheiro ou ouvir a melodia, a gente recorda imediatamente. Foi assim quando revi, ontem, depois de tantos milênios, Harold & Maude, ou, para nós brasileiros: "Ensina-me a viver".

O que seria da nossa geração sem a querida Sessão da Tarde? Centenas de filmes essenciais para a nossa formação sentimental, política e comportamental foram deleitados, sem direito a pause, nas televisões Sharps 20 polegadas. "Ensina-me a viver" estava entre eles. A história do menino que gostava de ensaiar a própria morte que encontra a velhinha libertária marcou a minha infância.

Na adolescência, tive um namorado cuja irmã mais velha curtia Cat Stevens. Fiquei maravilhada com aquele som, como se ele fizesse parte de mim desde sempre, sem me dar conta de que se tratava do mesmo cantor que fez a trilha de Harold & Maude. Só na minha fase cinéfila é que fui perceber que tudo se completava. E agora eu revejo o filme, com tantos anos de bagagem nas costas, e ele se descortinou belo e atual, inconformado como eu. Eu sou aquela velha maluca que dá uma banana para as convenções, mas ao mesmo tempo dramatizo a morte como o adolescente de alma solitária.

E nesse embalo de refências, é proibitivo entrar na Livraria Cultura. A gente quer sair de lá com tudo o que nos faz relembrar, recriar ou reimaginar, afinal já profetizava Lavoisier: (eis aí outra referência fundamental) "Nada se cria, nada se perde, tudo se transforma".

Entoando o mantra do francês, deixo a loja com alguns marcos culturais nas mãos, na ânsia de promover um resgate do velho no meu novo eu. No afã de que  meus filhos também bebam das minhas fontes: Sítio do Pica-Pau Amarelo, Fantasia, Alice no País das Maravilhas, Tron, Karatê Kid, disquinhos de contos da carochinha que agora estão em CDs...

Arrisco dizer que os remakes e as releituras estão em voga porque carecemos de cavucar as referências dessas últimas décadas, tão avassaladoramente revolucionárias. Não deu pra deglutir tudo e por isso é preciso voltar, transformar e recontar as mesmas histórias. Não recrimino as refilmagens. Não creio que se trata de um sintoma malígno da falta de criatividade. Mas dessa necessidade de fazer aquele reward no tanto que apreendemos desde que a humanidade resolveu se tornar globalizada.

Seria uma prisão conviver só com o novo. Assim como é obtuso viver só de memórias. Como diz Maude: "O mundo gosta tanto de gaiolas". Abandonemos, portanto, nossas amarras! Nós, da geração do LP (que está de volta nas prateleiras, que doideira!), a geração da intersecção, talvez sejamos os mais abençoados pelas infinitas oportunidades de desfrutar da sincronicidade referencial desses tempos pós-matrix.

Confesso que não sei se tudo o que acabo de escrever tem algum sentido, mas é isso que dá assistir "Ensina-me a viver" e "Tron - The Legacy" num intervalo de 24 horas. Felizes sincronias pra vocês!!

Comentários

  1. Há uma montagem teatral de "Ensina-me a viver" com a Glória Menezes no principal papel feminino. Sobre refilmagens, apesar de termos opiniões diferentes $obre o$ motivo$ que levam o$ e$tudio$ a fazê-la$, vi a nova versão de Karatê Kid e gostei.

    Valdeir Jr.

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  2. Olá Juniores,

    Cê acha que eu não vi a peça? Claro!!!;) Não gosto muito da Glória Menezes, mas foi legal. Fiel ao espírito do filme.

    Quanto às refilmagens, quis acreditar que elas existem para nos dar uma possibilidade de rever conceitos e histórias que nos emocionaram. E que acontecem para trazer mais discernimento para essas novas gerações. É uma crença pueril, concordo. Mas estamos no fim do ano e tudo é milagre numa hora dessas!!;)

    Abreijos,

    Lulupisces

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  3. Querida Luzinha,

    Melhor coisa é reviver os bons momentos dos anos 70, 80 e 90 ao lado de um filho 2000!...rs... aqui em casa, no quesito filmes, já rolaram, entre outros:

    Caça fantasmas
    Alien, o oitavo passageiro
    De volta para o futuro
    Gremlins
    A fantástica fábrica de chocolates (o de 1971 inclusive)
    Edward mãos de tesoura
    Karatê Kid, course...
    Quero ser grande
    Filadélfia
    Forestgump
    Entrevista com o vampiro
    A família Addams
    Episódios da série "Amazing histories"...
    Os próximos filmes serão "Top Gun","Depois de horas" e "As sete faces do Dr Lao", este é de 64! (só mesmo baixando da internet). E vou ver se acho "Harold & Maude" também...inesquecível!

    Beijos,

    Patty

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