Programa Mulherzinha ao quadrado

(Para não dizer à quinta potência) é assistir “Comer, Rezar, Amar” no cinema. Desde a fila, dá para perceber a mulherada em polvorosa. Havia uns cinco projetos de perua na minha frente para comprar o ingresso. Resultado: levei mais de meia hora porque as meninas não sabiam se passavam batom, se conferiam o visual uma das outras de cima abaixo ou se encontravam o dinheiro na carteira.

Mas eu também estava lá, junto com um grupo heterogêneo de peruas uma década e meia à frente. Mulheres bem resolvidas e descoladas que se encontram para fazer um programa semanal cor-de-rosa. Pedi para entrar na lista na cara dura (temos uma amiga em comum) e elas simpaticamente me incluíram, convidando-me para o programa da semana: ver o filme da Julia Roberts.

Pois é, Julia Roberts continua sendo um grande chamariz. O sorriso largo da estrela é irresistível, mas, nesse filme, ela só sabe mesmo é chorar. Julia estava mais para Regina Duarte na época de “namoradinha do Brasil”, sofredora inveterada dos folhetins a debulhar lágrimas do início ao fim da história. Assim fez a atriz na pele de Liz Gilbert, a escritora do livro homônimo que é best seller absoluto do mulherio mundo afora.

Confesso que comecei a ler o livro depois de enorme insistência da esposa do meu sobrinho. Estava no Rio e achei que poderia dar pé ler algo bobo, leve e praiano. Gostei. Não é fútil e besta como pensei que fosse. Principalmente a fase do comer e do rezar. Depois, encontrei outras mulheres que concordaram comigo que a parte do amar, que, a princípio, deveria ser a mais “interessante”, acaba sendo a mais sem graça.

No filme, a viagem de Liz atrás de algo “pra chamar de seu” ficou toda sem tempero. Na Itália, copiou-se o clichê dos clichês: os italianos são apenas barulho, espaghetti e Coliseu.  No livro, ela consegue ir além, passando de uma simples turistona convencional norteamericana para alguém que capta as nuances culturais do país.

Na Índia, o filme deixa a sensação de que Liz-Julia não entendeu nada do que o ashram podia lhe oferecer. E não é verdade. A parte do rezar no livro é a mais intensa, na qual ela sofre as maiores transformações. E não poderia ser diferente. Imagina passar três meses enfiada num espaço destinado ao despojamento e à iluminação espiritual após viver a vida toda como uma princesa classe média alta de NY?

Entretanto, ao contrário do livro, a parte do amar, no filme, foi a mais legal. Tudo por causa do Ketut (o guru balinense) e, óbvio, do Javier Bardem. Dois atores que deram brilho à narrativa. Cor que faltou à protagonista, que só sabia encharcar a tela a cada take. Não senti isso no livro: esse vale de lágrimas.

Acho que para as plateias de outros países, Bardem deve convencer como brasileiro. Mas, pra gente, fica com jeito de paródia. Um humorista tentando falar português de Portugal torto. Todavia, o cara é bom ator e seu carisma e sex appeal são incontestáveis.

Hadi Subiyanto, que faz o papel do guru desdentado, também arrebenta em simpatia. Quem não queria ter um mestre espiritual daqueles? Fica fácil mudar de postura de vida com alguém que te ensina a sorrir não apenas com o rosto, mas com o fígado. Venho tentando a técnica desde que acabei de ler o livro e um dia eu chego lá!

E não posso deixar de mencionar a participação mais que especial de Richard Jenkins, o excelente ator que interpreta o amigo texano de Liz-Julia na Índia. O único momento que realmente emociona no filme cabe a ele, um monstro na arte de atuar, conseguindo extrair maravilhas de pequenos papéis.

No mais, o filme é mezzo-mezzo. 133 minutos sem clímax. Uma trilha sonora bastante óbvia (principalmente na escolha fácil da “bossavelhanova” para ambientar Bardem-Felipe). No fim da noite, o que mais valeu a pena foi ter saído com essa galera feminina debochada e suave. Mulheres brincalhonas que mudaram o título da película para “Comer, Rezar, Trepar”. Porque disso as mulheres entendem: encontros, fofocas e bobagens light, para não pesar na alma.

E depois a gente lê por aí que é difícil a “arte de ser mulher”. Quem disse?

Comentários

  1. HAHAHAHA, adorei a sua crítica do filme, já fiquei com mais tesão de vê-lo... confesso que, depois de ler o livro (que vc descreveu à perfeição), somente a imagem do Javier no cartaz é que me atraiu, pois nunca curti a Júlia Roberts mesmo. E nem lembrei que o papel dele é de um brasieiro... Acho que é pq no livro isso foi uma das coisas que ficaram mais mal resolvidas pra mim. Aquele personagem, ainda por cima gaúcho se não me engano, está muito pouco convincente. Somente o gostosão do Javier para superar as distâncias culturais mesmo... Parabéns pelo blog, garota!! bjitos Isa

    ResponderExcluir
  2. Parabéns pelo blog! Finalmente.
    Acho que não vale a comparação entre o livro e o filme. Afinal são duas obras distintas. Depois de escrita, a obra é nossa, viajamos e vemos o que quisermos. Depois de filmada, quem extraiu as visões do livro foi uma terceira pessoa, já nos chega uma visão pronta. Mas não menos interessante. Gostei do filme, não gostei da atuação de Barden (sem contar o portuñol é claro). Levo o gostinho das mudanças possíveis e descobertas interiores.
    Besos y seguiré por aqui con Eleanor Roosevelt: " Yesterday is history, tomorrow is mystery, today is a gift."
    Ale

    ResponderExcluir
  3. Meus amigos queridos,

    obrigada por movimentar esse blog com suas opiniões e também com as visitas, mesmo que não comentadas.

    Também acho que o filme é uma "releitura" (palavra pimba) do livro e não precisa ser totalmente fiel à história. Mas a adaptação não precisava ter sido tão rasinha...Entretanto foi um programa legal. Gostei do passatempo. A atuação do Bardem foi no tom do filme: mediana. Eu gostei da aparência dele, é claro.;)

    Abraços e continuem por aqui,

    Lulu

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

Ousadia

Presentim de Natal

Horizonte de Eventos