Conhecer para reconhecer a si mesmo

A curiosidade leva por um lado a escutar às portas
e por outro a descobrir a América.

Eça de Queiroz

Viajar é a melhor maneira de você gastar o seu dinheiro. Depois da aquisição do seu lar doce lar, é claro. (Não quero incentivar ninguém a viver eternamente pagando aluguel). Mas, como eu ia dizendo, não tem investimento mais saudável do que conhecer novos lugares. É um verdadeiro reset na cabeça (roubei a analogia de uma amiga).

Viajar para Portugal, então, eleva o seu gasto à categoria de lucro certo. Pena que muitos brasileiros chegam a visitar toda a Europa, mas nunca põem o pé na terrinha. Entretanto, não sabem o que perdem em História, beleza e compreensão da nossa alma lusa. Porque, quer queiramos ou não, somos essencialmente portugueses.

Praça do Comércio - Lisboa
Quando pisei em Lisboa, descobri o quanto era ignorante em relação ao país que nos colonizou. Falha do nosso sistema educacional que privilegia a queda do império Romano, o estudo da Mesopotâmia e dos egípcios e até a colonização dos Estados Unidos da América em detrimento da formação do império português.

Fiquei a me perguntar por que aprendemos tudo sobre o vale dos rios Tigre e Eufrates e nada sobre o vale do Alcoa e Baça. Tcharam! De repente me dei conta que a cidadezinha lá da Bahia foi batizada como a mesma alcunha da cidadezinha portuguesa que nasceu em torno de um mosteiro, belíssimo, por sinal.

Nesse mosteiro de babar, assim como são todos os outros de Portugal, estão enterrados em túmulos deslumbrantes, D. Pedro I (não o que veio para o Brasil, pois esse, na verdade era D. Pedro IV, “O Libertador”, mas recebeu o título de I aqui porque foi o 1º Pedro em solo brasilis). Outra descoberta básica da nossa história que não foi citada nas aulas de História do ginásio.

Túmulo de D. Pedro I - Alcobaça
De volta do hipertexto, estão enterrados D. Pedro I, “O Justiceiro” e sua amada imortal, Inês de Castro. Nunca entendi direito aquela expressão popular: “agora Inês é morta”. De onde surgiu? Dessa história de amor com toques macabros dignos de Edgar Allan Poe.

Inês foi amante de Pedro I e teve quatro filhos com ele. Tudo estava a mil maravilhas, mas o pai de Pedro I mandou assassinar a mãe dos netos numa jogada política. Ao virar rei, o inconsolável Pedro I mandou desenterrar Inês, vesti-la com trajes de rainha e postou-a no trono, obrigando toda a população a beijar sua mão apodrecida (ou já seria esquelética?). Irado!

D. Afonso Henriques e o Castelo de Guimarães
E assim é visitar Portugal: aula de História a céu aberto. Portugal é um museu vivo da nossa ancestralidade. Não tinha nem ideia de que a primeira capital portuguesa foi a cidade de Guimarães, onde Dom Afonso Henriques, “O Conquistador”, derrotou os mouros com a mão na massa, ou melhor, na espada, lutando com sua armadura de cavaleiro medieval para fundar o império português.

Monumento aos Descobrimentos - Lisboa
A beleza que a gente vê em forma de castelos, claustros e igrejas já estava erguida entre os anos 1.100 e 1.200. A descoberta do Brasil foi consequência natural de um império que acumulou riqueza, conhecimento e ousadia. Todavia, a maior parte dos brasileiros insiste em manter o preconceito de colonizado-martirizado em relação a Portugal.

Museu do Azulejo
Ok, eles ficaram mais ricos ainda com o pau-brasil e outras madeiras brasileiras. Dá uma pontada de dor e raiva saber que mais de 25 mil quilos de ouro deixaram nossas minas para embelezar altares alhures. Porém, não dá para esquecer que falamos português, que nossos azulejos são os azulejos herdados dos árabes que, por sua vez, foram absorvidos pela realeza lusa.

Fiquei encantada com tanto que aprendi e, em igual medida, assustada com o tanto que eu não sabia. Voltei com inúmeras descobertas dentro de mim. Meu cérebro parecia o HAL 9000, pensando sem permissão a armazenar 400 mil megabites de memórias inesquecíveis.

Portugal é nosso alicerce cultural, gastronômico, genético e linguístico. Por isso, urge que se faça uma revisão dos conteúdos programáticos obrigatórios no ensino fundamental. É legal aprender montes aos 40, contudo, mais interessante seria descobrir o descobridor desde a infância. Conhecer para reconhecer a si mesmo. O reverso do descobrimento pode nos colocar mais perto da nação a qual sonhamos construir.

Esse é o primeiro da série Portugal. Não perca os outros!

Comentários

  1. Tem que voltar, querida! Tem muita coisa mesmo pra conhecer ... O Marinho bem sabe!

    Júnia

    ResponderExcluir
  2. Que texto incrível, Lu! Quero voltar a Portugal com mais tempo. Dei só uma passada por lá e já me encantei e vi que eu era uma dessas pessoas cheia de preconceito e que não sabia de nada sobre o País!

    ResponderExcluir
  3. Gostei do texto Especialmente do Inés já está morta! Hehehe Que coisa!

    Ceres Santoro

    ResponderExcluir
  4. Também não conhecia a história da Inês! Você escreve demais! Adoro o seu blog. Você coloca a alma em seus textos, show! Sou fã de carteirinha :) Presidente do fã clube!

    Claudia

    ResponderExcluir
  5. Estado mais antigo do mundo - quase 900 anos ... Dá-lhe Portugal !!!

    Mario

    ResponderExcluir
  6. Levei! ;)

    Andrea Zoroastro

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

Ousadia

Presentim de Natal

Horizonte de Eventos