Isso é um show, não um assalto

Uma das coisas mais legais de se ter filhos é poder pagar mico em nome da maternidade, curtindo que nem criança os prazeres infantis. Sábado passado fiz uma viagem de 200 Km para assistir ao show do grupo Palavra Cantada. Faria outra, pois valeu todo o calor intenso de Goiânia para conferir, ao vivo, o talento sem igual dessa dupla: Sandra Peres e Paulo Tatit.

Os caras arrebentam, acompanhados de um grupo de jovens bem jovens que fazem de tudo: tocam percussão, soltam a voz no backing vocal, atuam, dançam....Sandra e Paulo, que parecem conservados em formol (os caras não envelhecem), são coroas que não têm medo de serem meninos. A verdadeira fonte da juventude, mais poderosa do que qualquer botox.

É de dar orgulho ao Brasil ter um pessoal desses fazendo trabalho de altíssima qualidade para a galerinha. São músicas de letras e melodias impecáveis. Som de primeira, com mensagens legais, sem ser enjoadas ou didáticas. A intenção é falar de assuntos importantes sem “lição de moral”.

Dei alguns CDs do Palavra Cantada para os meus amigos estrangeiros com filhos pequenos. O povo pirou na batatinha! Eles ficaram fascinados. Sabine, alemã, disse que não há nada parecido na terra de Goethe para crianças. Fui obrigada a traduzir ao pé da letra algumas das composições, mas me senti cometendo um assassinato musical. Não sei inglês ao ponto de elaborar uma tradução decente de todo o lirismo e metáforas contidos nas canções. Mas eles se deram por satisfeitos quando expliquei o que significava “Eu vou te cutucar neném, te cutucar”.

Mas voltando ao show da capital goiana, tudo foi bem legal, principalmente o preço. Quando o Palavra Cantada vier tocar em Brasília, a produção provavelmente cobrará uns R$100 (meia entrada)! Paguei R$30, para ficar na área vip, mandando beijinhos e cantando a plenos pulmões, bem coladinha ao palco. Detalhe: com direito a cachorro-quente, pipoca, “refri” e água à vontade. Sem falar nos brinquedos grátis que estavam na área externa do Goiânia Arena à disposição da gurizada.

Havia filas, é claro, mas meu filho montou no touro mecânico (algumas mamães “miqueiras” também, o que garantiu o deleite dos expectadores) e pulou na cama elástica, além de jogar nos fliperamas. Uma algazarra só. O local era amplo, aliviando a barra da multidão.

Aqui em Brasília, a gente não recebe nada além do espetáculo mesmo e com som ruim, pois aquele Centro de Convenções Ulisses Guimarães é o fim da picada para abrigar qualquer show. O Nilson Nelson também tem péssima acústica. Na Villa Lobos, é maldade colocar duas mil crianças para detonar o carpete. Sem falar que um concerto de rock ali seria o mesmo que levar um elefante para passear numa loja de cristais.

Só nos sobra o CCBB, que tem proposta variada, preços justos e qualidade acima da média. Porém, comprar ingresso naquela lonjura é de doer. Quem é que tem disponibilidade para “viajar” até lá só para adquirir um lugar na plateia no meio da semana? A) Aposentados; B) estudantes da UnB; C) Coça-sacos em geral.

Se fôssemos uma comunidade unida e consciente, deveríamos boicotar esses shows de preços exorbitantes. Ah, e faríamos passeatas contra os valores aviltantes dos ingressos de cinema também. Corre a lenda que o próprio Chico Buarque disse que não pagaria o valor que cobraram pela apresentação dele por aqui. Mas em Brasília parece que o povo gosta de pagar muito caro por tudo. A maior parte não reclama e deve achar até chique.

Só não entendo o porquê de os brasilienses ficarem zangados quando são chamados de habitantes da Ilha da Fantasia. “Sr. Roarke, o avião, o avião!” (qualquer semelhança não deve ser mera coincidência)

Comentários

  1. Com certeza tem muita gente ganhando com preços abusivos de ingressos, de produtores a patrocinadores. E já melhorou, há 20 anos os ingressos eram muito mais caros e nós não tínhamos opções locais, como temos hoje! Vamos criar o movimento SÓ VOU SE O PREÇO FOR JUSTO. Pensei em acrescentar E AS CONDIÇÕES DIGNAS, mas fiquei com medo de não ir mais a lugar algum.

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  2. Eu concordo que o preço dos shows que chegam a Brasília é realmente um insulto, mas acho que é um pouco injusto dizer que é porque gostamos de pagar caro ou achamos chique, excetuando-se as peruas de plantão que existem em qualquer lugar. Acho que é muito mais um fator histórico, antes não tínhamos opção nenhuma e pagávamos o que fosse pra conseguir assitir a um bom show na cidade. Os produtores certamente perceberam isso. Como você bem disse, não somos nada organizados e não conseguimos nos mobilizar pra melhorar a situação, daí ficamos escravos pra sempre.

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  3. Puxa, que legal! Estou percebendo que, aos pouquinhos, a galera está acessando esse espaço e deixando seus comentários. Sejam bem-vindos!!
    Pois é, não é preciso ficar "escravo" para sempre. Agora que já entramos na rota de vários shows e exposições, podemos começar uma tentativa de levante.:)

    Mas se continuarmos a lotar o espetáculo, mesmo com preços tão diferentes dos praticados em outras cidades, os produtores não vão parar.

    Sei que eles alegam que os shows aqui não ficam em cartaz uma temporada inteira, mas não estamos falando dos preços praticados no Rio e em São Paulo. Poderíamos, ao menos, pagar o que se paga em Goiânia e outras capitais do Nordeste, onde também não há "temporadas".

    Abraços e sigamos "ao infinito e além"!!!

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