Toda prosa






- Filho, terminou “Presos no Paraíso” (romance policial de Carlos Marcelo, ambientado em Fernando de Noronha)?

- Sim, faz um tempinho.

- Gostou? 

- Sim.

- E agora, vai ler o quê?

- Tô lendo o seu livro.

Na intensidade dos últimos dias, imersa na entrega emocional e física extenuantes do lançamento de “As Desventuras de uma Mulher que levou um Susto e Sobreviveu”, não havia reparado na beleza de presenciar um filho conhecendo outro filho, ou melhor, uma filha. Explico.

Quando a editora Confraria do Vento me enviou a sugestão de capa (criada a partir de uma foto minha, registro do Museu de Paleontologia de Santana do Cariri/CE), achei tudo muito elegante e sóbrio, ou seja, nada a ver comigo, a representante da estampa em profusão. Pedi aos editores que incluíssem alguma cor naquela proposta. “O título podia ser em vermelho ou noutra cor alegre”, sugeri.

Eles testaram toda a paleta de tonalidades possíveis e concluíram que o título não ficaria legal diferente do que estava, mas decidiram inserir folhas rosa-choque (a que ficou mais bonita, na opinião da editora Karla Melo), no miolo do livro.

Entretanto, o mais interessante dessa história é que durante o processo que rolava lá no Rio de Janeiro, a amada amiga nave-mãe Marisa, carioca, mas moradora de Brasília, sonhou com o meu livro, e ele tinha a capa rosa, portanto seria uma obra, “a filha que você ainda não tem”, brincou. Naquele momento, nem Marisa nem eu sabíamos que a Confraria do Vento iria escolher o pink como a cor que eu gostaria de ver.

E eis que vem o e-mail da editora com a nova capa e seu rosa em abundância. Conexões telúricas bacanas que seriam narradas na sessão de autógrafos, mas que a presença maciça de vocês, queridos amigos e familiares, não deixou. Era fila demais, afeto demais e tempo de menos. 

Falando no evento mágico, uma outra amiga, Norma, esposa do estimado decano da Física da UnB, prof. Hugo, disse ao pé da mesa: “Seus filhos estão super orgulhosos de você hoje, sabia? Eles não param de lhe rodear e de sorrir”.

Puxa, foi impactante. Não teria percebido diante da loucura de dedicatórias, de abraços e de poses para fotos. Talvez por ela também ser casada com um físico bem sucedido, acostumado aos artigos publicados e à deferência da academia, saiba como é complicado se mostrar em pé de igualdade para os filhos.

Bernardo tem seus congressos, seu nome estampado em palestras e em revistas especializadas. Trabalhou na IBM em dois períodos, nos EUA, e relaciona-se com pessoas do mundo todo num nível que poucas pessoas no Brasil imaginam. Mais recentemente, foi convidado para participar de uma seleção de emprego na Google, gente! Os meninos crescem à imagem do pai cabeção. Reconhecem-no como um cientista realizado.

Da minha parte, o que Tomás e Rômulo teriam de palpável para aferir sobre a capacidade intelectual e profissional da mãe, além das maluquices de uma mulher que escreve num blog sem repercussão? De fato, uma luta inglória, pois não é segredo para ninguém que não gosto de ser servidora pública. Minha atuação como jornalista e publicitária em revistas e jornais do mercado ficaram lá atrás, muito antes do nascimento dos dois. Os projetos interessantes que toquei no STJ não ultrapassam as camadas de concreto projetadas por Niemeyer.

De repente, percebi que a obra, a filha, havia se tornado ainda mais importante para mim, pois me transformava numa mulher hábil e conectada ao mundo de hoje aos olhos dos meus filhos. No dia seguinte ao lançamento, descobri que cada um levou seu próprio exemplar para a escola. Empoderamento, expressão enjoada e gasta, me pegou de jeito. 







Comentários

  1. Mais uma herança que vc deixa para seus filhos!!😍⚘

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  2. Lindo e gratificante demais esse orgulho e respeito de seus filhos e marido, pois o Bernardo tbm era só orgulho no lançamento!!!
    E esse orgulho e alegria foi uma onda contagiante, que uniu a todos naquele dia. Familiares, amigos, admiradores...
    O livro, a "filha" tão visceral e uterina, brotou em meio aos tons cinzas e rosa encorpado, com a densidade e ao mesmo tempo, leveza e poesia, do que escreve, do que jorra com profusão, de dentro de seu ser...
    Dia mágico, redentor, como bem definiu você...
    Siga em frente, irmã.
    É delicioso ler o que escreve tão bem...

    Marilena Holanda

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  3. Lu, estou adorando o livro!!!! Até uma RNM vira conto!!! Um vôo ! Amei!!!!! E segue a produção...

    Gabriella Santana

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  4. Fico muito feliz em ver sua realização. Há vinte anos te escutei falar que seu sonho era escrever um livro... agora sim, um livro com muita cara de Luciana, criativa, desbravadora, confiante. Tudo de bom!

    Catarina França

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  5. Que texto, Lu!
    Fiquei aqui toda arrepiada! É engraçado isso da gente se posicionar apenas como mãe perante nossos filhos e esquecemos que eles também nos veem como mulheres!
    Sempre tive muito orgulho do Léo, de tudo que ele se tornou e vem se tornando, mas nunca parei pra analisar que isso é obra minha, nossa, de nós mulheres fortes e destemidas, e quando Léo me disse uma única vez (e mais que suficiente) que tinha um orgulho danado de mim eu passei a enxergar que sim, somos exemplos concretos!
    Coisa boa é ser orgulho para os filhos! Seja em casa ou fora dela!
    Mulheres podem ser o que elas quiserem! E que tenhamos orgulho disso!
    Obrigada pelo texto.

    Juliana Cruz

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  6. Ah, como sempre maravilhosa!�� pena que não tive a oportunidade de conversar com os meninos nem com o Bernardo!

    Fátima Venceslau

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  7. Lindo texto, Luciana!
    Lunde

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  8. Ah, que boniteza!
    Marianna

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  9. Chorei!

    Bianca Duqueviz

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  10. Que bacana a trajetória dessa filha, Lu. Parabéns!

    Carlos de Lannoy

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  11. muito bom dar de cara com palavras bem escritas. Sucesso.
    Ana Paula

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  12. Ler pra esse príncipe virou um hábito, um vício! Ler pra Tomás faz parte do dia a dia desse ser humano admirável!

    Leila Brandão

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  13. Que bênção!
    Admiro muito você, prima, e a sua linda família.

    Mônica Martins

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  14. Loo, é verdade o que Norma disse, os olhos dos meninos brilhavam e os sorrisos eram imensos. E acho que eles queriam ser reconhecidos ao lado da escritora celebrada, "ei, sou obra viva dela!".
    Ah, com nave-mãe você realmente se superou... Olha, esse sonho me eleva ao posto de uma das madrinhas da Pinkie, viu?

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  15. Parabéns para você e para Bernardo.

    Andrea Guedes

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  16. Lindo e gratificante demais esse orgulho e respeito de seus filhos e marido, pois o Bernardo tbm era só orgulho no lançamento!!!
    E esse orgulho e alegria foi uma onda contagiante, que uniu a todos naquele dia. Familiares, amigos, admiradores...
    O livro, a "filha" tão visceral e uterina, brotou em meio aos tons cinzas e rosa encorpado, com a densidade e ao mesmo tempo, leveza e poesia, do que escreve, do que jorra com profusão, de dentro de seu ser...
    Dia mágico, redentor, como bem definiu você...
    Siga em frente, irmã.
    É delicioso ler o que escreve tão bem...

    Marilena Holanda

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  17. Oi Luciana, estou com um pé na estribeira (dessa vez para Argentina), porém comecei a leitura da sua filha.
    Aquele dia tinha retirado um cisto da perna e por isso me encontrava sentada, nas tuas costas e vi tudo como se vê um filme.
    Era interessante observar as pessoas devagar e foi por isso que tive a certeza do que estava acontecendo, teus filhos tinham expressão corporal (estou dando uma de psicóloga) de quem está satisfeito. Te olhavam assinar, também recebiam os afetos dos teus amigos mais próximos, se afastavam e, daqui a pouco, estavam perto, muito perto de você, olhando e quase falando como o Chico Anysio : minha garota!!!
    Foi bonito ver.
    Que se cuide o Bernardo, hein?
    Teu livro tem cheiros, você consegue transmiti-los, desperta a gula (adoro os quitutes brasileiros), entra no túnel do tempo e transporta para cenários muito pitorescos, alguns desconhecidos para mim, que não nasci aqui, e estou gostando porque tem algo a ver com um ditado usado na Argentina: bueno, se breve, dos veces bueno. Não quero ser enjoativa, mas me lembro do Solienitsin, descrevendo a subida de um balde de água em um certo contexto. Prêmio Nobel, mas esse balde demorou muito, kkkk!

    Avante, sempre avante, garota!
    Bj,

    Norma.

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  18. Um alimento intelectual este seu texto, Luciana! O "empoderamento" de uma mãe-escritora, muito superior a uma servidora pública, embora muito consciente! Muito bom partilhar de momentos como este em sua caminhada. E vamos ao próximo!

    Socorro Melo

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