Bravo!




“Menos argumento e mais trabalho”, ordena o horóscopo de hoje. E se o argumento for a essência do trabalho, como é que fica? Quanto menos argumento um escritor tem, menos ele escreve, sô! Aí o marido vai esnobar: tá vendo, zodíaco é bobagem. Mas bobagem divertida, sem pretensão, já nasce perdoada, marido! 

Semana de emoções artísticas. Ontem (11 de março de 2014), a Escola de Música de Brasília (EMB) fez 40 anos. Não recordo a primeira vez que pus meus pés naqueles corredores musicais, porém deve ter sido em tenra idade. Minha irmã é nove anos mais velha do que eu e entrou para a instituição ainda criança. Então, posso concluir que quase vim ao mundo com os primeiros acordes da EMB... Pelo menos ao mundo dos instrumentos, da Arte. 

A Escola de Música de Brasília foi o meu primeiro contato com o que há de mais belo numa sociedade civilizada. Levino de Alcântara, fundador da EMB, costumava dizer que dificilmente uma criança exposta ao poder da música se transformaria em assaltante ou assassino. Concordo. A Escola de Música é pública e democrática; utopia que resiste com auditórios sem ar-condicionado, poltronas quebradas, mato alto. Sinfonia dissonante que produz talentos de sobra, apesar de você, Estado mentecapto! 

Quem sente um instrumento nas mãos e desvenda seus mistérios nunca mais é o mesmo... Para o bem, claro. Vejo meus filhos, agora encantados com as primeiras aulas de violão. Os olhinhos faiscando... Dedinhos lépidos puxando as cordas com desajeito e o prazer indescritível de fazer sair, daquela caixa acústica, um som que seja parecido com música! 

Ontem, fiquei de cara com a orquestra no Concerto de Gala. Vi a decana, pianista idosa com as mãos alquebradas, tortas e manchadas, ainda tocar com devoção. Os dedos não obedecem mais ao cérebro, todavia encantam. Vi a compenetração em cada violinista. O ardor no trompete. A docilidade dos flautistas e o suor empapando a camisa do maestro. Vi aquele organismo vivo sem microscópio, pulsando a um metro de mim. Quis mergulhar nele. Assim como Rômulo, ao ouvir a 5ª Sinfonia de Beethoven: “quero entrar dentro dessa música, mamãe”! 

Aposso-me da Escola de Música de Brasília como se ela me pertencesse. Como se musicista fosse. Finjo tão bem que tem gente que jura que toco alguma coisa quando sou apenas uma groupie. Só queria ser como eles e estar no meio deles: deuses. Ainda não sei ao certo por qual instrumento sou mais apaixonada: piano ou violoncelo. Ou tudo. Só queria me sentir parte daquilo todos os dias: partituras e ensaios. 

Mas coube à minha irmã mais velha saber como é bom tocar um instrumento. Ela tocava dois: clarineta e flauta transversal. Tinha ambos em casa, escondidos dos meus olhos ávidos em caixinhas pretas forradas de veludo. Joias. Se não me engano, já contei disso por aqui. 

Recentemente, nem tão recente assim, a EMB entrou na minha vida novamente. A sobrinha do meu marido ingressou na escola aos sete anos, como tantas garotas e garotos fazem por sorteio. E lá descobriu sua vocação. O melhor presente que eu poderia receber é pavonear aos quatro ventos: eu tenho uma sobrinha harpista! Projeção pura. Orgulho gigante. 

Ironia é pensar que minha irmã mais velha, sempre tão ressentida pela chegada daquela que lhe usurpou o trono de caçula, não tenha ideia de que sou eu quem morro de ciúmes. Para mim, ela é eterna soberana no templo da Arte que mais admiro e que jamais alcançarei.



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