Visse?

Há anos venho alimentando a vontade de conhecer Recife e Olinda. Cidades ligadas a tanta gente bacana: Clarice Lispector, João Cabral de Melo Neto, Chico Science, Lenine, Antônio Nóbrega, Cristovam Buarque, Francisco Brennand... No meu imaginário, essas cidades-irmãs sempre ocuparam um lugar de destaque. Só podiam ser muito especiais, celeiros febris do que de melhor a cultura brasileira pode produzir.
Como toda grande expectativa traz o seu contrário, a frustração, não poderia ter sido diferente dessa vez. Recife assusta um pouco. É feia. Caótica. Apocalíptica. "Da lama ao caos, do caos à lama, o homem roubado nunca se engana". Sei, eu já sabia que não podia ser bonita a Veneza brasileira devassada por Chico Science (ô, como faz falta!). Mas, ao vivo, a gente fica ainda mais estarrecida. É ruína pra todo lado, parece que todo o Recife antigo e a tal ilha de Santo Antônio são apenas a sombra de algo que já foi pulsante. E mete medo ficar de bobeira por ali. Não me senti confortável. Nem no Rio a sensação de insegurança me tomou daquele jeito.

A ruína e a pujança convivem sem pudores no Recife
Boa Viagem, ao contrário, é normal e asseadinha como Goiânia. Claro que não podemos deixar de nos chocar com Brasília Teimosa, a favela famosa do governo Lula e pavorosa sob qualquer ângulo. Mas quando uma favela pode ser bonita? Seria pedir demais. Boa Viagem é o cartão-postal de Recife no quesito "Brasil que cresce e aparece". Um calçadão animado, uma praia urbana simpática, restaurantes e bares descolados... Boa Viagem parece é outra cidade. Ou seja: Recife também tem um jeitão Frankstein, com suas facetas díspares ligadas por pontes sem glamour.
Entretanto, glamour, organização e beleza não faltam à Oficina Brennand, do ceramista Francisco. Uma viagem alucinada, regada à muita inspiração desse artista fantástico. E ao Instituto Ricardo Brennand, um dos acervos de armas medievais mais completos do mundo. Nunca imaginei algo tão europeu no Brasil. Imperdíveis ambos os passeios pelos legados desses irmãos-latifúndios. Que bom que a gente tem mecenas assim por aqui. Poderia ser contagioso, né?
O "Horror" maravilhoso-apocalíptico da Oficina Brennand
Vislumbres alucinógenos de Francisco
De volta à Idade Média no Castelo de Ricardo Brennand
Mas às vésperas do Carnaval a gente pode sentir porque Recife é Recife. A atmosfera é carregada de sentimentos foliões. Barraquinhas vendem fantasias tradicionais: arlequins, colombinas, palhaços... A decoração festiva abraça a cidade. Eu me sinto flechada definitivamente. O amor que tenho pelas nossas manifestações mais populares e singelas me torna uma apaixonada pelo rio-esgoto Capibaribe. O passeio de catamarã em suas águas é imperdível. Feito ao pôr-do-sol, nos brinda com o que é mais legítimo na capital pernambucana: sua paradoxal existência entre o lixo e luxo, entre a História e a pós-modernidade Apocalipse Now.
Ponte Maurício de Nassau em clima de Carnaval
E de Olinda, o que dizer? É a encarnação do Carnaval. Pisar suas ruinhas é incorporar centenas de anos de folia. Não é mais bonita que Ouro Preto, Parati ou Pirenópolis. Antiguinha, colonialzinha, igrejinhas... Um tanto mal-conservadas para um Patrimônio Cultural da Humanidade. Mas é berço do frevo, das marchas, do maracatú e dos caboclos de lança. É sangue na veia. É veneração. A dica que aprendemos ao acaso é essa: vá um ou dos fim-de-semanas antes da grande algazarra. Você brinca nos ensaios dos blocos com a mesma animação, sem multidão. Depois come tapioca-delícia de côco com leite condensado apreciando Recife lá de cima. Dali, ela até parece uma cidade em paz com sua esquizofrenia. 
Olinda é pura máscara!
 
Pra ninguém fazer feio na hora H, aulinha aberta

O som primordial dos brasileiros
Olinda, aqui - Recife, acolá: duas faces da mesma simpatia

O caboclinho assusta e encanta como Recife

Bêbada? Só de emoção...



Comentários

  1. É, acho Recife estranha. Eu costumo me ver facilmente morando em qualquer lugar, mas lá não. Agora, tem um monte de coisas que admiro. Isso que você falou, das manifestações populares, que são incríveis em um povo que ama seu pedaço de chão como nenhum outro (bem, talvez os gaúchos, mas não tenho certeza). Nem gosto de frevo, mas é incrível assistir a essa celebração da alegria que é o carnaval em Pernambuco. Comendo uma tapioca, então... A alegria só aumenta. Beijim, Débora

    ResponderExcluir
  2. Pois é... antagonismos tão brasileiros... beleza e feiúra, riqueza e pobreza. Mas eu não descartaria Recife não... Senti por Pernambuco, aí incluídas as duas cidades em questão, uma paixão renovada quando lá estive há dois anos. Praias lindas, cultura pra lá de interessante, muita coisa legal pra se fazer. Acho mesmo que se tivesse condições, passaria uns tempos por lá... agora, viver pro resto da vida, acho que só Brasília mesmo. Já tá na veia e nos olhos, fazer o quê?
    bjim
    Isa

    ResponderExcluir
  3. Luzinha, se depender dessa última foto aí diria que você já é praticamente uma Pernambucana, visse?

    O bom da vida é experimentar!

    Beijos,

    Patty

    ResponderExcluir
  4. Lu, vou imprimir as suas fotos que mostram as ruas enfeitadas para o carnaval em Recife e Olinda pro Rafa completar o trabalho de escola (oba!), que pede uma pesquisa sobre o carnaval nos quatro cantos do país e suas características em cada lugar.
    Eu já pulei o carnaval nas duas cidades há mais de 15 anos (ui!) e adorei!
    Obrigada pelos textos!!!!
    Beijo

    ResponderExcluir
  5. Lu: muito bons seus dois últimos textos, o de Recife e o do filme Cisne Negro.
    Boas colocações, avaliação honesta de tudo.

    Pena que, infelizmente, o Recife tem essas contradições sociais mesmo. De outra vez, espero que nos encontremos lá. Quem sabe eu não te levo, a vc e ao Bernardo, em alguns lugares bem bacanas e te ajudo a ficar com uma impressão mais bacana?

    Aliás, vc foi no Poço da Panela, bairro de artistas e escritores, super legal? Se não foi, vou mandar uns catálogos de lá para vc. Ainda bem que do que vc gostou, vc curtiu mesmo.

    Beijão querida. E saudades.
    Vamos marcar para nos encontrar.

    Hylda

    ResponderExcluir
  6. Queridos leitores,

    antes de mais nada, não "abri mão" de Recife. Apenas disse que a cidade é muito apocalíptica. Mas quem disse que eu não gosto disso? Eu adorei Recife!!! É feia pacas, mas pulsa, tem caráter, estilo, cultura para exportar, pessoas simpáticas e mais educadas que a média em se tratando do Nordeste.
    É preciso dizer também que eu não tive tempo de me aprofundar nas belezas e agruras pernambucanas. Foram apenas 10 dias e com dois meninos pequenos a tiracolo... Não pude fazer metade das coisas que gostaria de ter feito como, por exemplo, explorar um pouco mais o próprio Recife antigo.

    Portanto, I will be back!! E para passar um carnaval, é claro!!!! Fiquei com água na boca. Sei que vou me apaixonar ainda mais.

    Beijão e obrigada pelos comentários,

    Lulupisces.

    ResponderExcluir
  7. CLAUSIUS . UM GAUCHO QUE APRENDEU A AMAR O RECIFE E QUE MORA NO BAIRRO MAIS LINDO DO MUNDO : POÇO DA PANELA

    NESTE ENDEREÇO TEM UMA RECIFE QUE NÃO É PRA TURISTA !
    DUVIDO QUE NA CIDADE DE VOCÊS TENHA BAIRROS TÃO BELOS QUANTO ESTES ! SÓ FALEM DE UMNA CIDADE QUANDO A CONHECEREM PROFUNDAMENTE OK !!!!


    http://www.skyscrapercity.com/showthread.php?t=823926

    ResponderExcluir
  8. http://www.skyscrapercity.com/showthread.php?t=1780744


    link acerca de poço da panela


    de Clausius

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

Ousadia

Presentim de Natal

Horizonte de Eventos