O primeiro beijo dela

Recebo da minha amiga o relato entusiasmado e assustado sobre o primeiro beijo da filha. Filha que eu conheci criancinha, meiguinha, tímida de olhos imensos, capazes de sorver o mundo, assim como os da mãe. A menina, quem diria, já não é mais uma boneca de colo. "Ela só quer, só pensa em namorar..."

Emoção conflituosa essa... Sentir no peito que o filho está no seu caminho sem volta rumo à liberdade de escolha. Minha amiga está encantada e aterrorizada e com razão. Preocupada e deslumbrada com todo o direito. E se o menino for um panaca e ferir os sentimentos da filha? E se ela transar e engravidar? E se agora ela resolve que a vida é beijar na boca de vários caras diferentes toda a semana? E se? E se? E se?...

Tentei acalmá-la vendo lado o positivo da situação (logo eu, uma versão dark da Pollyana). Minha amada amiga de infância está vendo a infância da filha ir embora e precisava de consolo. Veja que coisa legal: ela tem uma garota que vai repartir essas intimidades com ela. Eu, que só tenho meninos, vou ficar a ver navios... Sem nada saber do que eles vão aprontar em suas vidas afetivas. A não ser que um deles resolva engravidar uma guria por aí (cruzes, que não aconteça, para o bem deles e das meninas). Mas, provavelmente, eu nunca saiba do primeiro beijo dos meus varões. Homens não fazem confidências.

Inevitável nesse hora recordar o meu primeiro beijo. O filme passando na cabeça... Quem me conhece há tempos sabe que foi com o Marco Antônio, meu primeiro amorzinho real. Estávamos sentados num banquinho da quadra 714 sul (quadra ao lado da minha, onde até hoje mora outra amiga de infância). Estava na casa dela, coração batendo nas têmporas. Marco Antônio iria me buscar ali para me acompanhar até em casa... Mesmo aos 14 anos, a gente sabe a senha. Não passaria daquela tarde o momento suspirado em um ano inteirinho de flerte.

E foi. Sensação simultânea de estranhamento e levitação. Os dois pombinhos lépidos voltando pela calçada de mãos dadas... Éramos namorados, afinal. Depois de passar o ano pensando que Marco Antônio (recifense, vejam outro bom motivo para conhecer Pernambuco) estava a fim da Mércia, a loirinha bonitinha que morava na mesma quadra dele, quadra chique, a 316 sul. Endereços do triângulo amoroso desenhado.

Eu me retorcia de ódio com as investidas daquela menina tão mais perfeita do que eu, uma adolescente de aparelho na boca ( coisa rara para a época) e casa feia. Mas Marco Antônio sempre parava um tempão lá na minha porta e a gente ficava conversando empuleirados sobre a cerca marrom. Papinho flertivo de portão no fim da aula... Perdia a hora do almoço, não importava o desconforto, apenas para estar com ele, flutuando de alegria. Hoje, a galerinha curte é baladinha fervente. É tudo diferente. Mas como aquele tempo era bom!

E como as voltas que a vida dá pegam a gente de surpresa na esquina, Marco Antônio veio parar no STJ. A gente se cruza pelos corredores e até já fez projetos de trabalho juntos, pois ele é da área de computação e eu, do site. Sempre que nos encontramos é um prazer! Os dois se abraçam e confirmam o carinho legítimo de um pelo outro. Marco Antônio foi convidado de honra do meu casório. E eu também não perdi o dele. Um barato!

Então, fico aqui na torcida para que a doce filha da minha amiga tenha essa memória afetiva bacana sobre o primeiro beijo e amor da vida dela. Acredito que o desabrochar  sadio da sexualidade vai fazer a diferença lá na frente, no momento em que ela for escolher a pessoa com quem vai compartilhar sua história de mulher.

Hoje tenho conseciência de que meus namoros que deram certo, incluindo aí o meu casamento, têm um quê de Marco Antônio. O amor inicial pautou todas as outras escolhas. Não desviei minha rota dos  homens altos, magros, inteligentes, tímidos, pouco convencionais... Caras irreverentes, mas sem um traço de malandragem ou falta de caráter. Marco Antônio, por exemplo, se casou com a namorada que conheceu no segundo grau.

Meu carinho para a pequena que está descobrindo a paixão. E para a minha amiga: calma, é chegada a hora!

Comentários

  1. Muito bacana Lu, sabe que o meu filminho passou também? O primeiro beijo, primeiro namoro, primeira paixão, frio na barriga...saudades...
    beijo...Namastê!
    Cynthia

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  2. Querida Luzinha,

    A menina do primeiro beijo acaba de ler a sua crônica! Entre risinhos e identificações mil com uma moça que já foi também uma menina do primeiro beijo, ela se mostrou envolvida com a leitura... e gostou muito! E eu, fiquei emocionada. Adorei! Obrigada! Você transformou esse momento em palavras de forma tão delicada que o tornou ainda mais especial...

    Beijos amorosos,

    Patty

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  3. Ah é, já ia me esquecendo: não vou escapar de relatar aqui o meu primeiro beijo, que foi meio, digamos, desastrado... estava eu, no alto dos meus 13 anos, durante
    uma noite de chuva fina, toda arrumadinha e me sentindo muito charmosa com um boné, que compunha o meu visual "gatinha", rs... então de repente eu já estava ali,
    na frente daquele menino (o beijante). Eu estava caidinha por ele, mas o beijo foi no susto, não estava planejado. Estávamos conversando e quando ficamos em silêncio,
    ele aproveitou a chance... lascou o beijo! O que posso dizer é que eu ainda estava no "prefácio" e ele já sapecou um beijo tipo "the end", entende? Profissional! Caramba,
    fiquei tão assustada que saí correndo imediatamente, acredita? É isso mesmo, corri em disparada pela rua e só parei na porta da minha casa.... O beijante deve ter ficado
    com trauma né, deve ter pensado que beijava mal pacas prá eu ter tido essa reação! rs.... Pois é Luzinha, infelizmente meu beijo não foi nem romântico nem bonito como
    o seu foi, mas ao menos foi engraçado né, por causa da situação toda... e por isso ficou na memória...

    Beijos,

    Patty

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  4. Minha amiga Luciana...
    Eu só fico aqui, a pensar: Como haverá de ser com a minha pequena Ana Olivia...
    Terei eu cabeça pra levar numa boa?
    Sei lá.

    Um beijo,
    Paulo.

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  5. Oi Lu,

    Lendo o seu texto me fez lembrar do meu primeiro beijo e de imaginar o primeiro beijo das minhas filhas, espero eu que esse dia ainda esteja longe de chegar. Voltando ao meu primeiro beijo, aconteceu a noite; atras de uma banca de jornal de frente para o mar na Praia Grande. Eu conheci o Eduardo na praia naquele mesmo dia, ele estava trabalhando na barraquinha que vendia bebidas geladas e salgadinhos.
    Eduardo era muito bonito - 16 anos, alto, olhos verdes, loiro de pele queimada.
    Entao foi assim, ele lascou um beijo daqueles do tipo profissional. Eu so sei que eu nao dormi bem naquela noite e no dia seguinte eu completei 15 anos.

    Um beijo,
    Evelyn

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  6. Meus caríssimos comentadores,

    muito legal esse compartilhar de memórias tão subjetivas e íntimas! Obrigada por esse presente!

    Beijão,

    Lulupisces.

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