Vale Tudo?




Tenho uma teoria: o Brasil já está num estágio evolutivo muito melhor do que o Congresso Nacional que lhe representa. Não sei as razões dessa discrepância, mas ela é bem visível. Entendo patavinas das leis eleitorais. OK, as legendas levam para a Casa do Povo gente que não deveria estar lá por não ter recebido votos suficientes. Mas sabemos, também, que tem um monte de deputado e senador, a maioria, de fato, que foi eleita legitimamente, mas não faz jus em nada do que o eleitor pretendia dele. 

Veja o caso das manifestações nas redes sociais. Abaixo-assinados eletrônicos pipocam, demonstrando a insuportável indignação da população relativa à posse de Renan Calheiros na presidência do Senado e também à nomeação desse tal de Marco Feliciano, que nunca havia tido o desprazer de tomar conhecimento, para presidente da Comissão de Direitos Humanos. Entretanto, de que adiantam os levantes? O Congresso segue impassível, totalmente insensível à voz da sociedade que deveria representar. 

Somos nós que legitimamos o Congresso e ele não se dá conta e não presta contas. Aliás, o Parlamento dá, diariamente, uma banana para o Brasil, igual à personagem do Reginaldo Faria no último capítulo da novela Vale Tudo. Mas cena como aquela era coerente em 1988. De lá para cá, a sociedade está muito mais consciente, muito menos miserável, muito mais atuante, muito menos alienada. Só que Congresso atua com ares de “não tenho nada a ver com isso” e segue na sua marcha insana-oligárquica-retrógrada-corrupta como se permanecêssemos atolados na republiqueta de pencas de nanicas que já fomos um dia. 

E olha que sou pessimista por vocação. Se eu sou capaz de enxergar como o Brasil mudou, por que nossos deputados e senadores continuam patinando na lama podre? O país está mais aguçado, mais atento. Ninguém mais acha legal ficar dando bandeira de conchavos, de roubalheiras, de mutretas. Não pega bem, sabe? A sociedade se agrega em protestos, passeatas, grupos de discussão, ONGs e o escambau. Somente o Congresso continua cego. Mas, peraí... Não é a Justiça que deveria ser cega? 

O Legislativo não se dobra. Não ouve o povo que o elegeu. É o mais frio dos Poderes, o que menos demonstra vontade de abrir mão de suas prerrogativas privilegiadíssimas, a começar pelos salários inacreditáveis (um tapa na cara da população) pagos a seus servidores concursados ou não (o que é pior). Vi o filme Lincoln na semana passada. Puxa, como estaria o Brasil se tivéssemos tido presidentes que valessem o dedinho do pé daquele cara, não? Mas em 1800 e alguma coisa, a escola já era obrigatória para  as crianças dos Estados Unidos da América. Outras bases, outras prioridades...

Reconheço os esforços do Judiciário e do Executivo para abrir suas portas para os cidadãos e mudar seus maus hábitos, práticas questionáveis, hermetismos, nepotismos e afins. Ainda faltam umas 300 voltas ao mundo para eles chegarem ao nível da civilidade, mas estão caminhando. Não vejo a mesma contrapartida do Legislativo. Posso estar enganada, mas não observo nenhuma significativa renovação de métodos nas duas Casas nesses anos todos. Só confete, RP, publicidade, cerimonial... Nesse quesito, o Congresso Nacional dá show. Tem uma área de Comunicação impecável que doura a pílula e sabe faturar. 

Gostaria muito que o Congresso levasse a sério as demandas da população. Que tudo não acabasse em pizza porque, vou confessar uma excentricidade: não gosto de pizzas! Porém, como desmontar aquele olimpo repleto de velhos deuses decadentes que não largam o osso? Torcer para que morram? Sim, é uma opção. Frágil, diga-se de passagem, pois não temos controle sobre o imponderável. 

Tenho outra teoria: o Brasil precisava de uma guerra civil para amadurecer. Ou pelo menos de uma insurreição mais coletiva, mais plural. Sei que tem muita gente que não vai concordar comigo, porém já deu para perceber que o Congresso não vai se dobrar aos apelos suaves de marchas e assinaturas, não é mesmo? Tô achando que o lance agora é apelar! 




Comentários

  1. Lu, eu acho que em todos os lugares sempre iremos encontrar pessoas de todo o tipo, das mais nobres às mais cretinas. O que me assusta nos fatos recentes é que demos uns cinquenta passos pra trás no jogo da maturidade política. Parece que a maioria do Congresso perdeu qualquer pudor, o que é chocante mesmo reconhecendo o histórico de trastes que temos no que se refere a autoridades públicas. Para mudar isso, acredito sim no poder das manifestações. Nesse país recheado de pizzas, muitas foram evitadas porque não dava mais para ignorar o barulho das ruas - exemplo disso foi que a Rede Globo TEVE de passar a fazer matérias sobre as Diretas. Não dava mais para ignorar. Então eu, na condição de uma pessoa que quer sair cada vez mais da zona de conforto e militar mais (não partidariamente, que isso não me interessa, mas em nome de causas), acredito no poder dos protestos. Agora, só teremos mudanças verdadeiras se o povo votar melhor. Essas aberrações não estão no Congresso por obra divina, e sim humana. Teremos um Congresso digno quando as pessoas votarem de forma digna. Agora, para conscientizar mais as pessoas, haja sangue, suor e lágrimas, mas é o caminho. Beijos, Débora

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  2. Oi Deboratti,

    eu também acredito na força da manifestação popular. Parece que o Congresso é que não acredita, pois não faz nada a respeito para dar uma resposta decente aos protestos. Renan deveria ter sido afastado e esse Marco Feliciano também, né?
    Lógico que vamos sempre encontrar gente de todo o jeito em todos os lugares. Você está parecendo uma política, querida Deboratti.;)

    Eu falo da instituição em si, não das pessoas. A instituição Congresso Nacional segue avessa à queda de privilégios, por incrível que pareça... Até o Judiciário, bem o mal, tem feito algum dever de casa e cortado na própria carne, mas o Congresso...

    Para as pessoas votarem de forma digna, só saindo às ruas pela Educação Pública de qualidade. E eu ainda não vi nenhuma campanha ferrenha nas redes sociais sobre o tema. Queria que a Educação tivesse o mesmo apelo das causas que defendem questões de gênero e sexualidade. Isso sim seria consciência!


    Beijim,

    Lulupisces.

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  3. eu, parecendo uma política? sou mesmo! é que uns safados se apropriaram do termo, mas política é tudo, de reunião de condomínio a entrevista de emprego :) Lulu, tem tanta coisa errada por aí... Sim, concordo totalmente quanto à educação. Já vi indignação em relação a isso em redes sociais, por exemplo, muita gente compartilhou e opinou sobre um discurso de uma professora acho que em João Pessoa, não lembro o estado, mas ela arrasou em um discurso na Assembléia Legislativa de um estado do Nordeste. Claro que não é esse tipo de coisa que muda a realidade. Mas é alguma coisa. E se podemos fazer mais, que façamos. Não é só batendo panela na rua, mas agindo em projetos, debatendo temas, divulgando informações relevantes. Nunca tive a pretensão, que costuma ser atribuída a muitos estudantes de Jornalismo, que eu ia conseguir mudar o mundo com as opiniões. Mas se eu conseguir mudar a mim mesma e influenciar uma pessoa que seja a pensar de forma diferente, acho que já vale. Beijos, Débora
    PS. E não, não estou pedindo seu voto.

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    Respostas
    1. Mas eu votaria em você, sensata e sensível Deboratti!!!

      Conheço esse discurso da professora em João Pessoa. É bacana. Claro que vale o esforço pessoal para melhorar a si mesma e melhorar tudo ao seu redor! Eu fico aqui no blog vociferando e tentando fazer exatamente isso.

      Não fique brava, hein!! O Luiz ficou tão bravo comigo que hoje nem quer me ver pintada de arco-íris bem gay. Como você é amiga dele, espero que entenda que eu sou enfática, mas não lunática!

      Um beijão,

      Lulu (pisces).

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  4. Lu, excelente reflexão!

    Beijos,

    Jandirainbow.

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  5. Oi, Loo! Pra variar, tô atrasada querendo botar em dia a leitura… Olha, mas cá entre nós, que manifestação popular é essa que quis tirar o Renan? Para um projeto popular precisa de 1,4 milhão de assinaturas! Quantos mil esclarecidos quiseram ver o Renan fora do Senado? Nem faz frente aos que o colocaram lá! E agora, que ele fez essa mídia toda colocando concursados pra trabalhar na rede pública? Vende o peixe dele, não economiza nada e lesa o direito de um cidadão que fez concurso com edital e tudo! E que vai ganhar na justiça, porque o que o Renan fez é contra a lei, mas aí ele não está mais na presidência (porque a justiça continua na sua vagarosidade de sempre) e está se lixando pro rombo que ele vai dar nos cofres do judiciário com os processos e nos cofres do legislativo com o pagamento das indenizações e acabando com um serviço médico que poderia ser sim melhor gerido, mas não precisa ser destruído - e todos os tribunais têm serviço médico. Aposto que serviço médico exclusivo para os senadores deve ter permanecido, mas é só um chute. Os políticos cortam na carne dos seus servidores sim, cortam salários na medida do que podem - se não cortam mais é porque não podem ainda -, trabalhamos 9 horas corridas na prática pra quem tem deveria ter horário de almoço e não recebemos a mais por isso, são 7 horas corridas para quem faz horário corrido, mas na carne deles, claro que não. Como os juízes não cortam na carne deles também, continuam tendo duas férias remuneradas por ano, por exemplo. Só o Executivo, que por ter mais servidores, continua pior das pernas como sempre. O Brasil pouco muda, os políticos menos ainda. E não adianta querer que eles morram, outros irão substituí-los, iguaizinhos. O sistema é viciado. Político trabalha muito, isso eu garanto, a gente só não sabe por quem. Eu, que sou uma mulher de fé, ainda confio que as pouquíssimas mudanças são para melhor, e que um dia vai chegar até eles. Esse um dia é que a gente não sabe quando. Beijo. Má

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