Gulodices




Sexta é um alvoroço só. De repente os colegas falam mais alto, se reúnem em rodinhas. O chefe mostra as cópias das receitas que está aprendendo no curso de gastronomia, os papos são embalados para presente. O formal perde, enfim, sua compostura. Sexta é o melhor dia da semana. O dia que antecede a noite e a noite que promete, principalmente quando se recorda que amanhã é sábado. 

Molhos, cortes, sulgo, suculentos, cheiros... A cozinha é algo quase sexual. As pessoas colocam um pedaço da torta na boca e fecham os olhos. “Humm, vou ter de comer isso de qualquer jeito”. Como diria um homem ou mulher profundamente atraídos por seu objeto de desejo: de hoje não passa! 

Entendido o fetiche do público por programas de culinária. É voyeurismo assumido. Ver alguém que saca do riscado preparando um prato é assistir a um filme erótico da melhor qualidade. Quem sabe você pode repetir a performance na mesa ou na cama? Mil e uma possibilidades. Afinal, “a água na boca é melhor do que uma ereção”. A frase não é minha, é de Umberto Eco, que se cozinhar como escreve ou transar como descreve comidas, deve ser um colosso. Ou seja, pregustar, em banho-maria, pode fazer toda a diferença... 

Em compensação, o self-service é o puteiro da gastronomia. A michorna de sons, odores, cores, paladares... Invenção inteligente, sem dúvida, mas a prostituição é a profissão mais antiga do mundo, não é verdade? Almoçar todos os dias num lugar desses é fazer sexo sem tesão algum. Acontece, mas deveria ser exceção... 

Depois de mais um coito interrompido por causa de uma falsa feijoada de buffet, a gente senta ao lado do anjo e chora o tempo em que a mãe preparava apetitosos frangos cozidos com pequi e a fada-madrinha colocava aquele feijão preto para cozer com paio, costela, carne de sol e dizia com falsa modéstia: “não é feijoada não, é que eu não como feijão pagão”. 

E era apenas para você aquela panelona... Sábado sim, sábado não. Com um vinhozinho da missa do padre como acompanhamento. Tinha cerveja pro maridão da afilhada, que minha madrinha era antiga e gostava de agradar os homens da casa com mimos de mulherzinha. Podia ter aprendido mais com ela... A fazer o bendito feijão, inclusive. 

Às vezes apareciam os tais monsenhores ou bispos... O que diria Jandyra de um Papa argentino... Quanta heresia! Ela não convidaria para os almoços de sábado, aposto. Entretanto, boa parte dos sacerdotes de Brasília passou pela casa simples com mesa austera de verdes toalhas e temperos divinos. Todo mundo faminto da comida da preta velha. Tudo bem, a gula é o único dos sete pecados que eu perdoo piamente.



Comentários

  1. Lú,

    Como eu digo sempre, isso vai dar zebelê (não me pergunte mas é alguma coisa como confusão).
    Los hermanos no nos cae bien y tampoco nosotros a ellos.
    Me pareció raro el hecho que lo nuestro - el brasileño - no haya sido elegido.
    A ver lo que pasa.
    Adelante.

    Buen fin de semana.

    Davide

    ResponderExcluir
  2. Bem...
    Estão dizendo por aí que o brasileiro, vascaíno de carteirinha, foi o segundo mais votado...

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

Ousadia

Presentim de Natal

Horizonte de Eventos