A maluca do tempo




Adoro esse barulho dos pneus espalhando água da chuva. Isso quer dizer que o dia está denso e cinza reflexivo. Minha amiga e temporária colega de trabalho me pergunta: como você pode estar de bom humor numa manhã chuvosa como essa? Estou. A chuva me fecunda. Dias londrinos me dão uma leveza diametralmente oposta ao peso das nuvens no céu. 

Natal tem de ser assim: branco. A amiga austríaca é quem diz isso e eu a entendo. Ela não gosta de inverno (um paradoxo para uma austríaca), mas ela sempre disse que Natal tem de ter neve. É verdade. No caso do Brasil, no mínimo, tem de ter cinza-pluviométrico. Família reunida ao redor da mesa trocando presentes combina com noites aconchegantes de inverno. O verão pede festa com amigos no meio da rua. É duro comer tanto pernil, peru e farofa suando em bicas. 

Bem que a gente podia ter um mês de frio. Só um mês bem frio. Para casacos até os tornozelos e cachecóis. O equilíbrio do mundo podia existir ao menos no clima. Não é pedir muito, é? E aí os europeus e groenlandeses viveriam seus 30 dias de Rio 40 graus. Troca justa, pô! Todo mundo ficaria feliz e contente. O inverno não durando seis meses lá. E o verão não duraria o ano inteiro abaixo da linha do Equador. Depois pedem que a gente seja mais diligente. Como? O sol rima com danação! 

Fico fula da vida com essas decorações de Natal importadas com ursos... Entendo o Papai Noel, mas ursos? Aí meu primogênito diz: mas se tem Papai Noel, que não é brasileiro, também pode ter urso. É, o argumento procede. Todavia acredito que Papai Noel já virou uma instituição global. Ele veste aquela roupona pesada e quente porque vem do Polo Norte e lá só tem gelo. Tá explicado. Porém, ursos nos shoppings brasileiros? Ah, nem!! Não dá pra trocar por bicho-preguiça, tatu-bola-Fuleco-fuleiro, lobo-guará, mico-leão-dourado? Dourado combina bastante com Natal. Qual é o problema? 

Por isso sempre sonhei em ser vitrinista de loja. Criaria uma decoração Mata Atlântica para a temporada de fim de ano. Papai Noel de férias nos trópicos. Alegres trópicos. Não tristes, tá Claude Lévi Strauss? E aí o velhinho chegaria aqui e trocaria as roupas pesadas por uma sunga e bonés vermelhos, besuntado de protetor solar fator 50. Se bem que ainda prefira um Natal chuvoso. E aí o Papai Noel estaria no meio do cerrado verde com uma capa impermeável vermelha brilhante, tipo emergência 193. 

Tomara que chova até o dia 25! Que os pneus continuem espalhando barulhinhos bons que ouço aqui da janela do 1o andar do edifício-cortiço do CNJ. Esclareço: cinza até dia 30/12, no máximo. Que o sol venha no último dia do ano para nos levar ao mar. Réveillon com chuva, definitivamente, não dá. 


Comentários

  1. Adorei o texto, e concordo plenamente quando você diz que o Natal tem de ser chuvoso, um dia branco...agora o reveillon,entrada do ano das maravilhas 2013, tem que ter Sol,luz, até para que a gente possa enxergar melhor essa nova jornada e dar os passos firmes, confiantes...bj.
    Namastê!
    Cynthia

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  2. Amei a ideia de um edifício-cortiço. Isso me faz refletir num estágio de transformações, de resgate das cinzas para uma fênix cheia de luzes que pode ser tudo isto aqui, este lugar e nós todos.
    Quanto ao Natal, penso mais nele colorido porque nossa vida é movida a muitas energias, e estas podem nos trazer as cores de um arco-íris. Que o Ano Novo venha com muito barulho BOM.
    Deusa

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