Dual flex

 
“Nossa, você tem um leão tatuado nas costas!” Nas costas e no coração. Um leão e um touro. Meus filhos. Duas forças da natureza. Dois amores eternos. A selva e a fazenda. A savana e o cerrado. O sol e a lua. A relva e a pastagem. Duas faces da mesma moeda da maternidade. O claro é mais escuro. O escuro é mais decifrável.
 
O mistério de criar duas almas que se reconhecem e se estranham, que se completam e se rechaçam. Quem tem dois filhos vive imerso nos dilemas. No caso de uma dupla masculina, penso que fica ainda mais desafiador para a mãe. Universo constituído pelo terreno do oposto.
 
 
 
 
 
Diz o sábio Haroldo, amigo inseparável do Calvin: “as meninas são feita de açúcar, mel e estrelas do céu. Os meninos, de lesmas do morro e rabo de cachorro”. Descrição mais exata não poderia haver. Não é à toa que Bill Waterson é um gênio e suas personagens estão entre as mais inteligentes e queridas do mundo. Indo além do sentido literal da metáfora, meninos são mesmo as entranhas, enquanto as meninas são o imaterial.
 
Meninos são viscerais em suas falas, armas, estratégias. Eles afagam com mãos e pés ao mesmo tempo. Garotos gostam do sobrenatural, do gosmento, do feio e assustador. As meninas, salvo exceções, se encantam pelo belo e pelo final feliz.
 
Os meninos, quando meninos, são brutos, fedidos, amassados, descabelados, desorganizados (e muitos permanecem assim até morrer). “Quando meus dois filhos vinham para cima de mim eu já fazia assim com a mão, protegendo os seios”, contou uma amiga, mãe de dois, hoje homens feitos na faculdade. “Não, não vou levar esse arco e flecha porque eu sei que vai sobrar para mim depois”, afirmou aquela mãe desconhecida rodeada por dois garotos, em frente à barraquinha de bugigangas dos índios pataxós na Ponta do Corumbau.
 
Eu me solidarizo, me espelho. Ao lado de dois meninos uma mãe inevitavelmente vira saco de pancada. É cotovelada, é pisada, é empurrada... Uma dupla de homenzinhos é energia física em estado caótico convivendo com você. Furacão e terremoto. Tsunami e deslizamento de terra. A mãe não tem absoluto controle. A mãe desconhece os desdobramentos, a testosterona em evolução e amadurecimento.
 
As meninas, por serem fêmeas, são mais naturais às mães. O afeto suave e a vaidade são confortáveis, caminho por demais trilhado. Meninas não tumultuam os lugares em que chegam. Em dois segundos, você sabe que existe um menino na sala. Se forem dois meninos, talvez em menos tempo.
 
Porém, é preciso dizer que meninos são mais descolados, mais simples, mais feras (em todos os sentidos). Eles não costumam reclamar das intempéries do mundo que o cercam com tanta facilidade. Ai, tem mosquito! Ai, tá sujo! Ai, só quero se for rosa! Você não vai ouvir isso de um garoto (provavelmente).
 
Os meninos são audazes e impulsivos. Testam e provocam a realidade com coisas diferentes. Isso me encanta! Não é só uma questão cultural essa de os grandes desbravadores serem homens e também de serem os jovens machos os que mais morrem em acidentes. Acho que aí também reside a diferença biológica dos gêneros, pois as meninas quase sempre apresentam o comportamento que busca a casa, o lar, o proteger e o não agredir.
 
Entretanto para se lançar em águas desconhecidas é preciso ser agressivo. As meninas não são genuinamente tão literais. Meninas gostam de parábolas e subterfúgios. Gostam do véu do mistério. Meninos preferem o preto no branco, namoram o perigo.
 
Mas toda essa conversa sobre duas naturezas me fez lembrar um vídeo de Oscar Motomura, delicadamente apresentado a mim pela querida amiga Isabel. Nele, Motomura replica o conceito de que todo problema tem quatro dimensões:
  •  A “aparente do aparente”, dimensão que todos veem, gostam de lidar por ser confortável, familiar etc. Deve ser o caso de mães de meninas, só de meninas. E de pai só de meninos.
  • A “oculto do aparente”, aquela na qual você não vê à primeira vista, mas se fizer um esforço mínimo, vai encontrar o que está escondido. Talvez seja o caso de mães de meninas um pouco mais fora dos padrões.:)
  • A “aparente do oculto”, dimensão que só é atingida pela intuição, uma capacidade particularmente bem feminina e que pode ser adotada ao criar meninos.
  • E a “oculto do oculto”, que só é atingida pela ação. Aqui, nem a intuição dá conta, pois só se alcança o futuro se começamos a provocá-lo no presente, por meio do agir. O risco é grande de entrar no desconhecido, mas, na maioria das vezes, é recompensador.
Como mãe de dois meninos, estou nessa, testando a minha nova realidade, colocando a mão na massa, errando, acertando, me desafiando. O meu porvir é hoje. E o seu?
 
Para quem quiser conferir quem é Oscar Motomura:
 
 
 

Comentários

  1. Tamo juntas Lú.......parecia q vc estava falando de mim.....Bjão e não demorem pra voltar, meus meninos adoraram os seus!!!!!

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    1. Lú, esqueci de assinar....é a Marina do Barretão!!!!!!

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    2. Oi querida Marina do Barretão!!

      Eu imaginava que era você!! Bem-vinda ao blog, guria, irmã camarada nessa aventura de criar meninos!!!

      Gostei da sua participação! Venha sempre!

      Beijão,

      Lulupisces.

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  2. Luciana,

    muito legal!!

    Senti ali o seu lado "super-mãe" (que você me parece negar) e sua naturalmente forte ligação com os meninos.

    Eu, que vivi esta diferença entre filhos e filha, vejo que é exatamente como você relata.

    Legal você mencionar a Eliane, em relação à "proteção dos seios".

    Abraço para o Bernardo.

    Beijinho nos meninos e um beijo pra você.

    Paulo.

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    1. Oi dear Paulo,

      obrigada! Eu não coloquei o nome da Eliane expressamente porque não sabia se ela iria gostar ou não. Tem gente que não gosta de se expor, não é mesmo?

      Eu não sei se eu nego ser supermãe, é que eu não me considero mesmo. Sei lá, tem tantas mães mais incríveis do que eu por aí... A Eliane é uma que se encaixa perfeitamente nessa categoria. Mima a gente!! Cê viu que ela cortou maçã pra mim quando soube que eu estava passando mal? Tão bonitinha!!

      Eu não sou assim de cuidar, de mimar... Por isso não me incluo na categoria supermãe. Mas fico agradecida por você achar que eu também mereço ser chamada de supermãe.

      Beijão,

      Lulupisces.

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  3. Bom, experiência só mesmo com menina em casa e com meninos somente na escola, meus alunos. Com a Bruna eu acho que estou na fase oculto-ocultíssimo. Difícil chegar a ela, não me conta seus segredos... fico carente e largo tudo para dar-lhe atenção, quando ela resolve se abrir um pouco. Fico catando migalhas. Nessas horas ainda encontro um pouco da minha menina de antes. Ela agora tem cabelos vermelhos, cor de fogo! É capaz de chegar em casa um dia desses e eu perguntar: Ué, quem é você? Como conseguiu as chaves? rs.

    Bjs
    Patty

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    1. Ai, Pattygirl, eu morri de rir com a sua experiência...

      Tô rindo nervoso porque serei você em breve, com os meninos cabeludos, enormes (vão ter provavelmente 1m90) ou seja: irreconhecíveis!!

      Já pensou quando eu tiver de aturar um monte de marmanjo fedido fechado no quarto ouvindo rock nas alturas? E as garotas ligando sem parar? Ai, ai...

      Vida de mãe: sempre um desafio!!!

      Beijão,

      Luzinha- Lulupisces.

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  4. Compreendo bem Lu, pois tenho 3, um leão, um gemeos,e um libra.São feras...não tive muita dificuldade em lidar com o sexo M,pois tive 3 irmãos mais velhos, com os quais brinquei muito e apanhei também, com aquelas brincadeiras típicas dos meninos, policia e ladrão, pular carniça( eu era sempre a própria)jogar futebol de botão e por aí vai.Penso que por isso, quando engravidei sempre quis ter homenzinhos, me identificava mais.As meninas vieram depois , como netas e curti muito também.
    bj.Namastê!
    Cynthia

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  5. Do que eu entendi, tanto faz ser mãe de dois de um tipo de só, de um só ou de quantos forem, as quatro dimensões existem em qualquer caso; mesmo o seu filhote aparentemente decifrável não é tão evidente como se pode pensar… o que só reforça o que já sabemos, ser mãe é uma aventura mesmo, e é um grande charme da coisa toda!

    Marisa.

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