Em nome dos Pais





Para Bernardo, Rodrigo, Daniel, Mário e Paulo Magno

O mês de maio tão maternal, tão mariano, tão casamenteiro. Os textos sobre a divindade da maternidade pipocam nas redes sociais e aí a gente percebe, não sem um puxão de orelhas de pais ciosos, que nós, mães, somos muito autocentradas e possessivas. A gente se acha, né não? 

Repassando um texto sobre o tema “quando nasce um bebê nasce também uma mãe”, recebi respostas indignadas de alguns papais. Dentre eles, do meu sobrinho - que será pai pela segunda vez - e do meu marido, um pãe (veja como as mães são egocêntricas, pois um pai presente é logo apelidado de pãe). Ambos reclamaram do unilateralismo desses artigos que mostram a mãe como o único ser devotado e por que não, sugado, pelo furacão chamado criação de filhos. 

Ora, o sentimento é recíproco, eles afirmam. E eu acredito. Mas, assim como as propagandas de sabão em pó e elétricos domésticos ainda são extremamente machistas, os textos e propagandas sobre filhos são extremamente feministas no sentido da exclusividade. Como se apenas as mulheres pudessem ser capazes de se sacrificar por seus rebentos. De entendê-los e entrar em sintonia com eles. 

Tudo bem que 90% das mães são mães dignas desse nome contra apenas uns 30% de pais responsáveis à altura do cargo. Isso é um chute meu, esclareço. Não conheço uma pesquisa sobre o tema (fica a sugestão para os acadêmicos). De qualquer modo, todos os textos e campanhas podiam sair do automático, dos clichês e mostrar que mãe também pode ser uma merda e pai também pode ser fantástico. 

Acredito no mito do amor materno que permanece causando polêmica por aí. Nem toda mulher ama incondicionalmente o filho desde a concepção. Algumas não vão amar nunca, aliás. E existem papais que se deslumbram com o amor filial a partir do resultado do teste de farmácia. 

O importante é as mulheres começarem, na prática, a dar voz a esses homens maravilhosos que assumem a sua paternidade com bravura indômita. Conheço vários homens que são pais com P, porém, infelizmente, continuam quase invisíveis nesse cenário autoritário da maternidade. E não é essa história de dizer “ele é um pai que é uma mãe”. Santa arrogância, Batman! Pais que são pais, pronto. Ser pai é também ser mãe e ser mãe é também ser pai. A plenitude do desafio é hermafrodita e simbiótica. 

Como consequência dessa feroz reserva de mercado (consciente e inconsciente), vivenciamos, por exemplo, a quase ausência de educadores do sexo masculino nas classes de alfabetização. O arquétipo da mãe-polvo estende seus tentáculos onipotentes, onipresentes e oniscientes para fora do lar na pele da “tia”. 

Por isso, me compadeci desses pais incríveis que seguem incógnitos e desprestigiados. Não que eles não façam mais do que a obrigação, pois são pais e não apenas doadores de esperma. Todavia, a contrapartida também vale: mãe que decide ser mãe tem de ser mãe, ué! Por que todo esse auê quando a gente faz o que abrange o pacote de metas? 

Claro que os homens-pais nunca vão sentir a comunhão que uma mulher-mãe sente quando debaixo do chuveiro abraça seu filho e cola o corpo dele junto ao dela. Os dois retornando ao estágio original uno naquele ambiente úmido. A mulher, de repente, é toda um útero gigante acolhendo o não-feto, mas menino feito. A sinergia daquela eucaristia... Dois corações batendo em compasso perfeito remetem à origem ancestral da humanidade... Não, isso os pais não sentirão nunca, tadinho deles.

Portanto, deixemos de ser tão apegadas, tão egoístas. Afinal, as mães já conhecem a melhor parte! Compartilhemos nossos filhos com esses homens que não postam todas as fofuras dos filhotes nas redes sociais, mas são capazes, sim, de trocar sucesso, poder e grana por quem eles colocaram no mundo. 


Comentários

  1. Obrigado pela homenagem. É preciso dar fim a mais esse preconceito. Há pouco tempo não se dizia "Preto de alma branca"?

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  2. verdade, Lú!

    Como existem mães com "M", também existem pais, sua proporção foi ótima em relação à eles. Você já deve ter percebido que tive um pai, muito presente na minha vida, que me conhecia e me entendia como ninguém, que cresceu junto comigo, riu, chorou tudo junto, que tinha uma sensibilidade que poucas mulheres tinham, bato palmas para esses pais presentes antenados na rotina e criação dos seus rebentos, vai fazer bem a todos, sou uma mãe bem presente na vida da minha única filha, sei o que ela sente só de olha-la, mas sempre a respeitei muito. Agora a mulherada ainda está anos luz na frente dos homens no quesito paternidade e maternidade. Dê os parabéns em todos os homens que mencionou em especial ao meu primo Bernardo, que percebo ser igual a papai, isso vai lhe fazer um bem enorme.

    Bjcas,

    Renata Assumpção

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  3. "De qualquer modo, todos os textos e campanhas podiam sair do automático, dos clichês e mostrar que mãe também pode ser uma merda e pai também pode ser fantástico. " Assino embaixo e para você não preciso explicar.

    Lara.

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  4. Adorei o texto!
    Retrata uma realidade esquecida por debaixo da "verdade" que somente as mães criam os filhos.
    Num mundo moderno é preciso dar espaço para pais atualizados, presentes, participativos, educadores... Amigos.
    O mundo mudou. As famílias também.E as relações entre pais e filhos precisam de novas abordagens. Decididamente a paternidade é uma benção. Não troco por nada!

    Rodrigo.

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  5. Obrigado Luciana!!

    Me senti muito honrado ao ter o meu nome no seu texto, e lembrado como "um pai que é uma mãe".Valeu mesmo!!

    E, como tenho conversando com um antigo colega, que é um paizão, o Eduardo (Barbosa, da FATEC-SP, o Bernardo o conhece), enviei o link do seu texto pra ele ver. E, claro, me vangloriando de ser um paizão, tanto quanto ele.

    Abraço,

    Paulo Magno



















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  6. Gostei, manaLú!
    Eles merecem o reconhecimento!
    Bjos,

    Marilena

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