Propulsão

Como estamos na semana do nascimento de  Kafka,  aí vai  mais uma de Praga

Ufa que eu consegui terminar “O Cemitério de Praga” depois de três meses de leitura! Simplesmente adoro essa construção frasal do meu primogênito, que sempre coloca a interjeição no início da conversa, jamais em seu fim. Dá uma sensação de conquista maior do que a de alívio, que é a sua característica corriqueira. 

Contudo, não tive êxito em repetir o espanto literário que foi ler “O Nome da Rosa” no auge da adolescência. Umberto Eco não conseguiu fazer outra obra-prima. Também, tem gente que nunca faz nenhuma... Sorte dele que se sagrou campeão e ainda ganhou rios de dinheiro com a adaptação do livro para o cinema. Filmaço com o querido Sean Connery. 

Essa era a capa da edição de 1983, do meu livrinho amado

“O Nome da Rosa”, para mim, tem sabor de amor de mãe. Ter nas mãos um livro daquela qualidade e espessura há quase 30 anos, era luxo. Sei que mamãe encontrou uma brecha no orçamento apertadíssimo da grande família para me presentear com a primeira edição dele. E o li com a avidez e o delírio compensadores de tamanho investimento. 

Aperta o peito lembrar que emprestei o exemplar para uma amiga e ela, claro, deu chá de sumiço no meu tesouro. Morro de arrependimento até hoje. Mas pretendo tentar encontrar edição idêntica em algum sebo virtual.

A Idade Média sempre é a parte da História que mais me fascina. Toda aquela escuridão em contraste com as iluminuras. A impenetrabilidade dos mosteiros, a histeria religiosa que cegava a inteligência. Bruxas criadas pelo simples medo da vanguarda. As sementes da tal economia moderna... 

Vida explodindo em sangue e lama ao redor dos castelos. Os burgos... Sem contar as “As Brumas de Avalon”, Merlin, os cavaleiros da Távola Redonda, Robin Hood e a ambígua Morgana. Uma mulher sexy e poderosa numa época em que tais atributos eram o passaporte para o assassinato na fogueira. 

Se Morgana existiu ou não, só as lendas bem contadas irão comprovar um dia. Mas seu arquétipo é mais uma prova de que as mulheres, desde tempos imemoriais, batem de frente com o óbvio em nome da liberdade. 

“A História da Riqueza do Homem” também li mais ou menos na sequência de “O Nome da Rosa”. E quando o tema Idade Média surgia nas provas, minha nota dez estava garantida. 

Veja quanta sutileza do bamba Umberto ao intitular sua obra máxima a partir de uma passagem mínima em tamanho, mas fundamental para entender a mente da sociedade medieval: presa entre o pecado e a santidade; entre o prazer e o dever; entre as pernas da mulher, sempre esse lugar de encontro e perda, mola propulsora das revoluções do mundo. 

Pois “O Cemitério de Praga” careceu de todas essas paixões. Sua única personagem feminina não foi capaz de batizar a obra, que não deixa de ter méritos ao descrever a culinária francesa com entonação glutona e meter o pau nos judeus como poucas vezes vi de forma tão sarcástica, engraçada e livre do politicamente correto. 

Foi revigorante voltar a ler um livro que, a cada página, apresentava dois ou três vocábulos que me eram desconhecidos (Umberto Eco e sua decantada erudição). Entretanto, fiquei contente de ter vencido suas 500 e algumas folhas mais pelo ufa aliviado do que pelo ufa conquistador. 

Leitura deliciosa
Por isso, parti para descobertas menos densas e indico o que estou lendo agora: “O Clube do Filme”, de David Gilmour. Leitura imperdível para quem é pai e cinéfilo. Se você não for nenhuma das alternativas, quem sabe não se anima?

Tchau! 


Comentários

  1. Ah, também adoro a Idade Média! Seu mistério, seu clima noir, gótico. "O Nome da Rosa", seja livro, seja filme, é o máximo mesmo! Bom, quem é professor já teve que rever esse filme 3.647 vezes, quando o professor de história junta as turmas e passa pros alunos...rs. Mas que bom que ele passa.
    Eu comprei "O Clube do Filme" numa feira de livros que tem aqui. Livro + Filme é comigo mesma! rs. Tá na fila!
    Bjs
    Patty

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  2. Tá anotado Lu! e indico também um excelente livro que estou lendo..."O livro tibetano do viver e do morrer",do monge Sogyal Rinpoche...quinhentas e algumas páginas...maravilhoso...bjão!
    Namastê!
    Cynthia

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  3. Bons tempos em que um bom livro era um presentaço! E pra gente ainda é!
    Beijão!
    Má.

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