Teoria da pós-maternidade



É a primeira vez que assisto a uma olimpíada com o olhar de mãe. Bem, e o que uma coisa tem a ver com a outra? Nem eu tinha ideia até perceber que agora entendo todos os micos que os pais pagam para torcer de coração aberto pelos filhos. Solidarizo-me com eles e digo: faria o mesmo. São gritos, choros, faixas na porta de casa, faixas nos estádios...

Para os que não habitam esse universo “umbilicante” da maternidade/paternidade, pode parecer apenas exagero ou vontade de aparecer. Para nós, papais e mamães, é um sentimento que aflora pelo simples e indiscutível fato de que - sempre e sempre - vamos nos orgulhar dos feitos divertidos, inocentes e vitoriosos das crias da gente.

Ser mãe é algo realmente muito louco. Depois da maternidade, não consigo mais assistir a um filme-cabeça que trate de qualquer tema relacionado à violência infantil e suas vertentes macabras. E antes eu queria ser antropóloga...Muito esquisita essa mudança que me fez sair correndo de um pseudodocumentário sobre infanticídio indígena. Não deu.

A gente chora até em filme de Homem-Aranha. É patético, eu sei, mas lá estava eu em prantos dentro do cinema naquela cena em que o herói mascarado salva uma garotinha asiática do incêndio. Tem uma criança ali em situação de perigo, nós, mães, nos colocamos na pele dela, na pela da mãe dela e até na pele da avó dela. E se fosse com os nossos? Reparei que essa empatia distendida ataca mais mães do que imaginava. Não sou a única neurótica, ufa, graças a Deus!

E ontem aconteceu o cúmulo da maluquice: consegui me comover profundamente assistindo a um episódio de House. House, meu povo, é o seriado mais sarcástico, humor-negro, cruel e inteligente dos últimos tempos. Mas, definitivamente, não é para fazer ninguém chorar. Ou é? Se você sofrer desse mal de mãe (talvez de algum pai mais comprometido com a causa, too) você não aguenta ver o doutor House pressionando uma grávida a abortar na última chance da mulher parir o filho tão desejado. O sufoco já começa nessa aflitiva decisão: aborto e salvo minha vida, ou tento ir até o fim e arrisco a vida de nós dois? Não queria estar na pele daquela personagem.

Enfim, House decide fazer uma cirurgia no feto. Abre a barriga da mãe e dali sai uma mãozinha minúscula que segura o dedo do cirurgião frio e impassível. Nesse momento, as lágrimas correm fartas sobre as minhas bochechas. A cena ficou dez, muito bem feita, e até o House balançou. Ele ficou paralisado diante do poder de um quase-bebê.

Depois que a gente é mãe, o coração nunca mais é livre para cometer loucuras. Com essa frase de efeito, tentei explicar ao meu amigo Luiz a agonia que me dá passar 20 dias na Alemanha longe dos meus rebentos. Eu vou, porque não resisto à oportunidade de conhecer um país tão lindo e de rever amigos alemães e austríacos dos tempos em que moramos em Nova Iorque. Mas vou com o coração dividido. A verdade é que a pós-maternidade é muito mais complexa do que a pós-modernidade, teórica e praticamente vivendo.

As mães acometidas por esses sintomas de amor e culpa inexplicáveis e simultâneos recuperam a liberdade de ir e vir após a fase reclusão que um bebê impõe. Todavia, jamais voltam a viver com paz de espírito. Nunca mais apenas passearemos por aí alienadas e inconsequentes. O comprometimento com o futuro do mundo vem junto com a cegonha.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Ousadia

Presentim de Natal

Horizonte de Eventos