Bem-amados





De onde vem minha fixação com os anjos, não sei. Peraí, acho que sei: quando encontrei um suvenir de anjo da guarda numa lojinha de igreja, grávida do primogênito. De lá para cá, não, peraí, na sala do apê já havia um anjo esculpido em madeira por um artesão de mão cheia lá do Piauí, antes mesmo de pensar em ter filho. Peraí... 

A palavra Anjo é derivada do latim, angelus, e do grego, angelos, e significa “mensageiro”. Chamado, nos primórdios da Grécia, de “daimones” eram espécies de espíritos da condição humana, isto é, personificações de vários estados da existência: emoções, ações e moralidade. Os daimones de moralidade foram divididos em Agathoi (o bem, virtude) e KaKoi (o ruim, vícios). 

Depois, em algum momento, deve ter rolado uma diáspora canônica e os anjos do mal viraram os demônios e os anjos do bem viraram os anjinhos fofos, de cabelinhos encaracolados e pele alva, bem arianos como são quase todas as representações eurocêntricas da iconografia religiosa ocidental, infelizmente. 

Anjos são os seres intermediários entre Deus e a humanidade. São definidos por sua incumbência, isto é, pelo tipo de proclamação de mensagem que precisam transmitir, embora este papel não compreenda todas as suas atividades aladas. Originários do Zoroastrismo, (segundo a Wikipédia), eles fazem parte do Judaísmo, Cristianismo e Islamismo, religiões nas quais Deus é um ser elevado, magnânimo e absoluto que, obviamente, não tem tempo nem paciência para se envolver com as questões mundanas pueris. Tasca o anjo, coitado, para mediar essas pendengas. 

Livrai meu filho de ficar doente! Valei-me contra assaltos! Aquela forcinha na hora da prova! Que a viagem seja tranquila! Meu anjinho da guarda, zelai o meu sono! Os anjos, sejam arcanjos, querubins ou serafins (vale até cupido, aliás, um dos mais solicitados), se transformaram na infantaria divina, tropa de choque da bondade. Abrem os caminhos, não com armas, mas com asas! Protegem-nos das avarias da existência (ao menos pensamos que sim). 

E hoje tem anjo de tudo quanto é forma e nome para cada santo dia. Se o agro é pop, o anjo é mais. Faça uma pesquisa superficial no Google e descobra que existem, ao menos, uns 150 nomes de anjos para batizar o seu bebê. Alguns esquisitíssimos, vamos combinar. 

Acabo de saber que existe anjo do signo! O de Peixes é o Asariel. Achei meio assim-assim, soa como AZARiel... Também conhecido como Saquiel ou Metatron Tsadkiel, seu nome significa “Fogo de Deus”. Será verdade, será que não? A Googlelândia é uma fossa abissal de informações inacreditáveis. 

Gente, daqui a pouco eu escrevo um tratado teológico repleto de imprecisões sobre os anjos. Só queria encontrar o fio da meada dessa mania angelical. Tema do primeiro aniversário do filho mais velho: anjo. Presente para as amigas: anjo. Creio que os anjos me cativam desde os tempos da infância, dentro da Catedral Metropolitana de Brasília. Passava os fins-de-semana com aqueles gigantes esculpidos por Alfredo Ceschiatti a vigiar minhas traquinagens. 

Na juventude, os anjos sobre Berlim de Wim Wenders me deixaram zonza, atordoada, em transe. Minha vida se divide em antes de "Asas do Desejo" e depois do filme. Atualmente, devo ter em casa umas dez representações (em formatos e materiais variados) dessas entidades inspiradoras espalhadas sobre os móveis. 

Quintana, meu poetinha ranzinza preferido, dizia não gostar de intermediários (aliás, quem gosta?): "Não me ajeito com os padres, os críticos e os canudinhos de refresco… Não há nada que substitua o sabor da comunicação direta", afirmou. Entretanto, fazia exceção para os anjos, pois escreveu muito sobre eles: 

E quantas vezes um de nós, ao levantar o copo ao lábio, interrompe o gesto e empalidece... – O Anjo! O Anjo Malaquias! – ... E então, pra disfarçar, a gente faz literatura... e diz aos amigos
que foi apenas uma folha morta que se desprendeu... ou que um pneu estourou, longe... na estrela Aldebaran" ...

E ontem, acreditem, chegou outro, de Nova Iorque. Um enfeite para a árvore de Natal enviado pela amiga peruana Mary Cármen. Vejam vocês: há dias tentando finalizar esse texto e, de repente, recebo essa surpresa linda, que ilustra a postagem.

Ela não tinha ideia do meu apreço por anjos, mas eles, com certeza, sim! ;) 



Comentários

  1. Muito sensível, Lu!

    Mariana Mataluna

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  2. Lindo e doce esse anjinho...
    Adorei o texto e para variar, não consegui publicar o meu comentário.
    Simplesmente some...
    Ô falta de habilidade...

    Marilena

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  3. Lindo. Ainda mais com referência a Quintana!

    Débora

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  4. E, por conta da sua paixão angelical ganhei um lindo anjo que vc me mandou e vou pendurar na minha árvore de Natal. Para mim, é muito simples. Anjo são entidades, não são visíveis, mas são reais e seres bondosos que nos acompanham. às vezes nem tem as lindas asas;Eles nos inspiram....

    Socorro Melo

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  5. acho muito legal o que você escreve!

    Leila Brandão

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  6. Eita, atacou de teóloga! Deu certo, gostei!

    Beijos,

    Davi

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  7. Que final surpreendente! Texto cheio das conexões telúricas que vc tanto fala e que somente aparecem para quem está atento a vê-las !
    Parabéns Lu! Adorei!

    Bjos da sua fã numero 1: Anna Gabis

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