Hello, is it me you're looking for?*





Domingo que passou, a amiga Lara comunica, sem a menor cerimônia, uma novidade devastadora: 

- Não tem mais telefone fixo nessa casa! 

Comoção geral entre as velhas amigas que, claro, nunca mais ligaram para o telefone, mas sentiram o baque como se perdessem um bom amigo do grupo. O aparelho tinha o mesmo número há uns 30 anos, assim como a amizade entre aquelas mulheres, forjada na convivência entre trabalhos de escola e brincadeiras “de antigamente”, com panos de cortina e toalhas por todos os cômodos da residência, uma extensão de nossas próprias histórias. 

Como assim não tem mais? Lembrei tanto da voz do Seu Carioquinha do outro lado da linha: “Alôôu... Era potente e encompridava o O numa cadência personalíssima! Quantas combinações e maquinações adolescentes não foram feitas ao discar 3245-2053!!! 

Lara disse que a funcionária da empresa de telefone também ficou desolada. Pudera! Como se mata uma linha tão longeva? Tão profícua? Tão emaranhada em nosso coração como o próprio fio gigante do velho aparelho, estrategicamente posicionado na passagem entre a cozinha e a sala de estar? 

Seu Carioquinha foi cantar em outros planos; a casa sofreu uma boa reforma. Umas mulheres casaram, outras não; umas tiveram filhos, outras não. Tudo mudou, menos o número 3245-2053. O último bastião de uma época se calava para sempre. É o fim de uma era. 

Já no meu apartamento, o telefone fixo ainda resiste. Não tem uma memória afetiva como o da casa de Lara. O número foi trocado duas vezes e não consigo decorar a nova combinação de jeito nenhum. Mas achamos que era importante manter por causa dos filhos, uma garantia de conexão nos casos extremos de indisponibilidade da telefonia móvel.


"Hello from the other side
I must have called a thousand times..."
(Adele)


Quem tem telefone fixo em atividade reclama que o meio de comunicação virou apenas fator de perturbação, propagador de telemarketing de toda a natureza. O nosso quase não toca mais, é verdade. Mas soou ontem no fim da tarde. Senti um frêmito. Rômulo correu para atender. Era para mim. 

Demorei a sair do quarto, pois tinha a certeza de que não era para a Luciana, indivíduo. Afinal, minha madrinha, a pessoa que mais me ligava no telefone fixo na vida, também já partiu para as terras verdejantes (como o manto de São Judas), que ficam além da nossa explicação. 

Caminhei preguiçosa, sem a menor vontade de ouvir o previsível vendedor do Mundo dos Filtros. 

- Anda logo, mamãe, a moça está esperando, se exasperou Romulito. 

Atendi, era para mim mesmo, Luciana, pessoa, ser humano, mulher, mãe de dois filhos, escritora bissexta. Era uma voz há muito aguardada, trazendo palavras há muito sonhadas! Quem diria que um velho aparelho de telefone vermelho e semiabandonado traria a notícia mais incrível dos últimos milênios? 

A editora tinha tentado falar comigo pelo celular algumas vezes, mas como recebo ligações insistentes do telemarketing do jornal O Globo, também de um número do Rio de Janeiro, não atendi. Eu não atendi, vejam a ironia! E, assim, a obsoleta linha fixa entrou na narrativa com sua participação para lá de especial. 

Vai sair, meu livro vai sair! Coloquei o fone no gancho e me joguei no sofá em euforia. Adolescente que acabava de receber a ligação do primeiro grande amor.

"O telefone é muito pouco pra quem ama como um louco e mora no Plano Piloto..."
 (Renato Mattos)



* Música do Lionel Richie



Comentários

  1. E viva o telefone fixo! Melhor notícia ever (uma das pelo menos)! Parabéns, Loo! Quero o meu autografado!

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  2. Me emocionei mais ainda com seu relato aqui de como foi dada a notícia...vc é
    f*da mesmo amiga escritora...sucesso!!!!

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  3. Uauuuuuuuuuu!!!!! Que NOTÍCIA MARAVILHOSA!!!!! Sempre fui entusiasta dessa amiga que escreve com a alma!!!! Textos que fazem rir, pensar e viajar!!!! PARABÉNS!!!! Estarei na primeira fila para o autógrafo!!!!!

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  4. Parabéns!

    Mário Andrade

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  5. Que legal, Lu, parabéns!! Quero ler seu livro, avise quando sair. Beijos, Fabíola

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  6. Este comentário foi removido pelo autor.

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  7. Agora quanto ao livro...Que notícia maravilhosa! Vai ser Mato de molecagens ou algum outro? Vai ter lançamento no Carpe Diem?

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  8. Pra quem não sabe o seu Carioquinha, meu pai, foi cantar em outra freguesia dia 15/07/2014. No dia 13/08 daquele mesmo ano, o avião de Eduardo Campos caiu e eu me peguei discando para o 3245-2053 para dar a notícia bombástica em primeira mão. Só que para o meu total devastamento não foi aquela voz grave quem atendeu do outro lado. De lá para cá descobri que somente O Mundo dos Filtros tinha interesse naquela linha. Moro numa quadra antiga da Asa Sul, onde as empresas não têm muito interesse em dar manutenção. Meu telefone fixo passava mais tempo com defeito que funcionando. Claro que quando eu reclamava a Oi vinha fazer os remendos de sempre. Mas descobri que a paz reinante quando eles não vinham era maravilhosa e cortei de vez. Aproveitei e mandei a TV a cabo para o espaço também. Pasmem! Ninguém na casa sentiu falta! Com o dinheiro economizado fiz um plano família com a Vivo em que Larissa e eu podemos tagarelar o quanto quisermos, inclusive em interurbanos, sem nenhum acréscimo! Acho que foi um bom negócio!

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  9. Em primeiro lugar Parabéns!!!
    Quanto ao telefone fixo, não abro mão!!

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  10. Cara amiga Luciana,

    e não é que é mesmo!?


    Pois é, o fixo (telefone) está mesmo sendo desativado.


    Até os "orelhões" estão caindo em desuso.

    Nós também desativamos o nosso!!

    Ele tá lá em casa, e de vez em quando eu olho pra ele com saudade.

    Ele, e a secretária eletrônica eram juntos e formavam um só aparelho.

    A secretária eletrônica tem até uma pequena fita K7.
    E lá, ainda tem umas mensagens gravadas!!


    Eu te confesso que sou um canceriano saudosista.
    E só desativei o telefone por insistência da Eliane.

    (19) 3563-1379 era o número. Saudades.
    Parabéns pela edição do seu livro!!

    Muito legal!!

    Um beijo,

    Paulo Magno

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  11. Kkkkk parece uma debutante à espera do baile!!!😁 Imagino sua emoção! Que legal, Lu!!! Vc merece muuuito🤩

    Cláudia Valadares

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  12. O telefone fixo ainda é útil. Não se pode/deve dar o número do celular pra todo mundo.

    Um abraço,

    Zé Raimundo.

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  13. Faz tempo que eu quero acabar com o fixo aqui de casa, mas cadê que uma senhora de 75 anos aceita isso? É "mais garantido". Garantia do quê, eu não sei. talvez de receber ligações da Folha de SP, querendo me convencer a assinar o jornal, ou então propaganda de plano fúnebre (sim, isso mesmo), algo como "morra em paz". Sei que o telefone toca e eu não atendo. Nem ela.

    Mudando de assunto, parabéns pelo livro! Quero um autografado,of course.

    Beijos,

    Adriana

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  14. Uhuuuuuu. O mundo merece te ler. Que vai ser a pegada? Um conto ou vários como o blog? Vou ao lançamento. Não esqueça de mim. Bjs.

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