Um novo Big Bang

         Não gosto de ser ave de mau agouro. E apesar de cultivar um certo pessimismo em relação à Humanidade, especificamente à humanidade dos brasileiros, fico muito chateada quando alguma teoria mal humorada que formulo se comprova verdadeira. E desta vez aconteceu tão rápido que me assustei com a minha própria boca de sapo.
          Na quinta à noite, eu assisto à reportagem do garoto “herói” dos EUA. Ele leva a irmã mais nova e o celular da mãe para o banheiro e liga para polícia pedindo ajuda porque ladrões invadiram sua casa. Os bandidos arrombam a porta e, quando percebem que o menino conseguiu avisar os policiais, fogem sem machucar ninguém.
 Digo para o meu marido: “Se fosse aqui no Brasil, eles teriam atirado na cabeça das duas crianças e dos pais dela e, aí sim, fugiriam. Aqui, ninguém se lixa para a vida alheia porque não dá cadeia. E se der, será por pouco tempo. Afinal, pra que existe o réu primário, o regime semiaberto, os bons antecedentes, o abono de Dia dos Pais e todas as atenuantes que transformam homicidas em caras legais da esquina?
Provando que estava terrivelmente certa, na manhã de sexta, acordo com uma notícia inacreditável: “Ladrões matam o cartunista Glauco e o filho dele, Raoni”. Depois, outras versões para o crime aparecem e descobre-se que se trata de uma tragédia cometida por um suposto amigo. OK, mas isso não invalida a tese: todos os dias, dezenas de brasileiros morrem estupidamente por migalhas: tênis, relógios, 300 reais, carros...Sem o menor pudor, bandidos tiram a vida de pessoas e saem para o abraço: o abraço da certeza de que, se um dia forem presos, poderão ser beneficiados pela progressão de regime ou por serem primários ou menores de idade.
          Podem me chamar de reacionária, de ultrapassada, de neonazista (ops, isso não!), mas quem tem medo do bicho papão da condenação por Muder One no Brasíl? A impunidade torna o país cada dia mais violento. Réus confessos continuam soltos. Centenas deles estão presos preventivamente à espera de um julgamento que parece nunca chegar. E todos os clichês se perpetuam: “pobre é quem paga o pato”, “quem tem advogado bom não vai pra cadeia”, “o presídio é a escola do crime”...E se o tal Cadu – assassino confesso de duas pessoas por motivo fútil – for condenado, vai pegar, no máximo, 30 anos de prisão. Se levarmos em conta os benefícios, cai para seis.
          É por isso que sou a favor de penas mais duras para figuras assim. Quem mata, mesmo que uma única vez, não pode ser tratado como quem rouba carro, quem frauda um documento ou quem calunia alguém. Assassinar uma única pessoa é afetar para sempre o círculo inteiro de familiares, amigos, colegas e comunidade. Ninguém supera o trauma de ver um ente querido ser brutalmente morto por nada.
          Os ladrões dos EUA não são mais bonzinhos ou conscientes que os brasileiros. Eles apenas sabem que, se matam alguém, a condenação se torna muito mais rigorosa, incluindo aí a pena de morte em alguns estados. Ou a prisão perpétua sem direito à condicional em outros. Lembrete: sou contra a pena capital. Não vejo sentido em praticar homicídios legalizados. Mas gostaria, sim, de ver assassinos presos – de fato – em cadeias decentes, não em calabouços que exterminam qualquer possibilidade de ressocialização dos que ali deveriam estar estudando, trabalhando e compreendendo que o “crime não compensa”.
          Mas isso são sonhos de uma aluada. Há os que dizem: se as penas forem mais severas, quem vai continuar pagando a conta serão os pobres...Concordo. Mas tem gente rica matando a torto e a direito também. E eles não seriam beneficiados se a legislação fosse menos branda e o sistema judiciário menos inoperante. A questão toda é que a gente precisa começar tudo de novo. Um novo big bang da nação brasileira. Porque o que temos para nos salvaguardar está decadente, falido e achincalhado, não em termos de economia, mas de cidadania.
Recordo agora da triste morte do casal de jovens que namorava dentro do carro na pista de aeromodelismo no fim da Asa Sul. Fuzilados na frente do filho por um drogado que havia conseguido um abono de Natal porque estava com AIDS. E o cara ainda disse que não matou a criança porque não o viu dormindo no banco de trás... E o direito das vítimas, quando é que vamos levar a sério?
Em tempo: Participei, pela 1a vez, de uma audiência pública. Esta tratava da elaboração do novo Código de Processo Civil. Iniciativa democrática e válida, mas onde estavam os setores organizados da nossa sociedade? No auditório quase vazio, apenas magistrados, advogados, defensores, procuradores...Cada qual fazendo o lobby de sua categoria para que, no final das contas, o novo CPC não fique tão novo assim...Uma explosão fraquinha, mas será que dá samba?
         

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